Começou a golear o Villarreal e o Celta de Vigo, empatou na receção ao Sevilha, perdeu fora com o Getafe, goleou agora na Champions o Ferencvaros (sendo que a primeira hora poderia terminar com os húngaros na frente). Em 13 golos marcados pela equipa, Messi apontou dois de grande penalidade e fez uma assistência. Olhando para tudo o que se passou este verão, o argentino nem sequer deveria fazer parte das contas de Ronaldo Koeman. Acabou por ficar, contrariado, a criticar o próprio presidente, sabendo que em janeiro está livre para terminar a carreira onde quiser. Mas mais do que números, recordes ou feitos coletivos e individuais, o capitão dos catalães é um jogador triste, que de vez em quando esboça um sorriso para os companheiros mas que até nos golos faz uma festa contida. Se durante década e meia o número 10 foi o corpo do Barcelona, agora tornou-se a sua cara.

A escolha do treinador do holandês para o lugar de Quique Setién esteve longe de ser unânime, o mercado foi tudo menos um espaço conseguido entre o falhanço da contratação de Eric García, a dispensa de Luis Suárez sem ter o sucessor (Depay) assegurado e falta de reforços para o ataque e em paralelo continua em cima da mesa um voto de censura que pode levar Bartomeu a uma saída antecipada da liderança do clube. No entanto, também no próprio balneário as coisas estão longe de ser pacíficas. E uma carta enviada ao presidente a que o El Mundo teve acesso esta semana, assinada pelos quatro capitães, fez estalar ainda mais a crise. Porquê? Gerard Piqué, um dos atletas em causa que contestava a pressão para que os jogadores cortassem o salário, renovou no mesmo dia. E o que fez? Se com o prolongamento do vínculo se aproximou a Bartomeu, numa entrevista que se seguiu ao La Vanguardia achou por bem colocar-se ao lado de Messi e companhia – e criticou o clube pelo Barçagate

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“Piqué está cá há muito tempo e eu tenho apenas três meses. Tem a sua opinião. É esperto e sabe que pode dar uma entrevista destas e amanhã [hoje] entrar em campo concentrado e a jogar bem. Respeito tudo”, comentou Ronald Koeman a esse propósito, recusando qualquer cenário de favoritismo dos catalães que jogam em casa mas ainda sem público. “Qualquer equipa ou treinador que comete erros quer melhorar mas motivação não falta, nem a eles nem a nós. Os jogadores têm uma experiência de alto nível, sei que o Real não vai surgir vulnerável, pelo contrário. Não acredito que estejam dispostos a dar tanto espaço para jogar como nos últimos jogos”, frisou.

Parece quase estranho mas, entre toda a convulsão institucional e interna no Barcelona, o Real Madrid não chegava ao clássico muito melhor. Aliás, mais do que as últimas duas derrotas caseiras com Cádiz e Shakhtar Donetsk, o maior problema de Zinedine Zidane é mesmo a (falta de) qualidade exibicional apresentada, tendo como exemplo paradigmático os primeiros 45 minutos contra os ucranianos onde saiu a perder por 3-0 e a conta esteve longe de ficar por aí. Sem Sergio Ramos, que voltava à equipa, a defesa perde-se e anda perdida; no corredor central, uma boa organização defensiva contrária consegue secar as fases de construção; na frente, as alterações táticas a par da falta de inspiração de nomes como Jovic torna-se um problema demasiado pesado. Os merengues não fizeram qualquer contratação para a nova época 40 anos depois mas estão piores do que na última época.

“Se vou jogar o meu futuro? É o que se diz, não vou negar. Mas no ano passado e na minha primeira passagem pelo clube também era igual… Só tenho de fazer o meu trabalho. Jogar com o Barcelona é a melhor forma de reverter este momento. O que pode mudar a situação? Cada jogo tem a sua história e devemos pensar positivo. Sempre fui alguém muito crítico comigo mas sei que só podemos mudar as coisas juntos. É normal que a maioria das críticas sejam dirigidas a mim mas não vivo do passado, vivo do que vem no futuro. Queremos deixar uma boa imagem e vamos entrar num cenário bom para isso. Na vida como no futebol, temos é de estar juntos”, frisou Zidane.

Até pelos últimos resultados mas também por tudo o que uma vitória (ou uma derrota) representaria a breve prazo para equipa e clube, este era o clássico que valia bem mais do que três pontos numa fase inicial ainda da Liga. E foi um grande jogo de futebol para quem vê, ao nível das duas melhores equipas de Espanha, com duas características comuns aos dois conjuntos durante a primeira parte: por um lado, as dificuldades defensivas esperadas pelo Barça e surpreendentes pelo Real; por outro, e talvez mais relevante, a incapacidade de aproveitar os piores momentos do adversário para construírem um resultado. E os golos iniciais demoraram menos de dez minutos.

Logo a abrir, Benzema saiu da zona dos centrais para receber, puxou consigo os defesas do Barcelona e assistiu Valverde que entrou de trás na área para o 1-0 (5′). Se os catalães já estavam uma pilha de nervos, pior ficaram e era a gestão dessa vantagem que poderia fazer a diferença que não fez. Pouco depois, Messi saiu também do raio de ação dos defesas do conjunto de Madrid, assistiu Jordi Alba na profundidade do flanco esquerdo e Ansu Fati só teve de encostar na área após cruzamento (8′). Se os merengues tinham acalmado, voltaram aí à versão pilha de nervos e era a gestão dessa igualdade que poderia fazer a diferença que não fez. Courtois e Neto somaram algumas intervenções vitais, os meio-campos não conseguiram evitar em muitas ocasiões que o jogo partisse mas essa vertigem ofensiva não teria mais golos até ao intervalo, aproveitado para corrigir posicionamentos.

“Parece um jogo de casados contra solteiros. Para os espetadores, genial; para os treinadores, não devem estar a gostar muito”, comentava Jorge Valdano ao intervalo, na melhor análise numa única frase ao que se passara ao longo de 45 minutos. E a segunda parte começou com as características mais aguardadas: o Barcelona a tentar ser melhor com posse, o Real a tentar ser melhor sem bola. Coutinho, em mais uma jogada inventada por Ansu Fati (o mais novo de sempre a marcar num clássico e de longe o melhor dos blaugrana ao longo do encontro), atirou a rasar o poste da baliza de Courtois antes do lance que promete dar muito que falar ao longo das próximas semanas, numa grande penalidade assinalada pelo VAR e confirmado pelo árbitro sofrida e convertida por Sergio Ramos na sequência de um agarrão na camisola de Lenglet com direito a mini teatro após um livre lateral (63′).

Koeman ainda lançou Dembelé, Griezmann e Trincão na procura de chegar pelo menos ao empate, sendo que as melhores oportunidades no último quarto de hora seriam mesmo do Real Madrid, já com Modric em campo, por Kroos e Sergio Ramos. Se nos visitantes a questão das últimas duas derrotas fica arrumada, na Catalunha as dúvidas e a tensão têm tendência para continuar a escalar no balneário e no plano interno. E o croata ainda foi a tempo de aumentar a vantagem para 3-1 aos 90′, depois de mais uma grande defesa de Neto que evitou outros números na parte final do jogo em que Koeman lançava avançados mas com isso só ganhava problemas. O olhar sem expressão de Messi para o ar nos descontos enquanto os merengues faziam a festa conta quase tudo…