O presidente da Associação Guineense de Solidariedade Social (Aguinenso), João Tati Sá, disse esta quinta-feira nada esperar da visita de Umaro Sissoco Embaló a Portugal, considerando que o chefe de Estado vem apenas “lavar a cara de golpista”.

Como presidente da associação, tenho a noção de que muita gente não espera nada de concreto com esta visita. Vêm simplesmente tentar lavar a cara de golpistas para poderem dizer que assumiram o poder e podem representar legalmente à Guiné-Bissau”.

O médico e dirigente associativo guineense falava, em entrevista à agência Lusa, a propósito da chegada a Lisboa do Presidente da República da Guiné-Bissau, Umaro Sissoco Embaló, naquela que é a sua primeira visita oficial a Portugal.

João Tati Sá aludia à tomada de posse “simbólica” de Umaro Sissoco Embaló como chefe de Estado da Guiné-Bissau quando ainda decorria um contencioso eleitoral, à posterior demissão de um governo eleito democraticamente e a episódios de alegadas perseguições de opositores e de vozes críticas do novo poder em Bissau.

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O médico e antigo candidato a Presidente da República da Guiné-Bissau, que vive há mais de 40 anos em Portugal, onde preside a uma das mais antigas associações de imigrantes guineenses, assume o “desencanto” com os dirigentes políticos na Guiné-Bissau e reclama sinais concretos de início do processo de democratização do país.

Assinala que Umaro Sissoco Embaló e o Governo por ele nomeado chegaram ao poder através de “um golpe de Estado, pisando na Constituição” e apoiados pelo Senegal, que, adiantou, quer fazer da Guiné-Bissau “um seu apêndice”.

Por isso, não acredita que a deslocação de Umaro Sissoco Embaló a Portugal traga algum “benefício concreto” para a comunidade imigrante.

Hão de vir para tentar enganar os imigrantes e dizer: ‘nós somos a esperança, confiem em nós. Prometem tudo e mais alguma coisa, mas em termos práticos não se vê nada e nós já estamos fartos disso”.

Lembrou, neste contexto, que os vários golpes de Estado e mudanças de poder que aconteceram na Guiné-Bissau não conseguiram colocar o país no caminho da estabilidade e do desenvolvimento e, em vez de promessas pediu sinais concretos de que querem promover a liberdade e a democracia.

“Não se pode falar em democracia e estar a torturar pessoas. Não se pode falar de construção de um país, não fazendo nada”, disse, denunciando a falta de investimento na saúde, na educação e em infraestruturas.

Nunca tivemos indivíduos com um programa sério para desenvolver o país”.

A visita de Umaro Sissoco Embaló acontece no contexto da crise pandémica que atingiu também muitas famílias guineenses que vivem em Portugal, com relatos de perda de empregos e dificuldades para pagar as contas mensais.

Os apoios a estas famílias chegam sobretudo das associações, segundo João Tati Sá, que afirma que a embaixada e os consulados da Guiné-Bissau em Portugal fazem o que podem com os escassos meios que têm.

“A crise atingiu-nos bastante. Agora, o que é que esses indivíduos que vêm cá enganar-nos podem fazer? Eles nunca conseguiram fazer nada de concreto pelos imigrantes, os imigrantes é que os ajudam com as suas remessas”, que nunca foram aplicadas para desenvolver o país, disse.

Portugal deve dar “puxão de orelhas” a novo poder de Bissau

O da Aguinenso disse esperar que Portugal dê “um puxão de orelhas” ao novo poder de Bissau para que este faça “algo de concreto” pelo povo.

Portugal diz que mantém as suas relações com os governos, mas que não interfere nas decisões políticas. É o politicamente correto em termos diplomáticos, mas o que podemos esperar é que Portugal dê um bocadinho um puxão de orelhas”.

Para João Tati Sá seria útil Portugal, como um dos principais parceiros de cooperação, sublinhar a importância de agir em prol das populações, da democracia e da liberdade.

“Portugal poderia dizer algo como: vocês assumiram o poder, vejam lá, finalmente, façam algo de concreto que dê um bocadinho de esperança àquele povo”, disse, sublinhando que os esforços da cooperação portuguesa não têm sido aproveitados em Bissau.

“Podia ser útil Portugal dizer alguma coisa nesse aspeto”, disse, apesar de considerar que as atuais autoridades “nem sequer deviam ter reconhecimento internacional” por terem chegado ao poder através de “um golpe de Estado”.

Umaro Sissoco Embaló chegou na quarta-feira a Portugal para a primeira visita oficial que faz a um país da Europa desde que assumiu o cargo de chefe de Estado da Guiné-Bissau, em fevereiro.

O programa da visita, divulgado pela Presidência portuguesa, prevê um encontro com o Presidente da República, Marcelo Rebelo de Sousa, com o primeiro-ministro, António Costa, visitas à Assembleia da República à sede da Comunidade dos Países de Língua Portuguesa (CPLP) e reunião com empresários.

O chefe de Estado da Guiné-Bissau prevê reunir-se também com a comunidade guineense em Portugal num encontro restrito, segundo o programa oficial.