O ministro dos Negócios Estrangeiros português considerou esta terça-feira que a persistência de um bloqueio da Hungria e Polónia à aprovação do orçamento plurianual e do fundo de recuperação da União Europeia será “uma fratura exposta” de “consequências gravíssimas”.

“Seria irrealista se viesse aqui com uma posição otimista relativamente a esta última crise”, disse Augusto Santos Silva a propósito do bloqueio imposto na segunda-feira pela Hungria e pela Polónia à aprovação do Quadro Financeiro Plurianual da UE, por não concordarem com o mecanismo que condiciona o acesso aos fundos comunitários ao respeito do Estado de Direito.

“Todos sabemos que a permanência desta situação de bloqueio terá consequências gravíssimas”, prosseguiu o ministro, ouvido na comissão parlamentar dos Assuntos Europeus sobre o Conselho Europeu da próxima quinta-feira.

Por “ordem de importância”, apontou, a UE entrará em orçamento por duodécimos, os esforços para reunir mais fundos para responder à crise ficarão comprometidos, a preservação e salvaguarda do mercado interno ficará limitada, Hungria e Polónia pagarão um preço institucional e político e a credibilidade da União perante os cidadãos será muito afetada.

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Há um problema de credibilidade ligado ao modo como cidadãos, as opiniões publicas, as partes interessadas, os trabalhadores, as empresas, as ONS, as sociedades civis, os parlamentos nacionais, o povo europeu, olhará para esta fratura, que será mesmo uma fratura exposta , com uma metáfora muito crua, e exposta num dos órgãos mais importantes do corpo europeu”, frisou.

Países da UE instam Hungria e Polónia a levantarem veto ao orçamento plurianual

Os restantes países da União Europeia e a Comissão Europeia instaram esta terça-feira em uníssono a Hungria e a Polónia a levantarem o bloqueio à aprovação do orçamento plurianual e do fundo de recuperação para a crise gerada pela Covid-19.

“Não é o momento de vetos, mas sim para agir rapidamente e num espírito de solidariedade. Os nossos povos irão pagar um preço muito alto por este bloqueio”, advertiu o ministro para os Assuntos Europeus alemão, Michael Roth, que apelou à “responsabilidade” de Budapeste e de Varsóvia e lembrou que “todos os Estados” vão beneficiar com o plano definido.

Os ministros e titulares da pasta dos Assuntos Europeus dos 27 Estados-membros da União Europeia (UE) reuniram-se esta terça-feira por videoconferência e abordaram o “impasse” nas negociações orçamentais após a Hungria e a Polónia terem recusado, na segunda-feira, aprovar o Quadro Financeiro Plurianual da UE por não concordarem com o mecanismo que condiciona o acesso aos fundos comunitários ao respeito do Estado de Direito.

Em julho passado, o Conselho Europeu aprovou um Quadro Financeiro Plurianual para 2021-2027 de 1,074 biliões de euros — que após as negociações com o Parlamento Europeu (PE) ascenderá a mais de 1,08 biliões – e um Fundo de Recuperação de 750 mil milhões para fazer face à crise gerada pela pandemia da doença Covid-19.

Após o acordo alcançado no PE, estes dois pontos precisam da unanimidade necessária no seio dos 27 para avançar.

“Quem bloquear o processo de ratificação deste pacote cuidadosamente elaborado terá de assumir uma grande responsabilidade perante os outros Estados da UE e perante todos os cidadãos europeus”, afirmou o embaixador de Espanha junto do bloco comunitário, Pablo García Berdoy.

Se todos os Estados dizem respeitar o Estado de Direito, porque que razão estão assustados com a condicionalidade do Estado de Direito”, questionou, por sua vez, o ministro italiano dos Assuntos Europeus, Vincenzo Amendola, cujas palavras foram replicadas por outros países.

A partir de Haia, o primeiro-ministro holandês, Mark Rutte, que exigiu em Bruxelas no verão passado vincular as ajudas europeias ao respeito pelo Estado de Direito, defendeu esta terça-feira que o compromisso com a liberdade de imprensa e a independência judicial é “um mínimo” inegociável, lembrando que a UE é “uma comunidade de valores”.

Para o chefe do Governo dos Países Baixos, a liberdade de imprensa, de expressão e de orientação sexual “estão ameaçadas na Hungria e na Polónia”.

“Se este compromisso, que não é pedir muito, é demasiado para estes países” então, frisou Mark Rutte, a Alemanha — país que detém neste momento a presidência rotativa do Conselho da UE -, a Comissão Europeia e o Parlamento Europeu “terão de encontrar uma saída para a situação”.

Mark Rutte salientou ainda que 25 dos 27 Estados-membros da UE apoiam este requisito de acesso aos fundos europeus, reiterando que, tanto para o Governo holandês como para o Parlamento holandês, tal requisito é “um mínimo” a exigir a todos os parceiros europeus e não estão dispostos a discutir “abaixo disso”.

Também o comissário europeu do Orçamento, Johannes Hahn, deu conta da sua frustração e lançou um apelo.

Dececionado por os Estados-membros não terem podido avançar no acordo sobre o Quadro Financeiro Plurianual e o Fundo de Recuperação. Exorto os Estados-membros a assumirem a sua responsabilidade política e a darem os passos necessários para finalizar o pacote inteiro. O que está em causa não são questões ideológicas, mas sim ajudar os nossos cidadãos na pior crise desde a II Guerra Mundial”, escreveu na sua conta oficial na rede social Twitter.

O atual bloqueio poderá atrasar para além de 1 de janeiro de 2021 a entrada em vigor do orçamento europeu plurianual e do fundo de recuperação, uma vez que este último não pode começar a funcionar sem a aprovação da decisão sobre os recursos orçamentais próprios.