O Observatório Cidadão para Saúde (OCS), organização não-governamental moçambicana, denunciou esta quinta-feira a venda ilícita de testes à Covid-19 nos principais hospitais de Maputo, onde deveria ser gratuita.

A pesquisa da ONG aponta a subida exponencial da procura por testes em Maputo, desde janeiro, e as dificuldades de testagem por parte do SNS, como razões para o recurso ao pagamento ilícito por parte de alguns utentes.

Segundo a organização, os testes são vendidos a preços entre 1.500 meticais (16,4 euros) e 2.000 meticais (21,92 euros).

O trabalho divulgado hoje pelo OCS refere que técnicos e profissionais de saúde do Hospital Central de Maputo, Hospital Geral de Mavalane e Hospital Geral José Macamo estarão envolvidos em cobranças para a realização de testes, contrariando o princípio da gratuidade do Sistema Nacional de Saúde (SNS) e das análises de covid-19.

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“Pelo menos uma dezena de pessoas fazem os testes diariamente, recorrendo a esquemas de fraude. O OCS decidiu fazer este trabalho de apuramento das evidências depois de uma denúncia que recebeu em janeiro”, refere a pesquisa.

Hilário Taímo, do OCS e que participou na pesquisa, disse à Lusa que o esquema é tão clandestino que é difícil às direções dos hospitais saberem que os testes de Covid-19 estão à venda.

Os grupos que estão envolvidos neste esquema fraudulento tomam todos os cuidados para que as direções dos hospitais não detetem as cobranças ilícitas”, afirmou Taimo.

A fonte avançou que os resultados dos testes são verdadeiros, porque são baseados na amostra da pessoa que paga o teste e o diagnóstico segue o circuito normal de testagem, que incluiu a etapa decisão de análises laboratoriais.

“O que está em causa não é a veracidade dos resultados dos exames, mas o pagamento ilegal, que pode acabar minando a credibilidade de todo o circuito de testagem”, disse Hilário Taimo.

Os testes “ilegalmente comprados” levam depois o mesmo tempo de análise, tal como os que são feitos por via legal, ou seja, entre três e cinco dias, acrescentou.

“A falta de testes, a escolha [pelos serviços de saúde] de quem, de entre os pacientes, deve fazer o teste e, naturalmente, a diferenciação dos mais graves em relação aos não graves, pode ter propiciado o surgimento deste esquema de venda de testes de Covid-19”, lê-se no documento.

Pelo menos três funcionários de cada um dos três estabelecimentos de saúde estão envolvidos na operação, prossegue o texto.

O estudo do OCS divulga extratos de supostas conversas por mensagem telefónica entre um utente e um funcionário envolvido no negócio ilícito de testes.

A pesquisa também denuncia a prioridade dada a “falsos familiares” de técnicos e profissionais de saúde nas filas de testagem de Covid-19, assinalando que a situação também pode estar a dar cobertura a cobranças ilícitas.

“A venda de testes prejudica milhares de cidadãos que têm de fazer o teste, porque estão desprovidos de meios financeiros para pagar, quer no privado, quer no público, onde esta prática ilegal floresce a olhos vistos”, refere o estudo.

O OCS sublinha que a maioria dos moçambicanos não tem meios para recorrer aos laboratórios privados, que cobram entre 3.800 meticais (41,65 euros) e 5.000 meticais (54,8 euros).

Esses valores são “elevados e insuportáveis para uma grande maioria de cidadãos moçambicanos, que vivem com o salário mínimo”.

Apesar das tentativas, a Lusa não conseguiu obter uma reação do Ministério da Saúde (Misau) à denúncia do OCS.

Moçambique regista um total acumulado de 486 mortes e 46.736 casos de infeção pelo novo coronavírus, 60% dos quais recuperados.