Morreu esta sexta-feira Kim Ki-Duk, cineasta sul-coreano de 59 anos que ao longo da curta carreira realizou filmes como “Pieta” e “Primavera, Verão, Outono, Inverno… e Primavera” e que foi distinguido com prémios como o Leão de Ouro do Festival Internacional de Cinema de Veneza e o Urso de Prata no Festival Internacional de Cinema de Berlim.

A notícia é avançada na principal agência de notícias da Coreia da Sul, Yonhap, que cita “relatos dos media” da Letónia, país em que Kim Ki-Duk se encontrava. Segundo estes relatos locais, o cineasta estava infetado com o novo coronavírus e morreu depois de complicações relacionadas com a Covid-19.

Kim Ki-Duk estaria na Letónia desde o dia 20 de novembro e planeava mesmo comprar uma casa na cidade de Jurmala e pedir um visto de residência permanente no país.

Com uma carreira iniciada tardiamente (já com mais de 30 anos), Kim Ki-Duk começou a trabalhar em cinema na Coreia do Sul depois de uma temporada passada em Paris (entre os 30 e 33 anos), a cursar belas artes. O primeiro projeto em que esteve envolvido foi como argumentista, mas rapidamente começou a filmar e em 1996 a sua primeira longa-metragem (“Crocodile”) chegou às salas de cinema da Coreia do Sul.

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Foi, porém, já nos 20 anos deste novo século que Kim Ki-Duk ganhou maior notoriedade como cineasta. Em 2000, o filme “O Bordel do Lago” percorreu festivais internacionais, como o Festival Internacional de Cinema de Toronto, e começou a tornar o nome de Kim Ki-Duk conhecido entre os cinéfilos — mas não apenas por bons motivos, dado que o filme tornou-se também polémico pelas imagens explícitas de crueldade a animais exibidas.

Daí em diante Kim Ki-Duk, que se manteve na senda de realização de filmes independentes e com imagens explícitas e cruas, assinou filmes como “Tipo Ruim” (2001), “Primavera, Verão, Outono, Inverno… e Primavera” (2003) — que será talvez o seu filme mais popular e consensual internacionalmente —, “Samaritana” (2004), “Ferro 3” (2004), “O Arco” (2005), ” Arirang” (2011) e “Pieta” (2012).

Com “Pieta” e com “Ferro 3”, Kim Ki-Duk foi distinguido com dois grandes prémios no Festival Internacional de Cinema de Veneza — respetivamente o Leão de Ouro de Melhor Filme e o Leão de Prata de Melhor Realizador. No Festival Internacional de Cinema de Berlim, recebeu o Urso de Prata de Melhor Realizador por “Samaritana” e no festival de cinema de Cannes recebeu o prémio ‘Un Certain Regard’ pelo filme “Arirang”.

Em 2016, em entrevista ao Korean Times, Kim Ki-Duk dava algumas pistas para entender o seu cinema: “Tenho filmado ao longo dos últimos 20 anos mas na essência aquilo de que se trata é de histórias humanas. (…) O dinheiro torna a escala dos filmes grande. Mas a forma como constituis e retratas as emoções das personagens com um propósito é provavelmente a única outra forma de expandir um filme que não a de fazer um grande investimento [financeiro]. Se um filme não tem drama ou história, não tem valor como filme”.

Muitos jornalistas estrangeiros perguntam-me porque é que o meu trabalho é mais adorado fora da Coreia do que na Coreia. Tenho de dizer que talvez seja porque as minhas histórias baseiam-se na universalidade dos seres humanos”, dizia ainda, na entrevista de 2016.

As acusações na sequência do movimento #MeToo

Como lembra a agência de notícias sul-coreana Yonhap, o realizador — que vincava a importância de se fazerem filmes “honestos” e de não se dar prioridade ao gosto da audiência, ao mercado ou à popularidade dos atores escolhidos para montar os filmes — chegou a ser acusado de abusos físicos e sexuais por uma atriz em 2017, na sequência do surgimento do movimento de denúncia de situações de assédio e abuso #MeToo.

A atriz acusava-o de ter sido agredida pelo realizador e pressionada a participar numa cena de sexo com a qual não concordara inicialmente, durante a rodagem do filme “Moebiuseu” (2013). Mais tarde, em 2018, outras três mulheres acusaram Kim Ki-Duk de crimes sexuais. As acusações chegaram a tribunal, depois de Kim Ki-Duk ter processado os acusadores e o jornalista que difundiu as acusações de falso testemunho e difamação.