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"Gabo". Neste palco há um estendal para García Márquez nos mostrar o que é realmente importante

Este artigo tem mais de 3 anos

A companhia Dançando com a Diferença e Patrick Murys criaram "Gabo", um espectáculo que quer provocar a imaginação a partir da idade mais tenra. Estreia-s esta quarta, 9, no Teatro Viriato, em Viseu.

O que é ser diferente é a pergunta que me perseguiu durante todo o processo, e é uma pergunta que fiz aos três intérpretes ao longo da criação", diz Patrick Murys sobre "Gabo"
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O que é ser diferente é a pergunta que me perseguiu durante todo o processo, e é uma pergunta que fiz aos três intérpretes ao longo da criação", diz Patrick Murys sobre "Gabo"

Carlos Fernandes

O que é ser diferente é a pergunta que me perseguiu durante todo o processo, e é uma pergunta que fiz aos três intérpretes ao longo da criação", diz Patrick Murys sobre "Gabo"

Carlos Fernandes

Podem ser cortinas a secar no estendal. Mas também podem ser tecidos que dividem o espaço ou portais para outros universos. Seja qual for a verdade, é do fundo dessa estrutura volátil que emerge uma figura, movida a três intérpretes, pelo menos no momento inaugural. Tem um rosto amigável, uma cabeça gigante e o desejo de praticar o bem. Pelo menos assim parece. Ao longo do espectáculo, percebemos que a figura nunca será só assim, voltará a apresentar-se (ou a esconder-se) sob várias formas, com outros braços e cabeças. Gabo é o seu nome. E é também o título do espectáculo que o artista francês Patrick Murys dirige para a Dançando com a Diferença (companhia que trabalha com pessoas com e sem deficiência, liderada por Henrique Amoedo) e que se estreia esta quarta-feira no Teatro Viriato, em Viseu (está em cena até dia 12).

E a Gabo também dança, também se deixa manipular, também assiste a jogos de sombras e a coreografias várias, também ela vê outras marionetas. E isso também significa que este é um espectáculo onde a multidisciplinariedade abunda e onde três intérpretes nos propõem um terreno de imaginações, uma sobreposição de texturas e propostas de liberdade. O projeto partiu de Paula Garcia (ex-diretora artística do Teatro Viriato e ainda Presidente do CAEV — Centro de Artes de Espectáculo de Viseu, a associação por detrás do teatro), que considerou que poderia ser interessante atirar estes vários ingredientes para o lume e ver que calda obtia:

“O convite foi feito em dezembro do ano passado e começámos a primeira parte do trabalho em janeiro com o encontro do grupo todo [do Dançando com a Diferença] durante três dias, com o objetivo de poder convidar dois intérpretes para integrar o elenco. O terceiro intérprete, já estava proposto no convite, pela sua singularidade de ser mágico”, explica Patrick Murys.

Mas fica a faltar qualquer coisa: uma pitada de Gabriel García Márquez (Gabo era a alcunha do escritor colombiano, Nobel da Literatura em 1982, que morreu em 2014 aos 87 anos) e do seu realismo mágico, para finalizar: “O realismo mágico foi sugerido como possibilidade, como ponto de partida, pela Paula Garcia, como uma intuição de que podia ser interessante cruzar o meu universo, o grupo Dançando com a Diferença e um mágico com a obra do Gabriel García Márquez. Foi o meu terreno de pesquisa para criar uma dramaturgia do espetáculo”, admite o criador.

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O mesmo que, depois da nossa vez de dissertar sobre o que será esta Gabo, confessa aquilo que lhe parece mais apropriado sobre a mesma e ainda sobre uma pergunta que foi uma espécie de barómetro de todo o processo: “Gabo é uma figura que encarna o que não percebemos, mas que tem vida. Uma criatura doce, mas que pode repugnar, fascinar, que confronta e toca as pessoas. É uma resistente, pode ser uma revolucionária, pode ser masculino ou feminino. O que é ser diferente é a pergunta que me perseguiu durante todo o processo, e é uma pergunta que fiz aos três intérpretes ao longo da criação”, conta.

(Fotos de Carlos Fernandes)

Patrick Murys chegou a Portugal em 2002, quando andava com a companhia francesa Turak — companhia de teatro de objetos e de manipulação de marionetas que foi formada em 1985 por Michel Laubu, em Lyon — em digressão pelo mundo. Dessa vez, o convite foi feito por Madalena Victorino e por Giacomo Scalisi para o festival Percursos. Foi esse o cenário que o fez aproximar-se do nosso país, partilhar ideias e ganhar cumplicidades com artistas nacionais. Foi ficando. E trabalhando com vários encenadores como Nuno Pinto Custódio, Romulus Neagu e com estruturas como a Circolando — e ainda, mais academicamente, com o CITAC (Círculo de Iniciação Teatral da Academia de Coimbra), o TEUC (Teatro dos Estudantes da Universidade de Coimbra) e a ESMAE (Escola Superior de Música e Artes do Espetáculo).

O seu percurso havia começado em França, no Conservatório de Teatro de Chambéry, depois fez o curso de clown no Centre National des Arts du Cirque e realizou estágios de dança com Josef Nadj e T.Bäe, de acrobacia com Alexandre del Perrugia e Mauricio Celedone e, por fim, de dança com Karlotta Ikeda, Cécile Loyer e Jan Fabre.

Este Gabo é também o primeiro espectáculo que a Dançando com a Diferença pensa e cria propositadamente para o público infanto-juvenil, ainda que Henrique Amoedo já tenha admitido que lhe parece um objeto transversal a todas as idades e que, desta maneira, se apresenta, tal como o enredo — se é que ele existe de forma tradicional e narrativa —, livre. Pronto para ser agarrado e transfigurado e lido de pernas para baixo e interpretado de barriga para cima. As voltas que se lhe quiserem dar.

Relacionado com esse aspeto, há também a ideia de um espectáculo profundamente vago, com várias disciplinas artísticas sobrepostas, com possibilidades de leitura abrangentes, distintas daquelas que muito condescendentemente por vezes se tem no teatro dito infanto-juvenil:

“Que as crianças não consigam dizer-me sobre o que é o espetáculo, isso não é grave. O que proponho é que recebam imagens e situações de corpos pensadas por nós, com a possibilidade de várias interpretações. Também é um desafio para mim, que o nível de leitura seja aberto a várias camadas de interpretações. Poder interrogar-nos em palco com sujeitos graves sem agredir o público. Acredito na inteligência das crianças mesmo que não tenham os códigos cénicos. E acredito na inteligência do ser humano, de outra maneira não teria feito este trabalho. São os preconceitos que me limitam”, afirma.

E esses também se colocam na balança de Gabo, um espectáculo onde intérpretes com deficiência transmitem a sua poética e capacidade interpretativa e que muito estimulante foi para Patrick Murys: “O facto de trabalhar com intérpretes que têm deficiências obriga-nos a rever maneira de falar do nosso trabalho, como o meu trabalho é a minha vida, obriga-me a repensar a minha maneira de ver o mundo. Não é mais nem menos. A utopia de ver as diferenças incluídas tem que continuar a alimentar os nossos atos”, diz.

Para concluir, decidimos perguntar ao criador (também cenógrafo) que leitura faz do cenário: “Há pessoas que vão ver esse lado prático de segurar os lençóis com um estendal. Mas também podem representar linhas de horizonte, linhas de fuga que se vão aproximando ou afastando. Fios de vida. É a horizontalidade da nossa condição, do caminho que seguimos ou onde as pessoas nos metem, é isso e muito mais”.

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