O Bloco de Esquerda de Ovar disse esta terça-feira que o Ministério Público deve “investigar a gestão da Câmara Municipal” relativa ao cerco sanitário para contenção da Covid-19 entre março e abril, por considerar graves as despesas “ambíguas” expostas pelo PS.

“Perante a gravidade da situação noticiada e indícios apurados, potencialmente ilegais e com enquadramento criminal, o BE não apenas vem exigir ao executivo camarário [liderado pelo PSD] as necessárias explicações e justificações discriminadas sobre estas matérias, bem como desafiar o presidente da Câmara Municipal de Ovar, Salvador Malheiro, a solicitar ao Ministério Público a abertura imediata de uma investigação necessariamente exigente, a bem da transparência e do rigor das contas e gastos a cargo do erário público“, defendeu fonte dessa estrutura partidária do distrito de Aveiro.

Na base do apelo do BE à intervenção do Ministério Público está a denúncia, avançada pela Lusa, de vários aspetos que o PS considerou “estranhos” na auditoria que realizou às contas da Câmara, como é o caso da “aquisição de bens e serviços a sete empresas do concelho de Águeda sem exceder a faturação a cada uma dos 20.000 euros permitidos pelo ajuste direto simplificado”.

As críticas avançadas pelo PS e recordadas pelo BE referem-se também à “compra de máscaras a gelatarias, construtoras e empresas criadas dias antes do início do cerco sanitário”, mediante acordos “em que o descritivo das faturas, por ser demasiado genérico, não evidencia a quantidade dos bens e serviços prestados, nem a entidade por quem são usufruídos”.

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O BE de Ovar alerta também que “o objeto social dessas firmas é claramente contraditório e incompatível com os produtos e serviços alegadamente adquiridos pela Câmara”.

Nota ainda que se verificaram “gastos demasiadamente avultados em relação à real necessidade [da encomenda] e valores muito inflacionados em relação a produtos semelhantes no mercado”.

Perante outros exemplos de situações que o PS já criticou ao executivo liderado pelo PSD, o BE acrescenta que “o dinheiro dos contribuintes apenas poderá ser usado com o rigor e transparência exigidos e devidos” e declara: “Nunca aceitaremos negócios menos claros com o dinheiro de todos nós”.

Contactado pela Lusa sobre o desafio do BE de que seja o próprio presidente da Câmara a solicitar a análise do Ministério Público, o presidente da autarquia, Salvador Malheiro, começou por afirmar que “todo o processo de contratação que ocorreu no período da primeira vaga da pandemia em Ovar, incluindo o episódio do cerco, cumpre as regras da contratação pública”.

Referindo que “todas as despesas registadas e à disposição de todos estão plenamente justificadas”, o autarca social-democrata declarou depois: “Como todos sabem, os crimes públicos não precisam de ser denunciados formalmente para que o Ministério Público possa atuar. As portas da Câmara de Ovar estão, como sempre estiveram e estarão, abertas a qualquer entidade para o escrutínio que entenderem”.

Lamento que estejam a ser questionados procedimentos que tiveram caráter de urgência em pleno cerco sanitário – o único em Portugal Continental -, por entidades que, na altura, não mostraram o mínimo de disponibilidade para colaborar”.

A pandemia de Covid-19 já provocou mais de 1,3 milhões de mortos no mundo desde dezembro do ano passado, incluindo 3.472 em Portugal.

No caso de Ovar, território que ocupa cerca de 148 quilómetros quadrados e que de 18 de março a 17 de abril esteve sujeito a cerca sanitária para controlo local da pandemia, o último boletim da autarquia indicava esta manhã 414 casos ativos de Covid-19. A título comparativo, no pico da disseminação comunitária da doença, em abril, era 537 o número máximo de infeções ativas simultâneas nesse território costeiro.

Desde o início da pandemia em solo português, o balanço epidemiológico de Ovar contabiliza um acumulado global de 52 óbitos e 1.642 casos confirmados Covid-19.