Foi um discurso de final de campanha com várias camadas o de André Ventura. O líder e candidato do Chega voltou a prometer uma segunda volta, embora nenhuma sondagem aponte nesse sentido, regojizou-se com o facto de poder vir a ter mais votos que Marisa Matias e João Ferreira (quando o seu objetivo inicial foi sempre ter mais votos que Ana Gomes), apontou para um futuro em que acredita que vai liderar a direita e deixou um recado para dentro do partido: “Mesmo depois de domingo continuarei a lutar, seja qual for a vontade dos militantes do Chega. Seja qual for o veredicto, já demos um grande passo para essa transformação.”
Esta última ideia tem uma razão de ser. Ventura partiu para esta campanha prometendo ficar em segundo lugar, à frente de Ana Gomes. Caso contrário, repetiu várias vez, demitir-se-ia da liderança do Chega, mesmo que viesse a recandidatar-se. O elevar das expectativas tem um peso óbvio: se falhar nos seus objetivos — como parecem indiciar todos os estudos de opinião nos últimos dias –, terá de estar à altura das suas palavras. E testar a sua resistência dentro de um partido que vive de convulsões.
Ventura, no entanto, vai apontando já para o futuro. Tal como fez em vários dias desta campanha, como aqui e aqui, o líder do Chega aproveito o discurso final para apontar ao coração de PSD e CDS. “Acabou o tempo de sermos fofinhos. Vejam o que aconteceu ao PSD e ao CDS, a destruir-se passo a passo quando só o Chega cresce em Portugal”, atirou.
O líder do Chega luta nestas eleições por um resultado que o capitalize e ao partido como a terceira força política do país. Daí que tenha colocado especial ênfase no ataque aos candidatos do Bloco de Esquerda e do PCP. “No domingo, ninguém falará de outra coisa que não a nossa grande e retumbante vitória. Marisa Matias e João Ferreira juntos não chegarão à minha votação no domingo.”




JOÃO PEDRO MORAIS/OBSERVADOR
Marcelo, uma “vergonha” de Presidente e a colagem a António Costa
Sabendo que tem de crescer à direita para engrossar o eleitorado potencial, Ventura não esqueceu a estratégia que colocou em prática sobretudo na segunda metade da campanha eleitoral e atacou Marcelo Rebelo de Sousa colando-o a António Costa.
Merecíamos outro presidente que não se escudasse atrás do Governo. Agora evita andar na rua para ouvir o que os portugueses têm para lhe dizer. Refugia-se e esconde-se. Se é cúmplice deste Governo deverá cair quando este Governo cair.”
A esse propósito, Ventura não esqueceu o incidente em Setúbal — voltaria a dizer que “nenhuma bala ou faca” o vai travar — e criticou Marcelo por não ter condenado o episódio. “Até à hora em que estamos, Marcelo não me telefonou. Ligou para programas de TV, ligou para toda a gente, mas quando um adversário político é ofendido, apedrejado, não conseguiu ter uma palavra de condenação . Está a dizer que se algo de grave tivesse acontecido não era assim tão mau”, acusou Ventura.
De Marcelo, Ventura passou para Costa e antecipou uma saída de cena pela porta pequena para o socialista. “Digam-me uma crise que tenha sido superada pelos socialistas. Mário Soares esteve lá, António Guterres esteve lá, o ‘engenheiro’ esteve lá e agora é António Costa. Cobardes.”
E como o plano do líder do Chega sempre foi apresentar-se como a única força capaz de derrotar o sistema, Ventura começou o discurso como acabou. Prólogo: “Meus amigos, habituem-se, nunca nos vamos calar”. Epílogo: “No domingo, só vai haver um vendaval que é o nosso em Portugal”. Domingo os eleitores ditarão se as convicções de Ventura têm ou não razão de ser.