As negociações para a relação futura entre o Reino Unido e a União Europeia depois de o Brexit ser implementado deram esta terça-feira um passo importante, depois de semanas de impasse entre as duas partes. De acordo com um comunicado do governo britânico, as duas partes concordaram “em todos os princípios do acordo” anteriormente negociado no que à fronteira da Irlanda do Norte com a Irlanda diz respeito.

É esse o resultado das reuniões entre o vice-presidente da Comissão Europeia Maroš Šefčovič e o ministro de Estado britânico Michael Gove, homem da confiança de Boris Johnson.

Pouco depois, a presidente da Comissão Europeia, Ursula von der Leyen, anunciou que vai receber o primeiro-ministro britânico, Boris Johnson, na quarta-feira à noite em Bruxelas para um debate decisivo sobre a parceria pós-Brexit.

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“Estou ansiosa por dar as boas-vindas ao primeiro-ministro do Reino Unido, Boris Johnson, amanhã [quarta-feira] à noite”, escreveu Ursula von der Leyen na sua conta oficial da rede social Twitter.

Na ocasião, “continuaremos a nossa discussão sobre o Acordo de Parceria”, adiantou a responsável na curta mensagem.

A publicação foi feita um dia depois de, num contacto telefónico entre Von der Leyen e Johnson, ambas as partes se terem comprometido a um encontro presencial em Bruxelas para tentar desbloquear o impasse, dado não existirem para já condições para conclusão de um acordo pós-Brexit.

“Como acordado no sábado, fizemos um balanço das negociações em curso. Acordámos que as condições para a conclusão de um acordo não existem devido às diferenças significativas que subsistem sobre três questões críticas: igualdade de condições, governação e pescas”, frisaram os dois responsáveis numa declaração conjunta divulgada à imprensa na segunda-feira à noite.

Este encontro presencial surge a menos de quatro semanas do final do ano e do chamado período de transição, e numa altura em que não há ainda entendimento nas três matérias que têm sido as da discórdia ao longo dos últimos meses (igualdade de acesso aos mercados, governação e pescas).

Segundo algumas fontes diplomáticas, o negociador-chefe da UE para a futura relação com o Reino Unido, Michel Barnier, apontou quarta-feira como data limite para um entendimento, informação que não foi confirmada oficialmente.

Direitos de pesca em águas britânicas e o órgão jurídico competente para julgar possíveis conflitos entre as várias parte ficaram de fora

No comunicado noticiado esta terça-feira, é especificado que ambas as partes chegaram a acordo em áreas como os controlos fronteiriços para animais, plantas e produtos derivados; o comércio de carne e outros produtos alimentícios para supermercados; o fornecimento de medicamentos; e os limites à ajuda estatal a setores da economia. Todas estas medidas representam várias peças do puzzle que é um acordo comercial entre o Reino Unido e a União Europeia.

Não foram, porém, referidas duas questões concretas e que têm bloqueado as conversações: os direitos de pesca em águas britânicas e o órgão jurídico competente para julgar possíveis conflitos entre as várias partes (isto é, o Reino Unido e os países da UE) quanto à aplicação do acordo.

Porém, o comunicado tem uma menção importante ao respeito do protocolo relativo à fronteira entre a Irlanda do Norte e a Irlanda, possivelmente o maior quebra-cabeças para a implementação do Brexit. Na sequência do Acordo de Sexta-Feira Santa de 1998, que veio pôr um fim à violência nacionalista e separatista na Irlanda do Norte, ficou determinado que não haveria uma fronteira entre a Irlanda do Norte e a Irlanda, apesar de continuarem a ser dois países distintos — a primeira, como parte do Reino Unido; a segunda, como república independente.

Parece, por isso, haver um recuo estratégico por parte do governo britânico nesta matéria, depois de em setembro ter sido aberta a possibilidade de o Reino Unido quebrar o protocolo sobre aquela fronteira e que resultou das anteriores negociações com Bruxelas.

A 8 de setembro, o ministro para a Irlanda do Norte, Brandon Lewis, chegou a admitir que a medida em causa (que ficou apelidada de “lei do mercado interno”) levaria a uma “quebra” da lei internacional, uma vez que esta previa a criação limites fronteiriços, para fins comerciais, entre a Irlanda e a Irlanda do Norte. A medida contou com a oposição internacional — tanto da presidente da Comissão Europeia, Ursula von der Leyen, como do à altura candidato à presidência dos EUA, Joe Biden —, mas Boris Johnson continuou a insistir nessa possibilidade como uma “rede de segurança vital” para o caso de não haver um acordo comercial entre o Reino Unido e a União Europeia.

Agora, porém, parece haver um recuo da parte do governo de Boris Johnson — ou, em alternativa, uma nova tentativa para chegar a um acordo com Bruxelas.

O compromisso obtido nestes últimos dias e anunciado esta terça-feira será agora objeto de avaliação interna de cada uma das partes. Depois dessa fase, se continuar a haver concordância entre as duas partes, ficará fechado um acordo. Este, porém, só será posto em prática depois de ser ratificado na Câmara dos Comuns e em cada um dos 27 Estados-Membros da UE.

O prazo para o início do Brexit está marcado para 1 de janeiro de 2021, mas, atendendo à necessidade de fazê-lo aprovar em 28 capitais, um possível acordo terá de ser obrigatoriamente aprovado antes. No Reino Unido, o calendário oficial da Câmara dos Comuns aponta a semana de 14 a 18 de dezembro como a última em que a câmara baixa do parlamento britânico estará reunida antes da pausa para férias. No entanto, há deputados que estão dispostos a agendar uma sessão plenária extraordinária entre 29 e 30 de dezembro.

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