Samela, Janderson e Gabriel são três jovens brasileiros que recusaram o rótulo de “pirralhos”, atribuído pelo Presidente, Jair Bolsonaro, a Greta Thunberg, e uniram-se à ativista sueca para arrecadarem um milhão de reais (160 mil euros) para a Amazónia.

Em causa está a campanha SOS Amazónia, que teve início após um apelo internacional feito pelo autarca de Manaus, Arthur Virgílio, que, ao ver a pandemia de covid-19 totalmente desgovernada na região, decidiu pedir auxílio a países europeus.

O apelo foi ouvido pela jovem ativista Greta Thunberg que, auxiliada pelo movimento estudantil ‘Friday´s for Future’, encabeçou a campanha SOS Amazónia, que já arrecadou cerca de um milhão de reais para desenvolver ações naquela que é a maior floresta tropical do mundo. Contudo, ninguém melhor para mostrar a realidade da Amazónia do que os próprios jovens da região, que se prontificaram a apoiar Greta na luta pela preservação ambiental e pela proteção dos povos nativos diante da covid-19, na contramão daquilo que consideram ser “a inércia dos governantes brasileiros”.

Em Manaus, capital do estado brasileiro do Amazonas, coube a Janderson Tavares, de 21 anos, coordenar os esforços da SOS Amazónia, tendo em conta o seu papel de liderança na greve pelo clima naquela cidade amazónica, em 2018.

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Orgulhoso dos milhares de euros arrecadados até ao momento, Janderson disse à Lusa que as doações partiram essencialmente da Europa, de países como Portugal e Alemanha, de cidadãos “com um nível de consciência muito maior e que entendem a importância da preservação”, frisando que os jovens tiveram um papel fundamental na recolha desses fundos.

“Eu acredito muito que os jovens têm potencial para pressionar o Governo, que por sua vez pode implementar uma mudança que vai alterar o futuro sustentável. Nós podemos, sim, ocupar espaços, insistir em processos de tomada de decisões, porque os jovens estão cada vez mais envolvidos nessas questões. Então, acredito que temos o poder para virar a chave e fazer a mudança acontecer”, disse o estudante.

“Infelizmente, estamos a ver muitos retrocessos ambientais no Brasil, assim como no mundo. Nós acreditamos que quem vai herdar todo o caos que está a ser gerado somos nós, então não vamos deixar de lutar por um futuro ambientalmente seguro, socialmente justo e equilibrado”, frisou Janderson. Segundo o jovem de Manaus, com o dinheiro arrecadado até ao momento, o projeto SOS Amazónia já ajudou mais de seis mil famílias em várias comunidades, tanto urbano-prefiéricas, quanto ribeirinhas, principalmente indígenas. “Estamos agora a ir para a segunda fase do projeto, na implementação da telemedicina, onde vamos ajudar e apoiar nas consultas os agentes indígenas de saúde, para conter o novo coronavírus”, explicou.

No final de dezembro último, na contramão dos esforços que os jovens vêm fazendo para tentar reverter os danos ambientais no planeta, Jair Bolsonaro causou polémica ao chamar a jovem ativista sueca Greta Thunberg de “pirralha”, após a ambientalista ter alertado para o assassinato de líderes indígenas no Brasil. O termo foi mal recebido pela juventude amazónida, como é o caso da indígena Samela Sateré-Mawé, que disse à Lusa não ter dúvidas de que há “jovens muitos mais politizados e inteligentes” do que o próprio Bolsonaro.

“Com certeza que há muitos jovens mais politizados e inteligentes do que o Presidente e todo o seu Parlamento (Governo). Nós estudamos nas universidades, lemos artigos, temos bases para falar dos que falamos. Não somos só pirralhos que estão a gritar sem fundamento. Então, eles (Governos) deveriam ouvir-nos, fortalecer todos os órgãos que cuidam dos povos indígenas e das leis de crimes ambientais”, avaliou a ativista de 24 anos.

Samela, que está no último ano do curso universitário de Biologia e que se tornou numa das vozes femininas mais promissoras do ativismo indígena e ambiental brasileiros, usa diariamente as redes sociais para mobilizar outros jovens a lutarem por um futuro mais sustentável. “Nós somos jovens e as nossas ações têm visibilidade, nós conseguimos mobilizar as pessoas e isso é importante. Enquanto mulher, indígena e jovem daqui, do norte no Brasil, essa representatividade é importante”, sustentou Samela, que integra também o ‘Friday´s for Future’.

Ainda em Manaus, um outro jovem que se tem destacado como uma voz do ativismo ambiental é Gabriel Cavalcante, que ocupa o cargo de assistente de projetos da organização não-governamental Fundação Amazonas Sustentável (FAS), e que acredita ser possível reverter a situação de destruição da Amazónia brasileira.

“É bastante preocupante o cenário que vivemos, mas ainda assim é possível reverter a situação. Temos exemplos de parceiros que nos ajudaram na ação SOS Amazónia, que são jovens do ‘Friday´s for Future’, que criaram engajamento nas redes sociais, conseguiram doações e assim conseguimos ajudar 16 comunidades indígenas só aqui em Manaus. É algo pequeno, que se tornou grande”, declarou Gabriel.