Artigo em atualização ao longo do dia

O Bloco de Esquerda assegura que as acusações de espionagem por parte do líder do Chega são falsas. Após André Ventura revelar ter provas de que o partido que apoia a candidatura de Marisa Matias está a espiar a comitiva que o acompanha por todo o país, a organização da campanha apoiada pelo Bloco diz que as “acusações, além de mentirosas, são absurdas”.

“A carrinha referida é usada pela equipa da campanha presidencial da Marisa Matias e tem acompanhado as ações da candidata, como qualquer jornalista pode confirmar. Esteve no comício virtual de São João da Madeira, no dia 15. E seguiu nessa mesma noite para Viseu, para preparar a iniciativa que Marisa Matias realizou nesta cidade no dia seguinte”, garante o Bloco de Esquerda, para justificar a presença da carrinha em Viseu onde, de facto, Marisa Matias fez um comício virtual no dia a seguir à passagem da comitiva de Ventura. Quanto à Guarda, a candidata a Belém não esteve neste distrito e a organização assegura que a carrinha em causa também não.

Além das acusações sobre a presença de uma carrinha do Bloco, a organização refere ainda que “não organizou qualquer manifestação” e que estas terão sido organizadas “por organizações e pessoas que combatem o racismo”.

“Percebemos que o candidato da extrema-direita esteja com medo da solidariedade de um país que se levantou contra quem insulta mulheres. Mas estas acusações, além de mentirosas, são absurdas”, pode ler-se na reação do Bloco.

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Treinadora Marisa quer país transformado numa Seleção nacional

“Volta para o teu país.” A frase que “tantos imigrantes ouvem” é a “linguagem da agressão e do ódio” que Marisa Matias recusa em Portugal. É a frase que “o deputado de extrema-direita disse a uma deputada nascida em Bissau e que é uma portuguesa eleita”, é a frase “do racismo para tantos imigrantes”. O tema foi o foco do comício virtual desta noite, em Almada. Não é um 4-3-3 ou um 4-4-2, até porque o modelo de jogo é o menos importante, já que a treinadora Marisa está mais preocupada com o resultado final.

Vamos por partes porque pode parecer que estamos numa análise desportiva, mas não. Marisa Matias quer que Portugal seja um espelho da seleção nacional de futebol, onde ninguém deixa de ser convocado, de se sentar no banco, de ser titular ou de marcar por causa da cor, raça ou país de origem. A começar no Ricardo Quaresma – que já chegou a responder a André Ventura diretamente -, a continuar com um drible de Eusébio, com Coluna a centrar ou Éder a rematar: houve e há espaço para todos. “Os racistas detestam esta Seleção de futebol com todas as cores, vivem neste drama: dizem que querem viver com os imigrantes, mas não se atrevem a dizer a metade da Seleção de futebol que deve ir para a sua terra e ser expulsa de Portugal”, atira a candidata a Belém, que acrescenta ainda que “talvez a extrema-direita goste de imaginar uma equipa sem imigrantes, branca como a cal”, mas essa seria uma equipa que “ficava sem defesa, sem linha média e quase sempre sem avançados”.

Marisa considera que esta é a “lição” da Seleção, em que é como “o nosso país”, um sítio onde “cabem todos, todas e onde toda a gente é precisa”. Aliás, realça, o país deve “imenso aos imigrantes” que “contribuíram com 884 milhões de euros líquidos para a Segurança Social” e “pagaram quase 10 vezes mais do que aquilo que receberam em subsídio de desemprego ou proteção social”.

“Portugal tem de ser o lugar da diversidade e do respeito e o lugar da igualdade”, terminou, deixando uma promessa: “Sempre que alguém vos disser ‘vai para a tua terra’, eu direi ‘bem-vindo, esta é a tua terra'”.

No comício virtual de Almada, foi a vez de Fernando Rosas se atirar à extrema-direita ao referir que estas eleições trouxeram à ribalta um “bufão que faz do insulto em todas as direções o único argumento”. O fundador do Bloco de Esquerda considera que a campanha de Ventura “faz do ódio e da baixaria contra a dignidade dos direitos das mulheres e dos imigrantes” e que “escarnece da dor dos doentes, da angústia das famílias, dos trabalhadores da linha da frente numa campanha onde diariamente se violam as normas básicas”.

Rosas fala ainda numa campanha de “demagogia e de mentira torrencial”, onde se “manipula o medo e insegurança dos que foram deixados para trás pela impiedade do capitalismo neoliberal”, e na qual se destaca o “escândalo da duplicidade”.

“É a campanha que desafia Abril e a democracia conquistada pelo sangue, suor e lágrimas de tantos”, recorda, apontando que este património é “vilipendiado pela xenofobia, racismo, misógina dessa candidatura do fascismo engravatado”.

No restaurante do senhor Luís “o mealheiro está-se a acabar” e chegam “zero apoios” 

Entrar n’A Casa do Peixe, em Setúbal, é entrar na casa do senhor Luís Rebelo, no sítio que está de portas abertas a pessoas e animais, onde há porquinhos da índia a circular livremente, o coelho Zé e 13 tartarugas que vieram de casa de clientes e que por aqui ficaram. É uma espécie de santuário de animais, onde as pessoas vêm à procura de peixe “acabado de pescar”, mas não por estes dias. Agora, só os animais é que continuam cá dentro. De portas abertas há dez anos, está hoje numa “incerteza que é o caos”. Em 2020, passou de seis empregados para dois e o “mealheiro está a acabar” com perdas de faturação que rondam os 80%.

Hoje, o senhor Luís sente-se um “sócio minoritário” do seu próprio negócio, enquanto “o sócio maioritário é a Autoridade Tributária”. É quase como o Novo Banco, ironiza, a Autoridade Tributária fica com a “parte boa” e “eu com a má”. Com o país em confinamento e os restaurantes fechados, a comida só sai daqui em take away. Mas, na verdade, este é um modelo que na opinião do proprietário “não funciona”. Ontem vendeu apenas uma refeição. “O medo sobrepõe-se a tudo”, tenta justificar o dono do restaurante, que entende as pessoas e o que se está a viver. E as empresas de distribuição também “não são a solução” para os restaurantes. Luís Rebelo queixa-se das taxas que são entre os 30 e os 40%, mas ainda tem de pagar o IVA.

No setor da restauração apela-se a apoios diretos porque a “restauração não está moribunda, está morta” e os setores que dependiam da restauração também. Os meses de verão “não deram para recuperar nem criaram suporte para o que vai a seguir” e o Luís Rebelo pede apoios diretos porque os que existem são “muito mais água do que pão”. Na mão um papel que lembra o plano de recuperação de Costa e Silva e a ideia de que “tem de haver mais Estado”.

Até agora, do Estado recebeu “zero” e alerta para a possibilidade de fechar. Aliás, vai mais longe e lembra mesmo Marisa Matias que talvez o setor da restauração estar a braços com estas dificuldades seja “muito mais grave” do que fechar a AutoEuropa.

“Deixem-nos trabalhar, não precisamos de mais nada”, apela. “Os restaurante em Setúbal vivem do local, do peixe, Setúbal é muito mais do que choco frito. À uma da tarde vem alguém almoçar? Vamo-nos inglesar, vamos para o brunch, para o pequeno almoço? Estamos a desvirtuar o que é português, a açorda, o bacalhau, o peixe assado, a sardinha. Vamos comer sardinha com ketchup e batatas fritas?” O senhor Luís revolta-se com o momento que Portugal atravessa, mas troca as lamurias por metáforas e sorrisos e vai fazendo o que pode para manter os postos de trabalho que ainda restam.

Marisa Matias coloca pessoas como este empresário entre os “rostos da linha da frente” e insiste na necessidade de “o Estado intervir”, depois de ter havido uma “falta de preparação para a segunda e terceira vaga”. Este é o “momento de segurar o emprego” para não deixar este setor e esta atividade irem “abaixo”.

A candidata tem dito diversas vezes que é preciso seguir as indicações das autoridades de saúde e não se atira às horas de fecho dos restaurantes, mas realça a importância de haver um “apoio direto, sem medicações, atrasos e limitações”.

Questionada sobre as medidas que foram anunciadas por António Costa, a bloquista volta a falar em “erro” quando se esperava uma comunicação sobre a requisição do setor privado e o Governo considera que ainda não está na hora, mas também por não terem sido anunciados mais apoios que permitam “sobreviver”. “Não há nenhuma dúvida do que precisamos, que é de segurar emprego, de Estado e de apoios públicos, é isso que vai segurar a economia”, alerta.

Num restaurante fechado e sem clientes, e confrontada com o comício/jantar de André Ventura, que muito deu que falar, Marisa Matias pediu responsabilidade e que “não se faça das situações de risco uma situação regular”. “É uma obrigação e um exemplo manter as regras e as condições sanitárias e não estar a insultar com ações de campanha profissionais de saúde que estão sobrecarregados, exaustos e que estão a dar tudo o que está ao seu alcance para salvar vidas”, afirma, acrescentando que “não é aceitável quem utilize este contexto não para ouvir as pessoas, mas para insultar quem está a fazer tudo o que pode e não pode para salvar vidas”.

Na hora da despedida, o senhor Luís quer que ninguém esqueça uma das frases que está escrita a giz: “Nós somos a nossa história.” Pelas paredes, há outros recados, tal como na voz do dono do restaurante: “Quem aqui entra, é como estar num workshop.”