O Governo quer que os refugiados chegados a Portugal ao abrigo de programas europeus consigam falar português, ter emprego e habitação ao fim de ano e meio, uma das medidas previstas no novo modelo de acolhimento.

Em entrevista à agência Lusa, a secretária de Estado para a Integração e as Migrações adiantou que a revisão do modelo de acolhimento está prestes a ser concluída e tem três pontos de destaque, entre a criação de um grupo operativo único para requerentes de asilo e refugiados, o acolhimento de menores não acompanhados e o modelo de autonomização destas pessoas.

Relativamente ao modelo de autonomização, Cláudia Pereira adiantou que a vontade do Governo português é que no caso dos refugiados chegados ao abrigo de programas da Comissão Europeia, que têm uma duração de 18 meses, seja possível uma autonomização antes do fim desse prazo.

O objetivo é que antes dos 18 meses, consoante os perfis, possam autonomizar-se para um emprego, já estarem a falar português, e estarem nas suas próprias casas, pagando através do seu salário e é este o regime em que estamos a trabalhar e que em breve estará concluído porque o objetivo é sempre o de estarem integrados na sociedade portuguesa”.

O novo modelo de acolhimento inclui também a criação de um grupo operativo único, “uma medida que já vinha a ser preparada” e no âmbito do qual já decorreu uma primeira reunião na segunda semana de dezembro, para “tratar de forma conjunta” a entrada em Portugal de todos os refugiados ou requerentes de asilo, independentemente da forma como chegam ao país.

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“Seja por aeroporto, seja por programas da comissão europeia, vindos da Grécia, ou do Egito ou da Turquia, os reinstalados e os recolocados, seja os menores vindos da Grécia, todos são discutidos no mesmo grupo, com as mesmas entidades“, revelou a responsável, acrescentando que este é um grupo coordenado pelo Alto Comissariado para as Migrações (ACM), em conjunto com o Instituto da Segurança Social (ISS) e o Serviço de Estrangeiros e Fronteiras (SEF).

Apesar de não avançar uma data para a conclusão do processo de revisão, a secretária de Estado confirmou que este mantém uma lógica de descentralização, para que os refugiados e requerentes de asilo não fiquem apenas nos grandes centros urbanos, mas possam também ir viver para as zonas interiores do país.

De acordo com a secretária de Estado, o novo modelo de acolhimento traz não só uma articulação reforçada entre o ACM e o Instituto de Emprego e Formação Profissional (IEFP), como também a própria reestruturação da área do emprego dentro do ACM, já que muitos imigrantes se dirigem ao ACM para saber de propostas de emprego.

Um fenómeno com muita expressão durante os meses de pandemia, uma vez que todos os setores de atividade foram afetados, com particular incidência no turismo e na restauração, onde muitos imigrantes trabalhavam.

Como tivemos uma tão grande afluência de imigrantes desempregados à procura de emprego e como tivemos empresas a perguntar se sabiam de pessoas que pudessem trabalhar na agricultura, tentámos reorganizar para quem tivesse disponibilidade que pudesse trabalhar, mas sempre nas áreas em que tivessem apetência e que estivessem disponíveis para tal”.

Nesse sentido, apontou que houve não só “centenas” de imigrantes que foram trabalhar para a agricultura, mas também para supermercados e outras empresas, um pouco por todo o país.

Outros ainda foram “encaminhados” para cursos de língua portuguesa e para cursos profissionais em áreas “onde são necessários mais trabalhadores”, como serralharia ou marcenaria.

Cláudia Pereira adiantou que têm sido realizadas sessões de esclarecimento para dar a conhecer as várias ofertas de emprego que existem no interior do país, bem como programas para jovens licenciados ou populações ciganas que queiram candidatar-se a esses empregos.

Em matéria de qualificações dos imigrantes, a secretária de Estado frisou que os cursos de português vão passar a ser lecionados nos centros Qualifica, além de no IEFP, sendo que está também previsto que possam ser feitos protocolos para que esses cursos aconteçam em empresas ou associações, com horários mais flexíveis e menos alunos por turma.

Por outro lado, garantiu que é também objetivo do Governo facilitar e desburocratizar os processos de reconhecimento de qualificações, seja “diminuindo o tempo de espera”, seja “diminuindo os obstáculos”.

Obstáculos que Cláudia Pereira afirmou que também quer retirar à vinda de alunos estrangeiros para Portugal, adiantando que o compromisso do Governo é passar dos atuais 13% para 25% de alunos estrangeiros a estudar em Portugal.

Questionada sobre os objetivos de Portugal em matéria de migrações quando assumir a presidência da União Europeia, Cláudia Pereira apontou que várias matérias do pacto das migrações e asilo serão decididas nessa altura, sublinhando que se trata do “primeiro esforço para chegar a um entendimento comum dos vários países”.

Apontou que Portugal destaca-se pela “atitude progressista em relação aos imigrantes” e à vontade de bem integrar, à semelhança do que é intenção em relação aos portugueses que emigram para outros países.

E será esta a posição que irá tentar que os outros países se possam, na medida do possível, conciliar. Vão ser muitos esforços, isso tenho a certeza. Se será possível ou não, iremos ver, mas serão feitos muitos esforços nesse sentido”.

Governo procura famílias de acolhimento para jovens refugiados

O Governo está à procura de famílias de acolhimento para jovens refugiados que chegam a Portugal sem família, uma das respostas que está a ser preparada no âmbito da revisão do modelo de acolhimento prevista para breve.

A secretária de Estado para a Inclusão e as Migrações revelou que a medida de proteção em acolhimento familiar “é uma das respostas que está a ser preparada” para integrar os 500 menores não acompanhados vindos da Grécia que Portugal se comprometeu a receber até ao final de 2021.

Este ano, Portugal recebeu já 71 jovens, 21 dos quais esta semana, na sua maioria rapazes, com idades entre os 15 e os 17 anos, oriundos de países como o Afeganistão, Síria ou Egito, que estão dispersos por Lisboa, Braga, Nazaré, Covilhã e Maia.

A questão é que normalmente [o acolhimento familiar] destina-se a jovens com menos idade e a maior parte dos jovens que se encontra na Grécia está nestas faixas etárias, mas sim faz parte das respostas as famílias de acolhimento e já foram entrevistadas algumas dessas famílias”.

A secretária de Estado frisou que “têm vindo a ser sucessivamente entrevistados” potenciais candidatos a famílias de acolhimento, uma medida de proteção dos direitos das crianças e jovens, que é temporária e transitória e que passa por colocar o menor no seio de uma família.

Cláudia Pereira admitiu que o acolhimento familiar é uma medida “mais apropriada para jovens mais novos”, e que no caso destes jovens refugidos, tendo em conta a sua idade, o objetivo é a sua autonomização, mas garantiu que “ainda assim é mesmo uma das soluções”.

Ainda não foi atribuído a nenhum jovem, mas é uma das soluções. Ainda antes de recebermos os jovens houve logo famílias que se disponibilizaram”.

Informação avançada posteriormente pelo gabinete da secretária de Estado dá conta de que o Instituto de Segurança Social (ISS) não fez ainda qualquer seleção de famílias de acolhimento, uma vez que falta ainda a portaria que regulamente este processo. No entanto, a Santa Casa da Misericórdia de Lisboa (SCML) pode fazer essa seleção na zona de Lisboa e Vale do Tejo.

“Em todo o território nacional, 11 famílias manifestaram interesse, das quais seis foram entrevistadas pela SCML por se encontrarem em Lisboa, território da sua competência de intervenção”, refere o gabinete da secretária de Estado, acrescentando que só num caso foi manifestado interesse em acolher uma criança ou jovem não acompanhado.

Refere ainda que o “principal constrangimento sentido pelas famílias” foi o “desfasamento entre a idade dos menores e a expectativa em acolher crianças mais novas”.

Relativamente ao grupo de 71 jovens que Portugal já recebeu, Cláudia Pereira fez questão de sublinhar “o entusiasmo” das equipas que os estão a receber e o facto de alguns deles já serem autónomos, como o caso de um jovem afegão que já está a viver sozinho, fala português e está a frequentar um curso profissional.

Foram desenhados os projetos de vida deles pelas entidades de quem estão a cargo e alguns vão continuar no ensino secundário, outros querem ir para a faculdade, outros para cursos profissionais e o que houve aqui foi um trabalho discreto, mas em que reunimos todas as semanas as várias áreas governativas”.

A secretária de Estado acrescentou que foi criada uma “rede estruturada” entre os Ministérios do Trabalho e Segurança Social, Administração Interna, Educação e Saúde “para que todas as questões relativas a estes menores estivessem acauteladas”.

De acordo com Cláudia Pereira, tendo em conta o perfil de cada um, estes jovens ficam a cargo ou da SCML ou do ISS, as duas entidades que ficam responsáveis pela sua autonomização, sempre em articulação com as instituições que efetivamente os acolhem.

Relativamente aos menores não acompanhados, a lógica de acolhimento e integração passa também pela dispersão pelo território nacional, em vez de concentrar todos os menores nos grandes centros urbanos, algo que a secretária de Estado entende ser “uma riqueza” para o país, nomeadamente nas zonas do interior, seja pelo aumento da população, seja pela “riqueza cultural que daí advém”.