Quem o disse foi o deputado do partido ecologista Os Verdes, José Luís Ferreira, no final de uma reunião com Marcelo Rebelo de Sousa em Belém: o Governo prepara-se para criar três níveis de escalonamento nos concelhos com casos de Covid-19, e ajustar as medidas restritivas em função da grau de risco. Assim, só os concelhos com mais de 960 novos casos de Covid-19 (por 100 mil habitantes nos últimos 14 dias) é que serão abrangidos por medidas como as que vigoram agora de recolher obrigatório a partir das 13h ao fim de semana.

Esta foi uma das ideias que os partidos retiveram da audiência com o Presidente da República sobre a renovação do estado de emergência por mais 15 dias. Outra foi que essa renovação vai mesmo acontecer: o atual período de estado de emergência vigora até à próxima segunda-feira, dia 23, sendo que ainda esta semana o Presidente deverá propor ao Governo um novo decreto, que o submeterá à Assembleia para aprovação. A ideia é que a partir do dia 24 de novembro já esteja em marcha novo período de emergência, que vai vigorar por mais 15 dias (até 8 de dezembro).

Marcelo tem estado esta tarde a ouvir os partidos em Belém, tendo começado pelos que têm menor representação parlamentar e culminando, amanhã, nos que têm maior representação parlamentar. Até agora, Marcelo só ouviu negas: tanto o Iniciativa Liberal, como os Verdes, como o Chega, que se absteve na votação do estado de emergência, vão agora votar contra. André Ventura justifica a mudança de posição com o facto de se sentir “defraudado” pelas medidas que o Governo encaixou no chapéu legal do estado de emergência e que, no seu entender, não são adequadas.

A crítica foi global: todos, do IL aos Verdes, passando pelo Chega, criticaram a medida “absurda” de recolhimento obrigatório a partir das 13h ao fim de semana, em todo o país, concluindo que isso apenas faz com que haja maior aglomeração em alguns espaços públicos na parte da manhã e concluindo que o custo do encerramento às 13h para a economia, nomeadamente para a restauração e o comércio, são muito mais pesados do que os benefícios para conter a pandemia. “Não se verifica esse equilíbrio”, disse João Cotrim de Figueiredo.

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São três os escalões em que se vão organizar os concelhos, segundo o deputado dos Verdes:

Os que têm entre 240 e 480 casos diários de Covid-19;

Os que têm entre 480 e 960 novos casos;

E os que têm mais de 960 casos. Só nestes é que deverão manter-se as medidas de recolher obrigatório a partir das 13h ao fim de semana.

Veja aqui quantos casos há por concelho em relação aos últimos 14 dias:

Quantos casos de Covid-19 há no seu concelho? Quais são os dez municípios mais afetados? E os menos? A pandemia em gráficos

“Aparentemente o governo estará a ponderar escalonar os concelhos em função da gravidade, sendo que apenas no escalão máximo é que haveria os limites que agora estão a existir aos fins de semana”, disse José Luís Ferreira no final da reunião com o PR. Também o deputado do PAN, André Silva, o último a ser ouvido por Marcelo nesta ronda de audiências (que continua amanhã), disse que a medida de recolher obrigatório a partir das 13h ao fim de semana deverá desaparecer de quase todo o país, por ser “excessiva”, e sugeriu que esse recolher não deverá acontecer “antes das 15h ou 16h” por causa da hora de almoço na restauração.

“É fundamental que se repense dentro do estado de emergência aquilo que são as restrições para que haja uma maior proporcionalidade e maior equilíbrio nas medidas”, disse André Silva.

Esta mesma pista já tinha sido dada pelo presidente do Iniciativa Liberal, Cotrim de Figueiredo, o primeiro a ser ouvido em Belém, que disse que “ficaria surpreendido que essas medidas [de fim de semana] fossem permitidas no próximo decreto presidencial do estado de emergência”. No seu entender, essas medidas de recolher obrigatório ao fim de semana apenas fazem aumentar as aglomerações durante a manhã e prejudicam mais os negócios de restauração, hotelaria e comércio do que ajudam a achatar a curva pandémica. “É esse equilíbrio que não está a ser conseguido”, disse, queixando-se da falta de dados que comprovem a adequação (ou não) desse tipo de medidas.

Também André Ventura se mostrou contra essas “restrições absurdas”, dizendo mesmo que avançou com uma ação judicial para as remover, e avançou que, por não concordar com essas medidas, é que vai mudar o sentido de voto na renovação do estado de emergência: agora, vota contra.

Chega é contra estado de emergência e avança na justiça

Depois de Cotrim de Figueiredo, André Ventura foi o segundo a ser ouvido em Belém. O deputado do Chega, que no último pedido de estado de emergência ao Parlamento se absteve, anunciou agora que vai votar contra. “Não tem que ver com o decreto do próprio presidente, mas sim com o facto de nos termos sentido defraudados e enganados após reunião com o governo. Não iremos viabilizar o próximo estado de emergência por causa das restrições absurdas que o governo decidiu impor no âmbito do estado de emergência e que estão a criar um caos gigantesco no país todos”, disse Ventura aos jornalistas no final da reunião.

“Não vão contar mais com o Chega para isso”, disse André Ventura, sublinhando que o Governo criou confusão com as medidas e ainda por cima as alterou quando já estavam em execução.

Nesse contexto, o deputado único do Chega disse ainda que o partido deu entrada na Justiça com uma ação para o levantamento imediato das restrições de horário no comércio e nos restaurantes ao fim de semana. “Esperamos que a justiça possa olhar para estas restrições e analisar a sua desadequação face aos objetivos propostos para combater a pandemia. Estamos a destruir o tecido económico e não estamos a contribuir para conter a pandemia”, disse.

Ventura insiste que, a sua abstenção na votação do estado de emergência na passada semana, mostra que o Chega concorda que haja um chapéu legal para tomar determinadas medidas como a medição de temperatura, por exemplo. O que não compreende é que se feche tudo a partir das 13h ao fim de semana, fazendo com que as pessoas “se concentrem todas à mesma hora em determinados espaços”. “Não valerá de nada o esforço se estivermos a acabar com a economia e os negócios que estão a morrer”, disse, lembrando: “A nossa economia não é a economia alemã”, diz.

Para Ventura, Marcelo é o único que “pode chamar a atenção do Governo” para que as medidas que o Governo vier a tomar no âmbito do estado de emergência sejam “adequadas e proporcionais”, uma vez que as medidas do Governo não são votadas no Parlamento. “Fomos surpreendidos à meia-noite de sábado com medidas absurdas sobre as quais não fomos avisados quando aprovámos o estado de emergência”, disse ainda.

Outra novidade saída das reuniões: Marcelo confirmou que no próximo dia 24 de novembro vai marcar a data das eleições presidenciais, que serão a 24 de janeiro.