A n.º 7 é talvez a menos tocada das sinfonias de Mahler e há quem atribua este menor apreço ao triunfalismo algo bombástico do último andamento, mas a hipótese é pouco convincente, já que a n.º 5 sofre do mesmo mal e nem por isso deixa de ser uma das sinfonias favoritas do público. Em contrapartida, os restantes quatro andamentos contêm alguma da música mais inspirada e original de Mahler.

No sombrio I andamento Mahler verteu ideias que seriam suficientes para alimentar toda a carreira de alguns compositores menores. Na primeira Nachtmusik (andamento II) Mahler ter-se-á inspirado, segundo confidenciou o maestro Willem Mengelberg, amigo do compositor, em “A ronda da noite”, de Rembrandt, não no sentido de transpor o quadro para música mas na emulação sonora do seu magistral chiaroscuro. O Scherzo, também ele nocturno – leva o título de “Schattenhaft” (ensombrado) – evoca a imagem de uma valsa de espectros, de uma versão entre o travesso e o macabro de um Sonho de uma Noite de Verão. A segunda Nachtmusik (andamento IV) é de uma inaudita riqueza tímbrica e faz apelo a instrumentos raramente ouvidos em contexto sinfónico, como a guitarra e o bandolim, que protagonizam uma serenata amorosa. Após os ouvidos se acostumarem, durante uma hora, a decifrar subtis jogos de sombra e luz, é inevitável que a claridade crua do V andamento pareça algo vulgar.

Mahler: Sinfonia n.º 7: Minnesota Orchestra, Osmo Vänskä (BIS/Distrijazz)

Embora o maestro finlandês Osmo Vänskä tenha assumido no início deste ano a direcção da Filarmónica de Seul, manterá, até 2023, o vínculo à Minnesota Orchestra, que dirige desde 2003, e que reconduziu, nestes 17 anos de parceira, ao patamar de excelência a que a orquestra ascendera no período em que fora dirigida por Antal Doráti (1949-60) e ainda se chamava Minneapolis Symphony Orchestra. O volume anterior da integral das sinfonias de Mahler para BIS por Vänskä com a Minnesota Orchestra continha uma n.º 1 milimetricamente precisa e analítica, mas algo fria e distante, problema que não afecta esta n.º 7 (que pode ser amostrada aqui).

A combinação da disciplina e rigor da orquestra com a transparência e naturalidade excepcionais da engenharia de som da BIS faz plena justiça ao caleidoscópio de timbres e atmosferas do I andamento, restitui com extraordinária nitidez o delicado rendilhado na segunda Nachtmusik, com a guitarra e o bandolim a serem perfeitamente audíveis, e, de uma forma geral, realçam o colorido trazido pela vasta parafernália percussiva que Mahler faz intervir ao longo da partitura. As traquinices do Scherzo, com uma sucessão de breves picardias entre os diferentes instrumentos, colocam em evidência a admirável espacialização sonora lograda pela engenharia da BIS – este é, claro, um disco que só poderá ser plenamente fruído num hi-fi com um mínimo de qualidade. As rédeas firmes aplicadas por Vänskä acabam por revelar-se benéficas para o V andamento, pois moderam a sua exuberância – de qualquer modo, num compositor dado a ironias, como Mahler, resta saber se o triunfalismo por vezes vulgar deste andamento é para ser aceite pelo seu valor facial.

Em conclusão: Vänskä e a Minnesota Orchestra não só manobram com segurança através das constantes e bruscas variações de mood da Sinfonia n.º 7 como conseguem convencer o ouvinte de que estes 77 minutos de música são sempre congruentes e fazem desta interpretação um modelo.

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