São dois nomes que, pelo terrível curso da História, tornaram-se praticamente indissociáveis. Senna e Imola, Imola e Senna. Em maio de 1994, há mais de 26 anos, o piloto brasileiro despistou-se na curva 7 do circuito e acabou por morrer já no hospital. Antes, na qualificação, Roland Ratzenberger também havia morrido; Barrichello tinha sofrido um acidente arrepiante que o deixou inconsciente; e os detritos de uma colisão entre Pedro Lamy e JJ Lehto feriram oito adeptos nas bancadas. Foi um fim de semana negro — que, apesar de tudo, é sempre recordado principalmente pela morte de Senna.

Este fim de semana, o circuito de Imola voltava a integrar o carrossel da Fórmula 1 — 14 anos depois da última vez, ou seja, da grelha atual só Raikkonen já ali tinha corrido. Renovado como Grande Prémio da Emilia-Romagna, e não Grande Prémio de San Marino, o circuito italiano reentrava na alta roda da modalidade através deste atípico Campeonato do Mundo de 2020 e tornava-se a terceira corrida do ano em Itália. O último a ganhar em Imola tinha sido Michael Schumacher, em 2006, que aí venceu no circuito pela sétima vez na carreira. Este domingo, entre muitas homenagens a Senna, o sucessor do alemão ficaria decidido.

Logo à partida, Senna estava presente nos troféus que foram entregues aos pilotos que ficaram no pódio e à equipa vencedora: com o formato do circuito de Imola, o prémio incluía um pequeno diamante de 14 quilates na curva em que o brasileiro morreu. Nas próprias ruas de Imola, que fica na Área Metropolitana de Bolonha, a autarquia mandou instalar durante o fim de semana painéis luminosos com frases do piloto. E Pierre Gasly, da AlphaTauri, correu com um capacete amarelo, azul e verde com a mensagem “Ayrton Senna Sempre”.

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E na qualificação, Gasly foi desde logo uma das surpresas. O piloto francês fez o quarto melhor tempo, igualando a melhor qualificação da carreira e registando a melhor da equipa desde que Vettel conquistou a pole-position do GP de Monza em 2008 (na altura, era Toro Rosso). Mais acima, Valtteri Bottas foi o mais rápido — alcançando o melhor tempo da história do circuito –, seguido de Lewis Hamilton e Verstappen. Logo atrás, surgiam Ricciardo e Albon, assim como Leclerc, que confirmava as relativamente melhores indicações que deu em Portugal e conseguia sair de sétimo.

No arranque, Bottas segurou a liderança e Verstappen passou Hamilton, agarrando o segundo lugar da classificação. Lá atrás, Lance Stroll foi obrigado a parar logo na primeira curva, depois de danificar a asa na sequência de um incidente com Ocon. À nona volta, o azar bateu à porta de Gasly: o AlphaTauri do francês teve um problema irreparável no motor e o piloto foi chamado pela equipa às boxes para abandonar. Verstappen parou numa fase ainda embrionária da corrida, para trocar os pneus médios por duros, e a decisão da Red Bull levou a Mercedes a chamar Bottas à box para realizar exatamente a mesma operação. Quem saiu beneficiado foi Hamilton, que saltou para o primeiro lugar com as paragens dos dois principais oponentes e ia tentando retirar o máximo rendimento dos pneus médios com que partiu — fez a melhor volta quatro vezes seguidas e ia esticando a distância para ganhar margem para parar. Até que a sorte que faltou a Gasly apareceu ao inglês.

Mesmo quando estava a começar a reta da meta, Hamilton soube que tinha acabado de entrar em vigor um safety car virtual devido ao abandono de Ocon. O piloto inglês entrou de imediato no pit lane, trocou de pneus e saiu assim que a proibição de ultrapassagens terminou, reduzindo a vantagem para Bottas para quatro segundos mas já com pneumáticos novos, com uma paragem e com tudo para ganhar a corrida. Atrás de Hamilton e nas voltas seguintes, Bottas e Verstappen iam lutando a espaços pela segunda posição — algo que favorecia, obviamente, o campeão do mundo, que pela frente só tinha o objetivo de ir aumentando a vantagem.

O holandês da Red Bull acabou por conseguir voltar ao segundo lugar a 20 voltas do fim, aproveitando uma saída larga do piloto da Mercedes para desenhar uma ultrapassagem perfeita. Hamilton reagiu com uma volta rápida mas Verstappen estava destinado ao fado de Gasly e não ao do inglês: a 11 voltas do final, um pneu traseiro do Red Bull terá rebentado e o holandês foi forçado a abandonar, deixando Bottas novamente na segunda posição e um safety car em pista. Sergio Pérez era o piloto que se seguia, saltando para o terceiro lugar, com a Racing Point a arriscar uma paragem com a crença de que os principais adversários também iriam parar e cair na classificação.

Algo que acabou por não acontecer. Ricciardo, Leclerc e Albon não pararam, o safety car acabou a seis voltas do final e foi o australiano da Renault a garantir o último degrau do pódio — numa derrota em toda a linha de uma estratégia quase inexplicável da Racing Point. Pérez terminou em sexto, Leclerc acabou em quinto e Kvyat, que ainda ameaçou o terceiro lugar de Ricciardo, acabou por ficar em quarto.

Lewis Hamilton, cujo ídolo absoluto é Ayrton Senna, venceu numa pista onde nunca tinha competido na Fórmula 1 e homenageou o brasileiro, recebendo o troféu que o recorda. Com os dois primeiros lugares no Grande Prémio da Emilia-Romagna, a Mercedes foi desde já campeã mundial de construtores pela sétima vez consecutiva — e o inglês ficou a um passo do sétimo título mundial da carreira, que pode carimbar já na próxima etapa, daqui a duas semanas na Turquia.