A instabilidade política, a crise económica e o conflito diplomático com a Sérvia permanecem os principais desafios do Kosovo, 12 anos após a autoproclamação da independência após um conflito em que a intervenção da NATO foi decisiva.

O Kosovo, que a Sérvia considera o “berço” da sua nacionalidade e da sua religião ortodoxa, voltou a ser integrado no reino eslavo no início do século XX na sequência do recuo otomano nos Balcãs, após uma longa presença de mais de quatro séculos.

Mas a indefinição do seu estatuto constitui hoje um dos principais focos de instabilidade nesta região da Europa.

No pequeno território com um terço da superfície do Alentejo (10.887 quilómetros quadrados, atualmente com 1,8 milhões de habitantes), a população albanesa local, convertida ao islão e com crescente peso demográfico, foi intensificando as suas ambições secessionistas, e em 1974 a Constituição da Jugoslávia socialista liderada por Tito concede-lhe o estatuto de “província autónoma” integrada na Servia, uma das seis repúblicas da federação.

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Após a morte de Tito em 1980, eclodem violentos protestos albaneses em Pristina e outras cidades do Kosovo exigindo mais autonomia, duramente reprimidos pelas forças federais.

Nove anos depois, com a chegada ao poder de Slobodan Milosevic, a Sérvia anula a autonomia do Kosovo (e da província da Voivodina a norte), num período em que as pulsões nacionalistas acabam por implicar a destruição da Jugoslávia.

O conflito entre o anunciado Exército de Libertação do Kosovo (UÇK, separatistas albaneses), que recorre a táticas terroristas, e as forças militares e policiais sérvias, que respondem com crescente repressão, implicará em março de 1999 uma intervenção militar da NATO, a primeira na sua história, através de bombardeamentos contra a República Federal da Jugoslávia (reduzida à Sérvia e Montenegro).

No entanto, diplomatas internacionais tinham tentado evitar a guerra ao enviarem para o Kosovo uma “Missão de verificação”, a mais importante operação jamais organizada pela Organização para a Segurança e Cooperação na Europa (OSCE), e de seguida convidando todos os intervenientes no conflito à conferência de Rambouillet, que fracassou.

Na sequência destes acontecimentos, o Kosovo, até então uma província da Sérvia, mas de maioria muçulmana, torna-se um “protetorado” da ONU com a presença de uma significativa força militar da NATO (Kfor), até à autoproclamação da independência em 2008 pela liderança albanesa local.

A ilusão criada entre a população albanesa (cerca de 90%) pela independência não foi recompensada, apesar do forte apoio ocidental, em particular dos Estados Unidos, e o Kosovo regista hoje o terceiro Produto interno bruto (PIB) per capita mais baixo da Europa.

É ainda o país mais jovem da Europa, com uma média etária de 30 anos, mas com uma taxa de desemprego juvenil de 54%, que implicou uma forte imigração.

Em 2019, cerca de 30% dos kosovares vivia no estrangeiro e, segundo o Banco Mundial, as suas remessas em dinheiro constituem 15% do PIB.

A endémica instabilidade política também tem expressão no destino do primeiro Presidente do Kosovo Hashim Thaçi, antigo “dirigente político” do UÇK, e que, acompanhado pelos principais chefes da “guerra da independência”, se encontra em Haia, todos aguardando o seu processo por alegados crimes de guerra e crimes contra a humanidade cometidos durante o conflito.

Um total de 117 dos 193 países da ONU reconheceram a independência do Kosovo — apesar de os números se alterarem com alguma frequência — incluindo os Estados Unidos e 22 dos 27 Estados-membros da União Europeia (à exceção de Espanha, Roménia, Eslováquia, Grécia e Chipre).

Pristina também foi reconhecida por instituições como o Fundo Monetário Internacional (FMI), Banco Mundial e Comité Olímpico Internacional.

Por outro lado, para além da Sérvia, que continua a considerar o Kosovo parte integrante do seu território, países como Rússia, China, Índia, Brasil, África do Sul ou Argentina não reconheceram a independência, apesar de em 2010 e numa opinião consultiva, o Tribunal internacional de justiça tenha considerado que “não violou a lei internacional em geral”.

Apesar de os Estados Unidos terem sido os grandes impulsionadores da independência do Kosovo, a União Europeia (UE) assumiu desde 2011, com escassos resultados, a mediação das negociações para a normalização das relações com a Sérvia, decisiva para a estabilização desta região dos Balcãs.

A UE insiste que uma possível adesão ao espaço comunitário implica acordos com a Sérvia — que já iniciou oficialmente morosas negociações com Bruxelas — em particular no domínio económico. Hoje, os kosovares são os únicos da região balcânica que apenas podem viajar para a UE mediante um visto.

Em setembro, Belgrado e Pristina anunciaram uma normalização das relações económicas, num acordo imposto pelos Estados Unidos e que incluía o reconhecimento de Jerusalém como capital de Israel, uma posição contrária à abordagem da União Europeia.

A liderança do Kosovo já confirmou a disponibilidade para abrir uma embaixada em Jerusalém, mas a Sérvia ainda mantém a sua representação em Telavive.

Cerca de 200.000 sérvios abandonaram o Kosovo desde o início dos bombardeamentos da NATO, e pouco mais de 130.000 permanecem no território, em particular no norte, junto à fronteira com a Sérvia.

Belgrado considera-os cidadãos de pleno direito, podendo votar nas eleições, e financia centros educativos em língua sérvia. A concessão a estas comunidades de um estatuto de autonomia permanece um dos temas mais polémicos das negociações.