2003, Old Trafford. 2007, Olímpico de Atenas. Andrea Pirlo foi campeão europeu de clubes duas vezes, com quatro anos de diferença, e ambas ao serviço ao AC Milan. Chegou à Juventus em 2011 e ficou até 2015, ano em que perdeu a final da Liga dos Campeões para o Barcelona e falhou a única tentativa que teve para ganhar a competição com os bianconeri. Os anos passaram, Pirlo acabou a carreira depois de uma curta passagem pelos Estados Unidos, tirou o curso de treinador e assumiu o comando da equipa principal da Juventus na sequência da saída de Maurizio Sarri. Esta terça-feira, na Ucrânia, estreava-se como técnico na liga milionária.

E, por isso mesmo, foi o escolhido da UEFA para uma das entrevistas semanais na antecâmara da primeira jornada da fase de grupos da Liga dos Campeões. Pirlo falou sobre o facto de agora treinar jogadores como Buffon, Chiellini e Bonucci, com quem partilhou balneário não só na Juventus como na seleção italiana, e garantiu que os três atletas “têm sido fantásticos”. “É ótimo. Talvez não tenha sido fácil para eles no começo mas no espaço de algumas horas entenderam que o meu papel agora era diferente. A atitude deles mudou de forma rápida e facilmente. Chamaram-me ‘gaffer‘ (mister) imediatamente, talvez inicialmente com um sorriso, mas depois habituaram-se. Podem ser uma grande ajuda para mim porque sabem o que significa jogar na Juve. Sabem o que significa vencer e o que significa trabalhar comigo, como fizeram durante todos aqueles anos em que jogámos juntos. Têm a noção do espírito que quero trazer a esta equipa e serão certamente uma grande ajuda nesta temporada”, explicou o italiano, que mais à frente falou sobre o que significa a Liga dos Campeões.

“A Liga dos Campeões é um sonho para todos os que jogam futebol, cria uma forte emoção desde o momento em que se ouve a música. Tive a sorte de disputar quatro finais e vencer duas delas, então sei o que significa ganhar e perder este título. Perder esta competição dói, ganhar é absolutamente fantástico”, acrescentou Pirlo, garantindo ainda que nunca imaginou treinar Cristiano Ronaldo. “Fico feliz por ter esse ícone do futebol mundial, de tê-lo à minha disposição, vê-lo treinar, vê-lo jogar. É um prazer enorme para mim, para toda a equipa. Ele trabalha da mesma forma agora, aos 35 anos, do que quando era jovem, com a mesma paixão por jogar futebol todos os dias. Ele é um exemplo para todos nós”, terminou o treinador.

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Ora, esta terça-feira, Pirlo não podia contar com Cristiano Ronaldo, que testou positivo para a Covid-19 há uma semana, e lançava Morata no lugar do jogador português na visita ao Dínamo Kiev, a contar para o primeiro compromisso da fase de grupos da Liga dos Campeões. Com 20 mil adeptos nas bancadas, o treinador italiano lançava Kulusevski e Chiesa — que foi expulso no fim de semana, no empate com o Crotone — nas alas, Rabiot e Bentancur numa zona mais central do meio-campo e Ramsey nas costas do avançado. No banco ficava Dybala, que no último jogo da Serie A terá ficado descontente por não ter sido opção para entrar quando a Juventus não estava a ganhar: decisão que Pirlo justificou com o facto de o argentino ter voltado de lesão há pouco tempo e ter sofrido problemas gastrointestinais enquanto esteve com a seleção.

O Dínamo Kiev atuava com seis jogadores que foram titulares pela seleção da Ucrânia que na semana passada venceu Espanha e os primeiros minutos depressa mostraram que a equipa de Mircea Lucescu não queria oferecer o jogo de bandeja à Juventus. A primeira contrariedade para Pirlo apareceu à chegada aos 20 minutos, quando Chiellini teve de ser substituído devido a dificuldades físicas e Demiral acabou por entrar em campo. E a verdade é que este encontro entre os dois treinadores, porém, também tinha história: em 1995, há 25 anos, foi pela mão de Lucescu que Pirlo se estreou pela equipa principal do Brescia, com apenas 16 anos, naquele que foi o primeiro capítulo da carreira de um dos melhores jogadores das duas últimas décadas.

Numa primeira parte que terminou sem golos, a melhor oportunidade caiu para Kulusevski, que finalizou de calcanhar um enorme trabalho de Ramsey na esquerda e viu o guarda-redes Bushchan roubar-lhe o golo com uma enorme intervenção (34′). Ao intervalo, a Juventus tinha mais bola e maior superioridade mas pouco ou nada conseguia fazer com isso, demonstrando algumas dificuldades na hora de romper com a boa organização defensiva dos ucranianos. Do outro lado, o Dínamo Kiev mostrou principalmente nos últimos minutos da primeira parte que tinha a capacidade para resguardar a bola e aproveitar eventuais erros adversários mas para isso precisava de colocar o trio ofensivo mais em jogo, já que Tsygankov, Supriaha e Carlos de Pena pouco ou nada intervieram na partida.

Dynamo Kyiv v Juventus: Group G - UEFA Champions League

O treinador italiano enfrentou o técnico que o lançou, há 25 anos, no Brescia

A segunda parte, contudo, dificilmente poderia ter começado melhor para a Juventus. Num lance iniciado por Chiesa, que já na primeira parte tinha sido o grande desequilibrador da equipa, Ramsey tocou de calcanhar para Kulusevski, o sueco rematou para defesa do guarda-redes do Dínamo e Morata, na recarga, abriu o marcador (46′). Aos dez minutos do segundo tempo, Dybala entrou para o lugar de Kulusevski e cumpriu os primeiros minutos da temporada. Nesta altura, o jogo poucas diferenças tinha em relação à primeira parte, à superioridade pouco exuberante da Juventus e à incapacidade do Dínamo de ser vertical e procurar a profundidade — a única mudança era mesmo no resultado.

A 15 minutos do apito final, os ucranianos ganharam alguma dinâmica na partida e aproveitaram uma certa passividade da Juventus, que já estava algo adormecida devido à vantagem e à baixa intensidade do jogo. O Dínamo Kiev ganhou ritmo e criatividade com as entradas de Gerson Rodrigues e Verbic e a equipa de Pirlo começou a colocar-se à mercê de um eventual golo e consequente empate. Pirlo respondeu ao lançar Arthur e Bernardeschi e Morata, já dentro dos últimos dez minutos, acabou por bisar e evitar uma reta final mais incerta para os italianos: Cuadrado cruzou a partir da direita e o avançado, de cabeça e a antecipar-se na zona central, marcou pela segunda vez (84′). Duas oportunidades, dois golos, três em dois jogos e grande importância de Morata nesta fase inicial da temporada da Juventus — apesar de isso não se refletir propriamente nos níveis exibicionais do jogador, cujas únicas intervenções em toda a partida foram precisamente os dois golos que marcou.

Apesar de uma exibição algo cinzenta e nada impressionante, a Juventus não tremeu e venceu o Dínamo Kiev na Ucrânia, conquistando os três primeiros pontos num grupo da Liga dos Campeões onde na próxima jornada recebe o Barcelona em Turim. Sem Cristiano Ronaldo, Andrea Pirlo encontrou o treinador que o lançou no Brescia há 25 anos e ganhou — quase como se a nova vida tivesse vencido a vida passada do italiano.