“Desde que o PSG começou a ganhar tudo, o Marselha não conquistou mais nenhum troféu”. A reflexão, bastante clara, é de André Villas-Boas. E acaba por ser a versão de bolso de um fenómeno que será estudado daqui a décadas, pelos investigadores que se dedicam à história do futebol, e que envolve também o Manchester City e o Chelsea em Inglaterra. Ou seja, clubes que durante anos e anos estiveram longe dos troféus, das vitórias e da glória — e que depois de serem adquiridos por investidores com largas contas bancárias passaram para o topo das classificações internas, para a conquista de títulos e até para a luta pela Liga dos Campeões.

Desde que o PSG se tornou um destes clubes, desde que o PSG passou a ser a casa de Neymar, Mbappé e Di María, o futebol francês ficou quase esvaziado de competição. O conjunto parisiense ganhou sete dos últimos oito campeonatos, cinco das últimas seis Taças de França e seis das últimas sete Taças da Liga. Mas esta quarta-feira, apesar de tudo, o Marselha tinha uma palavra a dizer sobre o primeiro troféu francês de 2021. O PSG foi campeão e ganhou a Taça no ano passado, ou seja, o clube orientado por André Villas-Boas, por ter sido o segundo classificado da liga, saltava automaticamente para o jogo da Supertaça — ou, em França, o Trophée des Champions.

“Fizemos um bom jogo em Paris [vitória por 1-0] e serve de exemplo, mas também temos coisas a melhorar. Ganhámos esse mas tivemos várias falhas defensivas e o PSG podia ter marcado golos por várias vezes. Este é um Clássico sempre muito apetecível e pelo qual os adeptos aguardam. Queremos responder com compromisso e agressividade em campo. Desde que o PSG começou a ganhar tudo, o Marselha não conquistou mais nenhum troféu. Não sinto pressão para o fazer, estou num dos campeonatos mais desequilibrados do mundo. O orçamento do PSG é muito superior ao de todos os outros”, explicou o treinador português na antevisão da partida, retirando desde logo a pressão extra que parecia estar atribuída ao Marselha.

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Certo é que o jogo desta quarta-feira não era simplesmente a oportunidade de André Villas-Boas levantar o primeiro troféu desde que está em França. Era também a oportunidade de Mauricio Pochettino, recém-chegado ao PSG, começar desde lá o próprio percurso em Paris com um título. E era, enquanto nova camada para além de tudo isto, o reencontro entre dois treinadores cujos caminhos já quase se tocaram. Villas-Boas saiu do Tottenham em dezembro de 2013 e foi substituído por Tim Sherwood, primeiro interinamente e depois de forma efetiva. Contudo, Sherwood não foi mais do que uma solução rápida da direção dos spurs para aguentar o barco até à chegada do verdadeiro senhor que se seguiu: Mauricio Pochettino.

“Tenho respeito por todos os colegas, sobretudo pelo André, com quem tenho em comum termos passado pelo Tottenham. Ele conhece o campeonato francês melhor do que eu, já cá estava, respeito o que disse, mas não quero polémicas, desejo só concentrar-me no jogo”, disse o argentino, em resposta às declarações do português sobre a diferença de elasticidade financeira entre os dois clubes. Pochettino, de regresso a França e a Paris depois de ter representado o PSG enquanto jogador, garantiu ainda que se lembra “muito bem” destes “jogos especiais”. “Percebo que não são como os outros. Há uma importância especial para os adeptos, mas também para os jogadores, eu senti isso, e agora vou viver esta experiência como treinador”, acrescentou o técnico, que adiantou desde logo que já poderia contar com Neymar e Danilo, ambos recuperados das lesões que sofreram em dezembro.

Contudo, no Stade Bolaert-Delelis, em Lens, Pochettino ainda deixava os dois jogadores no banco de suplentes, apostando em Di María, Verratti, Mbappé e Icardi na zona mais adiantada do terreno, com Paredes e Herrera a assumirem uma fase mais recuada do meio-campo. Do outro lado, André Villas-Boas colocava Thauvin e Radonjic mais junto aos corredores, com Rongier e Gueye num apoio mais direto a Payet, a referência ofensiva da equipa.

O primeiro lance de perigo do jogo pertenceu a Icardi, que cabeceou ao lado na sequência de um livre (18′). Ainda antes da meia-hora, Mbappé colocou a bola no fundo das redes pela primeira vez mas a jogada acabou anulada por fora de jogo do francês (29′). Antes do intervalo, Icardi conseguiu abrir o marcador: Florenzi cruzou largo para a grande área, o argentino desviou de cabeça e Mandanda defendeu para a frente, com o avançado a marcar na recarga (39′). 

Na segunda parte, Villas-Boas tirou o guarda-redes Mandanda para lançar o que estava no banco, Yohann Pelé — sem que fosse possível entender se o veterano guardião sofreu algum problema físico. À passagem dos dez minutos iniciais do segundo tempo, o treinador português voltou a mexer, ao colocar Sanson e Benedetto em campo para ir à procura do empate. O relógio, porém, não parava. E o golo do Marselha também não chegava.

Neymar entrou a 25 minutos do fim, regressando aos relvados depois da lesão sofrida em dezembro, e ainda foi a tempo de marcar o segundo golo dos parisienses: Icardi foi carregado em falta por Pelé no interior da grande área e o brasileiro, na conversão da grande penalidade, não falhou (85′). Danilo entrou nos instantes finais, Payet ainda fez o golo de honra (89′) mas o PSG venceu mesmo o Marselha, conquistando a Supertaça francesa, o primeiro troféu de 2021. Mauricio Pochettino confirmou a teoria de André Villas-Boas de que ninguém voltou a ganhar desde que o PSG começou a ganhar e agarrou o primeiro título enquanto treinador do clube, 11 dias depois de ter assumido oficialmente o comando técnico da equipa. Mais fez mais do que isso: o argentino venceu mesmo o primeiro troféu da carreira de treinador.