O quinteto de jazz Indigo, descrito pelos fundadores como “o único no mundo” com a sua constituição instrumental específica, faz sábado em Santa Maria da Feira a estreia em concerto de bandas-sonoras para filmes de Jacques Tati (1907-1982).

Destinadas a duas curtas-metragens do ator e realizador francês, as obras concebidas pelos músicos portugueses resultam de uma encomenda do gnration, em Braga, e serão apresentadas pela primeira vez em palco, ao vivo, na 43.ª edição do FIMUV – Festival Internacional de Música de Paços de Brandão, a decorrer até final de novembro em diversas salas do município da Feira, no distrito de Aveiro.

As composições em causa são para o filme “Procura-se Brutamontes” (1934), realizado por Chales Barrois com argumento e interpretação de Jacques Tati, então em início de carreira, e para a curta documental “Força, Bastia” (1978), a última obra de Tati como realizador, só tornada pública em 2002 após edição pela sua filha, Sophie Tatischeff.

As músicas criadas para esses filmes serão executadas com recurso à combinação instrumental que distingue os Indigo – violoncelo por Ricardo Januário, guitarra por Tiago Machado, contrabaixo por Jorge Castro, bateria e percussão por Pedro Oliveira, e oboé, corne inglês e duduk por Pedro Teixeira – e, em palco, as peças anunciam-se com “mais liberdade criativa e interpretativa” do que quando sujeitas aos tempos das imagens gravadas em 1934 e 1978.

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Em entrevista à Lusa, Jorge Castro explica: “É um facto que todos os nossos concertos são diferentes porque damos espaço à improvisação e gostamos de arriscar com os instrumentos, mas neste caso estamos com uma expectativa ainda maior porque será a primeira vez que tocamos estas peças em formato concerto e vamos poder explorá-las com mais liberdade, sem estarmos presos às cenas dos filmes”.

À ansiedade normal de um espetáculo junta-se agora o “entusiasmo do regresso ao palco” em contexto pandémico, considerando que os Indigo “perderam imensas oportunidades profissionais desde março” e que a concretização dos convites por parte do gnration e do FIMUV reflete agora “o retomar gradual da atividade do setor”.

Ainda na perspetiva da crise social e sanitária associada à Covid-19, a produção das novas partituras para os filmes de Jacques Tati foi um desafio diferente: por um lado, impôs “discussões a cinco pela [plataforma de videochamadas] Zoom” e envolveu “mais ensaios individuais do que seria normal, com cada músico a tocar sozinho em casa mais tempo do que antes”; por outro, obrigou ao visionamento das duas curtas-metragens várias vezes “mas sempre sem som, para ninguém ser influenciado pelas bandas-sonoras originais”.

Esse exercício revelou-se criativamente diversificado. “Criámos música para duas peças totalmente antagónicas. Uma com sonoridade de comédia, para a história sobre as enrascadelas em que se mete a personagem de Tati no papel de um ator à procura de um boxeur que possa defrontar perante as câmaras, e outra em tom mais sério, documental, para o filme que regista uma final histórica da Taça das Taças [de futebol] entre o PSV Eidhoven e o SC Bastia”, diz Jorge Castro.

O concerto dos Indigo no FIMUV incluirá, contudo, mais repertório, nomeadamente temas do primeiro álbum do quinteto que, fundado em 2018, reuniu no disco “Indigo Session” o que os respetivos músicos descrevem como “uma abordagem tímbrica e musicalmente desafiante ao universo da música instrumental”.

Jorge Castro garante “diversidade” na performance do grupo, que é constituído por artistas que se formaram em escolas de referência do meio erudito nacional e esta segunda-feira têm lugar nas mais internacionais orquestras portuguesas. “A nossa música sempre teve muito de cinematográfica. Evoca imagens, leva a outros cenários, mostra outras facetas destes instrumentos e acreditamos que pode realmente surpreender”, conclui.