Portugal está a “enfrentar uma situação crescente que se tenderá a agravar nos próximos dias de acordo com modelos matemáticos” do Instituto Nacional de Saúde Dr. Ricardo Jorge, disse a ministra da Saúde, Marta Temido, em conferência de imprensa dedicada à situação epidemiológica da pandemia de Covid-19 no país.

Marta Temido referiu que as estimativas apontam para mais de 3.000 casos diários, “dentro de alguns dias, se não tivermos a cautela necessária”. E justifica, por isso, as medidas decididas em Conselho de Ministros e anunciadas esta quarta-feira. A ministra acrescenta que as estimativas do Insa não refletem o potencial abrandamento do número de casos resultantes das medidas que serão implementadas.

Do lado do Ministério da Saúde, Marta Temido disse que têm estado a trabalhar em “dois eixos de ação”: um tem a ver com a “manutenção da preparação do SNS e o alívio da pressão crescente nas organizações de saúde e nos profissionais de saúde” e o outro eixo tem a ver com uma “revisão das medidas” de controlo da transmissão da doença — decidido agora em Conselho de Ministros.

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No âmbito do primeiro eixo, será publicada, ainda esta quarta-feira, uma “nova estratégia de testes” com a inclusão de testes de antigénio e haverá “medidas de reforço da atividade” de rastreios de contactos, algo que se irá verificar nos próximos dias “com profissionais recrutados para o efeito”.

Sobre a carta enviada esta quarta-feira pelo atual e antigos bastonários dos médicos, onde é feito o alerta para o facto de a resposta do Serviço Nacional de Saúde (SNS) ser insuficiente e ser necessário envolver os privados, Marta Temido disse ter “lido com atenção” o texto. “Estou de acordo que este é o momento do SNS mostrar aos portugueses que valeu a pena terem investido as suas escolhas, os seus impostos, o seu afeto naquele que é um serviço publico”. A ministra garante que o setor de saúde privado será chamado a intervir à medida da necessidade do país, da mesma forma que já colabora com os meios complementares de diagnóstico.

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As regras e as exceções aos jogadores de futebol

Os casos positivos para o SARS-CoV-2 na seleção de futebol portuguesa, que joga esta quarta-feira com a Suécia, foram alvo de perguntas na conferência de imprensa, com a diretora-geral da Saúde, Graça Freitas, a dizer que, por um lado são como os outros cidadãos que testam positivo, por outro lado já vivem em condições especiais e específicas.

Anthony Lopes e José Fonte voltaram para França e Cristiano Ronaldo viajou para Itália onde deverão cumprir o período de isolamento depois de terem testado positivo para o novo coronavírus. Graça Freitas disse que este é procedimento normal para todos os cidadãos infetados: poder cumprir o período de isolamento ou quarentena na residência oficial.

À Direção-Geral da Saúde (DGS) ou à autoridade de saúde do país onde se encontra a pessoa infetada ou suspeita cabe informar as autoridades de saúde do país de destino sobre as condições da pessoa e se está em isolamento ou quarentena. Depois, no país de destino ficará sobre vigilância.

Para poder viajar, a pessoa infetada ou suspeita de infeção tem de ser avaliada pelas autoridades de saúde e terá de assinar uma declaração em como se compromete a cumprir o isolamento ou quarentena. A única diferença é que cada cidadão tem de providenciar o seu próprio transporte, daí que a forma como Cristiano Ronaldo voltou a Turim poderá não ser a mesma que adotariam outras pessoas.

Jogadores, treinadores e staff da Seleção Nacional testam negativo. Bruno Varela substitui Anthony Lopes

Sobre o facto de os restantes jogadores, aqueles que testaram negativo, não estarem em isolamento profilático como normalmente se recomenda a quem teve contacto com um caso positivo, Graça Freitas explica que as autoridades de saúde fazem sempre um inquérito epidemiológico e “uma avaliação do risco que pode decorrer em dois tempos: uma preliminar e uma mais minuciosa”. Ao longo desta última avaliação, acrescenta a diretora-geral da Saúde, “vão-se descobrindo os contactos de alto e baixo risco”.

Como o inquérito epidemiológico aos jogadores “ainda não terminou”, não houve ainda necessidade de determinar isolamento, uma vez que ainda não se sabe se houve contactos de alto risco. Além disso, acrescenta Graça Freitas, “estas pessoas [os jogadores] não estão propriamente na comunidade. É um grupo que já está isolado por si”.

“Pode ter havido alguma falha, mas de qualquer maneira estes cidadãos não estão em comunidade”, explica Graça Freitas, garantindo ainda que “vão ser aplicadas as mesmas regras se as autoridades de saúde chegarem à conclusão de que houve contactos de alto risco” entre os jogadores da seleção.

A diretora-geral da Saúde referiu ainda que antes de todos os jogos, se os jogadores estiverem assintomáticos e testarem negativo a probabilidade de transmitirem o vírus durante o jogo é “infinitamente pequena”. “Estes cidadãos não estão na comunidade, estão a viver numa bolha na cidade do futebol e serão a seu tempo todos eles investigados”, acrescentou durante a conferência de imprensa.

“É a forma como a escola se organiza que determina as medidas de saúde implementadas”

A diretora-geral da Saúde foi ainda questionada sobre as aparentes disparidades nas medidas implementadas nas escolas quando são detetados casos de SARS-CoV-2. Graça Freitas disse que “é a forma como a escola se organiza que determina as medidas de saúde implementadas”. E explica que uma escola que funciona por bolhas, em que um conjunto de pessoas só contacta com pessoas dentro desse grupo, não terá as mesmas medidas que uma escola que partilhe salas, equipamentos e professores entre as várias turmas.

Graça Freitas admite, no entanto, que podem ter se ser feitos esclarecimentos e adaptações em relação às medidas que foram recomendadas às escolas e que haverá um esforço para informar todas as pessoas envolvidas sobre as medidas a implementar.

Os três pontos-chave da nova norma da DGS

Marta Temido aproveitou a intervenção inicial na conferência de imprensa para falar da atualização da norma 004/2020 da DGS, conhecida esta quarta-feira, e destacou três pontos:

  • a prescrição de teste laboratoriais “para doentes com indicação para vigilância clínica e isolamento dos domicílios” poderem ser pedidos pelo SNS24, tal como já aconteceu “no passado” e que irá acontecer a partir do início da próxima semana;
  • a utilização do Remdesivir, em que é referido que o medicamento deve ser administrado “o mais precocemente possível” em determinados doentes;
  • os critérios de alta clínica e o fim do isolamento, que passaram a estar alinhados “com as orientações internacionais”.

DGS. Período de isolamento reduzido para 10 dias em doentes assintomáticos ou ligeiros

Sobre a confusão entre alta clínica para os casos de isolamento e manutenção do tempo de quarentena, Marta Temido explicou que só no primeiro caso houve redução do tempo previsto.

quarentena ou isolamento profilático é recomendado a pessoas que tiveram contacto com pessoas infetadas ou que são suspeitas de estar infetadas, mas que não fizeram o teste ou o teste não deu positivo. Nestes casos, e apesar de alguns países europeus estarem a mudar as orientações, mantém-se o período de 14 dias no domicílio como até agora.

isolamento é determinado para todas as pessoas que testem positivo para o SARS-CoV-2, quer estejam assintomáticos ou tenham sintomas ligeiros ou moderados e que possam fazer a recuperação em casa. Nestes casos, os médicos podem dar alta aos doentes a partir do décimo dia após o aparecimento dos sintomas. Para isso, o doente tem de ter tido uma redução significativa dos sintomas e tem de estar sem febre há três dias consecutivos.

“A medida não vai em contraciclo [como sugerido pela jornalista], vai a favor da ciência”, diz Graça Freitas, diretora-geral da Saúde.

A mudança para uma alta clínica a partir do décimo dias após o aparecimento dos sintomas é baseado em novos dados científicos, que indicam que a probabilidade de transmissão do vírus é “muito pequena”, diz a diretora-geral. “Não há uma quebra de segurança, antes encurta-se o tempo que se está no domicílio.”

Menos 410 mil consultas nos centros de saúde em setembro

Marta Temido afirmou que o Serviço Nacional de Saúde tem feito “um esforço significativo” para manter a “resposta integral” às necessidades dos portugueses, tanto na “resposta Covid” como na “resposta às necessidades assistenciais”. A ministra da Saúde referiu ainda que em setembro deste ano, face ao período homólogo, registaram-se menos 410 mil consultas nos cuidados de saúde primários.

“Continuam a ser menos consultas, mas é um passo no sentido da recuperação de um caminho que temos de continuar a percorrer”, disse Marta Temido.

A ministra afirmou ainda que a situação em que o país se encontra é “preocupante”, indicou que os casos de infeção estão a recair sobretudo nas faixas etárias entre os 20 e 29 anos e deixou um apelo a todos os que querem “fazer as suas vidas regressarem à normalidade”.

“Tenham presente que a doença não desapareceu e que só juntos poderemos enfrentar esta nova fase de crescimento da doença, onde vamos ser todos expostos a uma prova muito dura, e portanto depende de todos nós conseguirmos estar à altura.”

Mais de 11 mil camas de internamento entre Norte e Lisboa e Vale do Tejo

Sobre os números da pandemia em Portugal, a ministra da Saúde disse que havia 396 surtos ativos: 136 na região do Norte, 50 na região Centro, 178 em Lisboa e Vale do Tejo, 14 no Alentejo e 18 no Algarve.

A taxa de incidência a 7 dias é de 96,6 novos casos por 100 mil habitantes e a taxa de incidência a 14 dias é de 152,2 novos casos por semana por 100 mil habitantes.

O valor do risco de transmissão (RT), de acordo com estimativas do INSA, entre os dias 5 e 9 de outubro foi de 1,2, com uma média de 1.542 novos casos por dia. Esse risco variou entre 1,34 na região Norte, com uma média de 807 novos casos por dia, e 0,91 na região do Algarve, com uma média de 34 novos casos por dia.

O Algarve é, de facto, a única região do país com o RT abaixo de 1, reforçou Marta Temido. “É algo bastante encorajador.”

Para a ministra da Saúde, se conseguimos ir de férias para o Algarve e ter turismo na região sem aumentar significativamente a disseminação do vírus na região, então também o podemos fazer no resto do país.

Graça Freitas diz que existem poucos surtos no Algarve e que estão principalmente relacionados com situações familiares ou sociais. Há dois lares com casos, mas pouco preocupante, no entendimento da diretora-geral da Saúde: dois infetados num lar, três noutro, um único internado e nenhuma vítima mortal.

Sobre os números de camas para internamento e a gestão feita em cada hospital a ministra da Saúde, Marta Temido, admitiu não ter os números de cada local, mas apresentou o retrato na região de Lisboa e Vale do Tejo e na região Norte ao fim do dia de terça-feira.

A região de Lisboa e Vale do Tejo tem capacidade para disponibilizar 6.330 camas de enfermaria para internamento de doentes com Covid-19, estando, até terça-feira, ocupadas 419. Para os cuidados intensivos polivalentes de adultos existem 301 camas para doentes Covid-19, estando 64 ocupadas.

Na região Norte, existem 5.489 camas de enfermaria que podem ser alocadas ao internamento de doentes Covid-19, com 294 já ocupadas. E nos cuidados intensivos polivalentes de adultos estão ocupadas 56 camas com doentes Covid-19 das 357 disponíveis.

Marta Temido lembrou que apenas uma parte está em pré-reserva, ou seja, pronta a ser utilizada imediatamente e que as restantes vão sendo alocadas consoante a necessidade.