A ministra da Saúde recusou indicar uma data para que Portugal atinja a imunidade de grupo contra o novo coronavírus. Questionada sobre o tema na audição requerida pelo CDS na Assembleia da República, mas em que participou por videochamada a partir do Ministério da Saúde, Marta Temida justificou que não pretenderia transmitir “mensagens incorretas”.

“Se algum membro do Ministério da Saúde disser que é garantido que a vamos atingir em maio, junho ou julho não é com base em factos porque não temos informações para isso. Temos de ser muito sérios. Não quero passar mensagens incorretas”, explicou Marta Temido, insistindo que prefere cingir-se à informação com base científica: “Não seria sério responder a uma pergunta para a qual não tenho informações para responder”.

Quem não for convocado para vacinação, deve contactar os centros de saúde

A ministra da Saúde complementou algumas das informações adicionados ao plano de vacinação contra a Covid-19 atualizado na quinta-feira. O documento menciona agora que as pessoas serão convocadas para serem inoculados por SMS mas, segundo Marta Temido, quem não utilizar telemóveis pode precisar de contactar por iniciativa própria os centros de saúde para receber a vacina a que tem direito.

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Nem todas vacinas vão ser usadas já. Profissionais prioritários ainda não estão definidos. Os detalhes do plano de vacinação para a Covid-19

Aliás, é mesmo possível que, apesar do reforço nos sistemas de comunicação dos centros de saúde — com o fornecimento de telemóveis, por exemplo — algumas das pessoas que devem ser vacinadas não cheguem a ser notificadas, mesmo que tenham telemóvel. Nesses casos, cada indivíduo deve procurar um agendamento para vacinação junto dos centros de saúde. Quanto às dificuldades recorrentes (e antigas) na comunicação com os centros de saúde, Marta Temido assume os problemas, mas garante que “estamos melhor”.

A ministra garantiu que a capacidade de administração de vacinas em Portugal é “muito significativa”, uma vez que, de forma regular e só no Sistema Nacional de Saúde, são administradas 22 milhões de vacinas por ano no país. Por isso, a vacinação contra a Covid-19 “é exigente mas estamos preparados”, prometeu. Marta Temido referiu-se à vacinação contra a Covid-19 como “uma grande esperança” no combate à pandemia, mas repetiu amiúde que era necessário continuar a cumprir as regras de contenção.

Isso é válido também (e sobretudo) no Natal, sublinhou a ministra da Saúde. Tal como fez com a questão do atingimento da imunidade de grupo, Marta Temido recusou-se igualmente a avançar com um número considerado plausível para os ajuntamentos na época de Natal e recordou que, mesmo entre os outros países, esse número é meramente indicativo. “O que fizemos foi pedir aos portugueses uma atitude de sensatez e compromisso. O compromisso é que nos ajudem a alinhar nesta mensagem de pedir a cada um para fazer o melhor possível, cumprindo todas as regras”, sublinhou Marta Temido.

Vacinação dos profissionais de saúde não vai depender do contrato

O primeiro lote de 9.750 doses da vacina da Pfizer/BioNTech que aterrará em Portugal a 27 de dezembro será distribuído pelos profissionais de saúde do Centro Hospitalar de Lisboa Central (que engloba seis hospitais, entre os quais o Santa Marta e o Curry Cabral, por exemplo) e do Centro Hospitalar São João. Como nem todos são elegíveis e alguns não quererão receber a vacina, é possível que as doses sejam distribuídas também por outros hospitais, mas Marta Temido não clarificou quais.

Esclareceu, isso sim, que a distribuição das vacinas pelos profissionais de saúde não vai depender do vínculo contratual que eles tenham com o hospital. Quer estejam em atividade temporária na instituição, quer sejam trabalhadores definitivos, a vacina chegará de modo prioritário a qualquer profissional de saúde que esteja envolvido na prestação de cuidados diretos a doentes com Covid-19.

Sobre o calendário de vacinação, Marta Temido indica que o país deve receber 300 mil doses em janeiro, 400 mil doses em fevereiro e 480 mil doses em março. Como a Comissão Europeia aderiu a mais quatro vacinas, há uma “grande expetativa” que elas sejam aprovadas brevemente, sobretudo as vacinas da Moderna e da AstraZeneca.

Às críticas sobre os critérios que a comissão técnica delineou para priorizar a população, o que pode colocar saudáveis à frente de pessoas doentes por causa das profissões que têm — nos ramos das forças de segurança, por exemplo —, Marta Temido nota que esta é a estratégia que se está a seguir em todos os países da União Europeia: “[As pessoas] são vacinados pelo trabalho que têm. Mesmo os jovens desenvolvem Covid-19 e morrem por Covid-19”, sublinha.

SNS demonstrou “resiliência” durante a pandemia

Marta Temido admite que o excesso de mortalidade reflete o desequilíbrio entre a resposta à epidemia de Covid-19 e às restantes doenças; e é “uma grande preocupação para o governo”. Mas “esta é uma realidade transversal a vários sistemas de saúde e mostra o impacto da pandemia”, sublinha. A ministra da Saúde recorda que o  Instituto Nacional de Saúde Doutor Ricardo Jorge (INSA) está a estudar as origens desse fenómeno.

A ministra da Saúde sublinhou até que a prestação de cuidados de saúde primários demonstrou “resiliência” graças à conversão em massa da atividade presencial em não presencial. O número de consultas hospitalares até outubro de 2020 não terá sido muito díspar do que tinha sido registado até ao mesmo mês do ano passado: foram 2,3 milhões este ano, menos 300 mil que em 2019.

A rede do Sistema Nacional de Saúde, que permite transferir doentes para outras zonas do país em caso de falência dos hospitais regionais, por exemplo, funcionou, garantiu a ministra: “Com dificuldades, naturalmente, mas com uma solidariedade e esforço que gostava de destacar. A força do SNS é a sua capacidade de trabalhar em rede e organizar em tempos de procura”.

Sobre a prestação de cuidados hospitalares, Marta Temido avançou que houve 9,2 milhões de consultas em cuidados hospitalares (até outubro de 2019 eram 10,3 milhões, avançou a ministra) e 474 mil intervenções cirúrgicas efetuadas este ano (menos 100 mil cirurgias que no ano passado).

A ministra repetiu ainda a forma como o governo tenciona compensar esses diferenciais. Em 2021, uma portaria permitirá o pagamento adicional de profissionais de saúde para participação em consultas e cirurgias desprogramadas este ano. Além disso, o SNS está a ser reforçado com acordos no setor social e privado. Até agora foram dez — oito deles renovados e expandidos; e outro dois novos. Vários hospitais têm ainda acordos para que os profissionais de saúde possam reforçar as operações clínicas nos próximos tempos.

É também por isto que Marta Temido asseverou que “é uma ficção que em não corresponde à realidade” que o governo tenha deixado de contratar definitivamente os profissionais de saúde para reforçar o SNS. “Temos tentado trazer mais profissionais de saúde para os hospitalar e transformar os acordos provisórios em definitivos”, realça.

Até novembro de 2020, o SNS tinha cerca de 48 mil enfermeiros ao serviço, enquanto no mesmo mês do ano passado eram cerca de 45,8 mil. Uma parte significativa foi contratada ao abrigo do regime excecional de combate à Covid-19, mas Marta Temido garantiu que está a ser feito um esforço para transformar os acordos temporários em definitivos. A definição de quem está abrangido por essa iniciativa dependerá dos termos do regime contratual anterior.

“Os portugueses vão ter acesso às vacinas contra a gripe”

Marta Temido revela que, neste momento, Portugal tem uma reserva de material clínico e laboratorial com 58 milhões de máscaras cirúrgicas, 50 milhões de máscaras FFP2 e FFP3; e 22 milhões de luvas. Até agora, Portugal já realizou 5,1 milhões de testes de diagnósticos. Há 128 pontos para realização de testes RT-PCR e outros 81 habilitados a fazer testes rápidos de antigénio.

A aplicação StayAway Covid, que permite alertar os utilizadores para o contacto com um caso positivo de infeção pelo novo coronavírus, já foi descarregada 2,8 milhões de vezes. Mas a ministra da Saúde indica que os códigos inseridos foram “vários, mas não tantos quanto gostaríamos”.

Quanto à vacinação contra a gripe, Marta Temido desvalorizou as demoras na inoculação contra o vírus. “Os portugueses vão ter acesso a mais de 2,5 milhões de doses de vacinas contra a gripe”, garantiu, notando que são números muito superiores a países como a Eslováquia e a Suécia.