Alexei Navalny, o principal opositor de Vladimir Putin, divulgou esta segunda-feira um telefonema que teve com um suposto agente do Serviço Federal de Segurança da Rússia (FSB). Na conversa, que durou cerca de 50 minutos, o agente explicou que a missão “correu mal” devido à rápida aterragem de emergência e que o veneno foi colocado na sua roupa interior.

Olá. Sou o Navalny. Já disse anteriormente que esta história do envenenamento é melhor do que um filme de Hollywood e você ainda não faz ideia do quão verdade isso é. Numa história clássica de detetives, há sempre uma cena em que o assassino confessa o que fez. Aqui também a temos. É incrível”.

É com este tom irónico que Navalny começa por explicar, num vídeo publicado no Youtube, como é que supostamente convenceu Konstantin Kudryavtsev — um especialista em armas químicas e biológicas do FSB, de acordo com a CNN — a contar-lhe como é que o tinha envenenado com um agente neurotóxico, do tipo Novichok.

O telefonema realizou-se por volta das 6h30 de Moscovo (3h30 em Lisboa) do dia 14 de dezembro, a partir da Alemanha, explica o site de jornalismo de investigação Bellingcat. Navalny utilizou uma aplicação que permite a configuração personalizada de um identificador de chamadas “para aumentar as hipóteses de as suas chamadas serem atendidas”. Utilizando o número de um telefone fixo do FSB, conseguiu entrar em contacto com vários agentes mas a maioria não respondia e desligava. Até chegar a vez a Kudryavtsev.

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Navalny apresentou-se como Maxim Ustinov um “assessor de Nikolai Patrushev”, presidente do Conselho de Segurança da Rússia, que queria fazer um relatório sobre as “razões do fracasso de envenenamento” do opositor russo. Do outro lado da linha, Kudryavtsev mostra-se hesitante mas acaba por contar vários pormenores de como o FSB conseguiu envenenar o opositor.

“Não esperávamos que isto acontecesse, tudo saiu mal”, confessou o agente. “O voo durava cerca de três horas, era um voo longo. Se eles não aterrassem [de emergência em Omsk], o efeito teria sido diferente e o resultado teria sido diferente. Então, acho que o avião teve um papel decisivo”, explicou.

Na semana passada, uma investigação da Bellingcat divulgou que, com base em dados telefónicos e de viagens, agentes do FSB especialistas em armas químicas vigiavam o opositor desde 2017 e estavam a 20 de agosto em Tomsk, cidade na Sibéria onde Navalny terá sido envenenado. Na chamada, Konstantin Kudryavtsev admitiu ter sido enviado a Omsk cinco dias após o internamento do opositor para eliminar quaisquer provas de envenenamento das roupas.

“Disseram-nos para ter cuidado justamente com as cuecas, por dentro”, afirmou.

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Navalny sentiu-se mal e desmaiou a 20 de agosto durante um voo doméstico na Rússia e foi transportado dois dias depois em coma para a Alemanha para ser tratado. Laboratórios na Alemanha, França e Suécia, assim como a Organização para a Proibição de Armas Químicas, demonstraram que esteve exposto a um agente neurológico Novichok da era soviética.