Dez violações, uma ataque mortal e muitas outras acusações de violência física e psicológica: é este o registo negro que 79 trabalhadores de uma quinta de produção de abacates no Quénia apontam aos seguranças que trabalham para o seu patrão britânico. De acordo com notícia do The Telegraph, este caso já ultrapassou as fronteiras da nação africana e chegou ao Reino Unido, sendo já várias as superfícies comerciais que se recusam a vender os produtos deste fornecedor.

Supermercados como o Tesco, Sainsbury’s e Lidl vendiam abacates produzidos pela Kakuzi — a produção agrícola em causa –, unidade de produção que pertence a uma empresa chamada Camellia, mas já terão cancelado todas as compras e contratos que tinham alinhavados. Um desfecho motivado por uma enorme batalha legal que os trabalhadores queixosos da quinta lançaram contra o seu empregador, alegando, entre várias coisas, graves violações dos direitos humanos.

Entre os vários episódios relatados pela acusação há um que se passou em maio de 2018: os gradas da propriedade agrícola terão espancado até à morte um trabalhador de 28 anos por supostamente ter roubado abacates. Sobre esse caso, a Kakuzi disse que já tinha resolvido o assunto com alguns parentes do homem após sua “morte trágica”.

Toda a situação ganha contornos mais graves porque a exploração agrícola é de tal maneira grande — o jornal britânico compara-a com a cidade de Manchester, em termos de tamanho — e por isso mesmo os trabalhadores não têm grande alternativa se não morar na propriedade, ficar dependente dos serviços que esta providencia e estar em contacto permanente com os 470 seguranças responsáveis pelo bom funcionamento do espaço.

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Outro trágico episódio terá sido a violação de uma adolescente quando esta estava a recolher lenha para aquecer a sua casa. Existem vários outros relatos de violações, muitas das quais originaram gravidezes indesejadas e contágios com HIV.

No processo, as primeiras acusações vão de 2009 a janeiro deste ano. Entre elas há ainda episódios de encarceramentos ilegais e não fundamentados, ataques violentos e outras formas de “maus tratos graves”, explica a Leigh Day, empresa de advocacia britânica que está à frente do caso. Amal Clooney, a advogada de direitos humanos que casou com George Clooney , é uma das advogadas a lutar pelos queixosos.

Este domingo a Kakuzi divulgou um comunicado onde questionava a fundamentação deste processo, alegando que “poucas dessas acusações foram relatadas à Kakuzi ou às autoridades quenianas”. A empresa-mãe Camellia emitiu também um comunicado onde dizia que apesar de deter 50,7% da Kakuzi não tinha qualquer “controlo operacional ou de gestão”.

A posição dos supermercados em questão também se foi conhecendo ao longo desta semana. O Sainsburys anunciou que leva “alegações desta natureza extremamente a sério”, enquanto o Lidl disse que estava a realizar “uma investigação independente completa” sobre as alegações e finalmente o Tesco disse que estava a trabalhar “em estreita colaboração” com a Iniciativa de Comércio Ético para apurar a verdade sobre este assunto.

Há muito que o negócio dos abacates é descrito como sendo semelhante ao dos chamados “diamantes de sangue”. O aumento brutal da procura deste produto transformou alguns dos seus produtores em autênticos sistemas neo-esclavagistas de exploração humana, trazendo com isso, também, graves consequências ambientais (em parte causadas pela plantação intensiva deste fruto típico do México).