No cruzamento de Alcântara, em Lisboa, junto ao viaduto que segue para as docas da cidade, o único cartaz que se via há alguns dias era do candidato André Ventura. No cartaz, o líder do Chega apelava ao voto através de uma expressão que tem marcado a sua campanha: “André Ventura, Presidente dos portugueses de bem”. Agora há mais um cartaz exatamente ao lado, da candidatura do liberal Tiago Mayan Gonçalves.
No novo cartaz de Mayan Gonçalves e da Iniciativa Liberal, que funciona como resposta ao outdoor de André Ventura, lê-se uma resposta provocatória: a legenda escolhida para uma fotografia do candidato liberal é “O Presidente de todos os portugueses (até dele)”.
Mira a Marcelo: “É cada vez mais difícil ajudá-lo a terminar o mandato com dignidade”
O candidato começou o dia a correr por Belém, numa ação simbólica da corrida à Presidência da República — mas também para destacar a importância da saúde mental e física dos portugueses. Nas redes sociais, porém, Tiago Mayan Gonçalves começou o dia a apontar mira a Marcelo Rebelo de Sousa. Na internet, o desporto foi outro: combate ao Presidente-candidato.
Partilhando na sua conta uma imagem de uma notícia da Antena 1 cujo título era “Marcelo em lar do Barreiro deixa apelo ao confinamento”, o candidato fez um comentário à campanha de Marcelo Rebelo de Sousa. Escreveu: “Em menos de uma semana, Marcelo descredibilizou as orientações da DGS, pôs em causa a fiabilidade dos testes e fez campanha num lar de idosos enquanto esperava resultado do teste à Covid. É cada vez mais difícil ajudá-lo a terminar o mandato com dignidade”.
⏩ Em menos de uma semana, Marcelo descredibilizou as orientações da DGS, pôs em causa a fiabilidade dos testes e fez campanha num lar de idosos enquanto esperava resultado do teste à Covid.
É cada vez mais difícil ajudá-lo a terminar o mandato com dignidade.#Mayan2021 pic.twitter.com/szY6qAooFi
— Tiago Mayan (@LiberalMayan) January 17, 2021
“Já fizemos o aquecimento, já estamos bem lançados”
O relógio marcava as 11 horas quando Tiago Mayan Gonçalves e João Cotrim de Figueiredo, equipados a rigor — de calções, ténis e camisolas, coletes e casacos desportivos —, começaram a alongar para a corrida a Belém.
O primeiro alongamento foi ideológico: o candidato presidencial e o líder do partido que o apoia e do qual Mayan é fundador, a Iniciativa Liberal, falaram com os jornalistas sobre esta única ação de campanha de um dia em que os portugueses começaram a votar antecipadamente para as eleições presidenciais de 24 de janeiro.
João Cotrim de Figueiredo, que exerceu o seu direito de voto antecipado para poder acompanhar a noite eleitoral de Tiago Mayan Gonçalves no Porto, brincava com o facto de ter sido a segunda pessoa a votar na sua mesa de voto quando queria ter sido a primeira a preencher o boletim.
Tinha uma piadola preparada: dizer que naquela secção o Tiago Mayan tinha 100% de votos. Assim, como fui o segundo, só pude garantir que naquela altura pelo menos ia à segunda volta [tinha no mínimo 50% dos votos]”, atirava o líder da Iniciativa Liberal.
O substituto de Carlos Guimarães Pinto na liderança do partido liberal, fundado em 2017, aproveitava o ambiente descontraído para falar das qualidades de corredor do candidato que já se mostrara atleta num vídeo de campanha: “Tu és maratonista, eu sou mais fundista”.
A uma questão sobre se já tinham feito o aquecimento longe das câmaras, era o candidato presidencial que respondia aludindo à campanha eleitoral e porventura ao crescimento da candidatura nas sondagens ao longo das últimas semanas: “Já fizemos o aquecimento, já estamos bem lançados”.
A benção de Cotrim e os elogios — políticos e atléticos: “Corre para aí 3h seguidas!”
A corrida durou perto de um quarto de hora — e João Cotrim de Figueiredo, que estava com a agenda apertada, teve de terminar antes de Tiago Mayan Gonçalves. Não foi por falta de capacidade física, garantia o candidato presidencial ao Observador. A verdade é que Cotrim elogiara uns minutos antes a capacidade atlética (superior à sua) do portuense: “Este senhor corre para aí três horas seguidas!”. E até tem por hábito correr a Meia Maratona do Porto.
O líder e deputado da Iniciativa Liberal, que já estivera presente no lançamento da campanha de Tiago Mayan Gonçalves e já o elogiara então, voltou a manifestar confiança no candidato que o partido apoia. E aproveitou para deixar uma bicada aos críticos que achavam “que a Iniciativa Liberal não deveria ter um candidato porque era um partido demasiado pequeno” ou que “o Tiago não estava preparado, não tinha notoriedade nem experiência mediática” e portanto a escolha fora errada. Estavam enganados, sugeriu Cotrim:
Eu sabia que o Tiago era capaz de fazer aquilo que fez: com integridade, com coragem, assumidamente liberal, pôr as nossas ideias e o liberalismo outra vez no topo da agenda da discussão política. Nos debates o que se discute é se há uma alternativa à visão que hoje predomina em Portugal, que é sobretudo socialista e estatizante”, apontava o líder do partido fundado em 2017.
Para muitos, dizia ainda o sucessor de Carlos Guimarães Pinto na Iniciativa Liberal, o desempenho do candidato “é uma surpresa, é uma revelação” — para ele não o é — e Cotrim de Figueiredo está confiante que Tiago Mayan Gonçalves “vai ser ainda mais revelação nos sete dias que faltam”. Para já, “está a fazer uma campanha notável” e tem sido “brilhante na forma como tem formulado a alternativa” ao modelo estatal “socialista e estatizante”. Por isso, Cotrim agradece-lhe: “Obrigado, Tiago, pela coragem enorme que tiveste em avançar, pelo trabalho que estás a fazer pelo liberalismo e pela Iniciativa Liberal”.
Defendendo em declarações jornalistas que não vira “demasiadas pessoas” em Belém dado o confinamento geral decretado — “o que estou a ver é pessoas a fazer desporto, é uma das 51 exceções possíveis deste confinamento e estou a ver pessoas a fazerem o que é permitido no contexto” —, Tiago Mayan Gonçalves afirmou que era um “bom sinal” as quase 250 mil inscrições para o voto antecipado. Um sinal revelador “que as pessoas querem participar nestas eleições e se reveem nas propostas que aí estão”.
Mayan antevê bom resultado: “Responsabilidade? O que sinto é muita confiança”
A corrida em Belém serviu também para apelar aos portugueses para “não perderem a esperança num futuro, preservarem a sua saúde mental e física” — e “dar uma passeio ou uma corrida é possível para qualquer cidadão fazer”.
O candidato liberal mostrou-se ainda confiante num bom resultado eleitoral: “Esta é mais uma etapa nesta corrida que está a ter sucesso. E estou convencido que também terá sucesso a 24 de janeiro”, dia de eleições. Não fazendo previsões “númericas” sobre um possível resultado ou o que seria um bom resultado, Tiago Mayan Gonçalves não tem dúvidas: o liberalismo está em crescendo no país, há uma nova visão política — liberal em todos os aspetos — a crescer como uma onda e um resultado “em sinal de crescendo” confirmar-se-á certamente e será positivo.
Onde estão os motivos para a confiança e para o sonho? As pessoas abordam-no na rua, diz o candidato, e o seu reconhecimento “tem tido um crescendo contínuo, tenho verificado todos os dias um apoio contínuo e declarado de cada vez mais gente”. Questionado pelo Observador sobre o significado e a responsabilidade de ser o primeiro candidato presidencial da história do seu partido e de ter a responsabilidade de dar seguimento aos resultados da IL nas legislativas e nos Açores, Mayan Gonçalves dizia sentir mais “confiança” do que responsabilidade.
Responsabilidade tenho-a sempre. Um liberal pugna pela liberdade associada à responsabilidade. Quando assumi esta candidatura, assumi-a com muita responsabilidade e também com muita honra. Mas o que sinto neste momento é muita confiança pelos sinais que vou recebendo, pelas oportunidades que tenho tido de transmitir esta mensagem e esta visão. Portanto veremos. Hoje já há pessoas a votar e dia 24 saberemos o resultado. Estou confiante”, apontava Mayan.
O que significa tudo isto? Que resultado pode vir aí? Na campanha, ninguém arrisca números — e o candidato diz em público que até pela excecionalidade destas eleições “é muito difícil fazer esses exercícios” futuristas, pelo que “veremos o que isto significa”. Mas em surdina a convicção forte é de que o candidato pode superar significativamente a votação do partido nas últimas legislativas, que foi de 1,3%.
A última sondagem do Observador/TVI dava a Tiago Mayan uma projeção de votação entre os 1,9% e os 2,3%. Um resultado acima dos 2% e à frente de Vitorino Silva (que aparece com sondagens de 1,7% a 2,1%) seria sempre positivo, mas o sonho, difícil, é o de superar uma ou até duas candidaturas à esquerda: as de João Ferreira e/ou Marisa Matias, os candidatos que Mayan coloca no campo político e ideológico mais distante de si.
(Este artigo foi atualizado ao longo do dia)