O vice-presidente da Comissão Europeia Valdis Dombrovskis considerou, em entrevista à Lusa, que o esboço do plano de recuperação e resiliência português precisa de reforço na área das reformas, salvaguardando porém que ainda não está fechado.

“Informalmente posso dizer que sim, vemos [no plano] muitos dos elementos importantes que precisam de lá estar, em termos de prioridades e das transformações verdes e digitais. Como em muitos esboços de Estados-membros, é preciso algum reforço no lado das reformas e em assegurar exatamente a ligação com o Semestre Europeu”, disse Valdis Dombrovskis à Lusa.

O responsável do colégio de comissários com a pasta ‘Uma Economia ao serviço das pessoas’ disse que as equipas técnicas europeias e portuguesas “estão a trabalhar muito intensamente nisto” e que, “em geral, o plano está a ir na direção certa”.

Questionado sobre mais detalhes, Valdis Dombrovskis afirmou que não poderia avançar mais, dado que os planos ainda não foram oficialmente submetidos e se trata “de um processo a decorrer”.

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De acordo com o responsável letão, “alguns Estados-membros estão dispostos a avançar muito rapidamente e estão a preparar intensamente os seus planos e a partilhá-los com a Comissão e engajados, e Portugal é um dos países que está muito ativo nisso”.

Relativamente à velocidade da submissão dos esboços e dos planos entre os diferentes Estados-membros da UE, o também comissário com a pasta do Comércio referiu que “quanto mais rápido houver um plano, mais rapidamente é aprovado e mais rapidamente se pode começar a implementá-lo e a receber o dinheiro”.

“Quanto mais tempo levarem as preparações do plano, mais demorada é a receção do dinheiro. Pelo lado positivo, os países que são mais lentos podem aprender com a experiência e com as trocas de ideias dos Estados-membros que foram os primeiros e isso pode ajudar a um processo mais suave”, comentou.

Valdis Dombrovskis considerou ainda “realista” o objetivo de ter o dinheiro distribuído pelos Estados-membros durante o primeiro semestre do ano, durante a presidência portuguesa do Conselho da União Europeia.

Depois de 2020 ter sido um ano de tomada de medidas, “este ano é acerca da entrega, de assegurar que o dinheiro começa realmente a chegar à economia”, estimando a aprovação dos primeiros planos na primavera.

Quanto à ratificação pelos 27 parlamentos nacionais da decisão que permitirá à Comissão Europeia ir arrecadar fundos aos mercados financeiros para assegurar sua distribuição pelos diferentes Estados-membros da UE, Valdis Dombrovskis disse que a mensagem que está a ser passada vai no sentido “de que é preciso que o façam o mais depressa possível”.

“Estivemos a discutir hoje com o ministro das Finanças na preparação do Ecofin [ministros das Finanças da União Europeia] que terá lugar na próxima terça-feira, e essa será exatamente uma das mensagens que tanto a presidência portuguesa como a Comissão Europeia irão passar”, asseverou.

O primeiro-ministro, António Costa, entregou no dia 15 de outubro, em Bruxelas, o primeiro esboço do Plano de Recuperação e Resiliência à presidente da Comissão Europeia, Ursula von der Leyen.

Em julho passado, o Conselho Europeu aprovou um Fundo de Recuperação de 750 mil milhões para fazer face à crise gerada pela covid-19.

Na quarta-feira, o Governo português aprovou, em Conselho de Ministros, a resolução relativa aos recursos próprios da União Europeia e requereu à Assembleia da República a ratificação do diploma com caráter de urgência.

Este passo legislativo dado pelo executivo, que visa permitir à Comissão Europeia proceder à emissão de dívida no âmbito do fundo de recuperação e resiliência, foi divulgado pelo próprio primeiro-ministro, António Costa, através de uma mensagem publicada na sua conta pessoal na rede social Twitter.

Nova suspensão do PEC depende de avaliação na primavera

O vice-presidente executivo da Comissão Europeia Valdis Dombrovskis afirmou igualmente que a suspensão das regras do pacto de estabilidade e crescimento em 2022 dependerá da evolução económica, apontando para uma eventual decisão na primavera.

“O nosso plano é voltar a essa discussão e a potenciais decisões no ciclo de primavera do Semestre Europeu, que é tipicamente no final de maio e início de junho”, disse, em entrevista à Lusa, Valdis Dombrovskis.

O vice-presidente executivo com a pasta ‘Uma Economia ao serviço das pessoas’ no colégio de comissários europeus referiu que uma eventual continuação da suspensão das regras do pacto de estabilidade e crescimento (PEC) “vai depender da situação económica e de como a veremos em maio/junho”.

“Não estamos com preconceito relativamente ao resultado dessa decisão”, vincou o responsável, destacando por agora que “o que ficou claro para os Estados-membros relativamente a 2021 é que a cláusula de salvaguarda [que permite a suspensão do PEC] vai continuar ativada”.

A suspensão das regras do PEC, implementada no início da crise económica desencadeada pela pandemia de covid-19, permite que os Estados-membros não cumpram as regras orçamentais de Bruxelas, como o limite de 3% do produto interno bruto (PIB) no défice das contas públicas e de 60% do PIB no rácio da dívida pública até ao final de 2021, não havendo ainda uma decisão da Comissão Europeia relativa a 2022.

Questionado sobre se todas as opções estão em cima da mesa, Valdis Dombrovskis, que também tem a pasta do Comércio, vincou a sua posição.

“Certamente. Não temos preconceito face a nenhuma decisão, teremos de ver a situação económica e tomar a decisão baseada nisso”, disse o comissário letão.

“Ainda estamos a enfrentar uma situação muito complicada relativa à pandemia de covid-19. 2020 foi um ano de decisões, decidimos sobre máxima flexibilidade dentro das nossas regras orçamentais e de ajuda estatal, permitindo aos Estados-membros o apoio às suas economias, empresas, trabalhadores, e financiar os gastos com a saúde”, referiu.

Na sexta-feira, o primeiro-ministro português, António Costa, afirmou que há consenso para só se retirar os apoios aos Estados-membros europeus quando os respetivos PIB regressarem aos níveis de 2019, admitindo assim uma suspensão do Pacto de Estabilidade para além de 2021.

António Costa falava numa conferência de imprensa conjunta com a presidente da Comissão Europeia, Ursula von der Leyen, no Centro Cultural de Belém, depois de questionado se o prolongamento da crise sanitária da covid-19 poderá também motivar uma decisão no sentido de prorrogar a suspensão das regras do Pacto de Estabilidade até ao final de 2022.

Sem assumir uma posição definitiva em matéria de um eventual prolongamento da suspensão das regras do Pacto de Estabilidade para além de 2021, o primeiro-ministro português referiu no entanto que “há um consenso muito grande entre os economistas a nível internacional de que não devem ser diminuídos os apoios cedo demais”.

Para António Costa, a ideia mais consensual “é voltar ao cumprimento das regras [do Pacto de Estabilidade] quando se atingir aquilo que são os níveis do Produto Interno Bruto (PIB) de 2019”.

Comissão Europeia espera “cooperação próxima” com Biden

O vice-presidente executivo da Comissão Europeia com a pasta do Comércio afirmou ainda que espera uma “cooperação próxima” da presidência portuguesa da União Europeia com a nova administração dos Estados Unidos, presidida por Joe Biden.

“Certamente esperamos uma relação próxima e uma cooperação próxima com a presidência portuguesa face a esse assunto”, respondeu Valdis Dombrovskis à Lusa quando questionado acerca do papel que a presidência portuguesa do Conselho da União Europeia (UE) pode ter com a nova administração dos Estados Unidos, liderada por Joe Biden.

O responsável letão considerou que “há altas esperanças relativamente à administração Biden”, dado que o presidente eleito dos Estados Unidos “já manifestou que é um grande apoiante do multilateralismo, de alianças internacionais e da melhoria da relações com a UE”.

Valdis Dombrovskis disse que o Comércio, cujas disputas da UE com os Estados Unidos marcaram o mandato do presidente Donald Trump, terá uma agenda “muito intensa durante a presidência portuguesa”.

Neste sentido, o também responsável pela pasta ‘Uma Economia ao serviço das pessoas’ disse que a UE olhará para Portugal “por exemplo, no acordo com o Mercosul, onde precisaremos de um apoio e de um ’empurrão’ da presidência portuguesa para avançar com o acordo”.

Quanto a possíveis cimeiras, Valdis Dombrovskis salvaguardou que “essa é uma prerrogativa da presidência portuguesa”, destacando o encontro com a Índia a esse nível.

Na quarta-feira, a secretária de Estado dos Assuntos Europeus disse que “gostaria muito” de ter durante a presidência portuguesa da União Europeia (UE) um primeiro encontro com o novo presidente norte-americano, Joe Biden, para debater a nova agenda transatlântica.

“Gostaríamos muito de ter durante a presidência portuguesa um primeiro encontro, uma primeira reunião, com o presidente Biden, se possível, porque virá a Bruxelas também para uma reunião na NATO ou uma outra reunião…”, disse Ana Paula Zacarias numa apresentação por videoconferência das prioridades da presidência portuguesa do Conselho da UE.

Na entrevista à Lusa, Valdis Dombrovskis falou ainda do papel social do comércio, que será abordado na revisão das políticas de Comércio da União, que serão revistas em fevereiro.

“Diria que a mensagem principal é que a UE permanece aberta a comércio livre e justo, mas seremos mais assertivos na defesa dos nossos interesses, dos nossos direitos e dos interesses das nossas empresas”, vincou.

Na parte social, a UE está a enfatizar “o papel do comércio no desenvolvimento sustentável”, lidando com assuntos como o aquecimento global, mas também “os direitos laborais”.

“Por exemplo, estamos a ver opções para ligar concessões tarifárias com a implementação de certos objetivos de desenvolvimento sustentável”, disse o responsável letão.