Os pais e diretores escolares acreditam que as escolas estão preparadas para reabrir, defendendo que sempre foram locais seguros, mas pedem mais testes de rastreio à Covid-19 e, eventualmente, a vacinação dos profissionais para reforçar a confiança.

O plano de desconfinamento no âmbito da pandemia de Covid-19 só deverá ser conhecido na próxima semana, mas vários membros do Governo transmitiram já a intenção de começar pelas escolas, aumentando a expectativa de que alguns alunos possam começar a regressar a partir de dia 15. Tanto as famílias como os diretores anseiam esse regresso e, em declarações à Lusa, os representantes de ambos disseram confiar que as escolas estão tão preparadas agora como estavam em setembro.

“As escolas souberam preparar-se oportunamente e sempre foram espaços muito seguros“, afirmou Manuel Pereira, presidente da Associação Nacional de Dirigentes Escolares (ANDE), defendendo que os estabelecimentos de ensino “estão em condições de receber os alunos rapidamente, pelo menos os mais novos”.

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O sentimento é partilhado por Jorge Ascenção, representante dos pais, que acredita que o encerramento das escolas não aconteceu por serem, em si mesmas, espaços pouco seguros, mas antes para ajudar a conter o agravamento da situação epidemiológica no país.

Para o presidente da Confederação Nacional das Associações de Pais (Confap), a segurança sanitária nas escolas não está em causa, mas, ainda assim, Jorge Ascenção defende o reforço da testagem. Essa é, aliás, a intenção da Direção-Geral da Saúde (DGS) que, na norma atualizada na semana passada, recomenda rastreios laboratoriais regulares (de 14 em 14 dias) nos estabelecimentos de ensino ao pessoal docente e não docente e, no caso do secundário, também aos alunos.

É conveniente que as escolas estejam preparadas para testar, testar, testar. De modo a que, logo que um surto seja identificado, possa ser confinado”, concordou Rui Martins, presidente da Confederação Nacional Independente de Pais e Encarregados de Educação (CNIPE).

Por outro lado, da parte dos diretores escolares, Filinto Lima sublinha também a importância de reforçar o rastreio nas escolas, mas questiona se há a capacidade para cumprir a norma da DGS quando o ensino começar a desconfinar. “Neste momento os profissionais que estão nas escolas de referência estão a ser alvo desses rastreios, mas estamos a falar de um número residual de professores e funcionários. Não sei se o sistema terá capacidade para acompanhar o regresso dos professores“, disse o presidente da Associação Nacional de Diretores de Agrupamentos e Escolas Públicas (ANDAEP).

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Se isso for possível, Filinto Lima considera que será uma fonte de confiança importante às comunidades educativas, mas defende que o “passo decisivo” seria outro. “O passo decisivo era priorizar professores e funcionários na toma da vacina antes do regresso às aulas“, sublinhou o presidente da ANDAEP, defendendo que esse processo de vacinação comece desde logo pelos profissionais que estão naquelas escolas de referência que se mantém abertas durante o período em que vigora o ensino a distância.

A porta para essa possibilidade foi aberta pela ministra da Saúde, na terça-feira, que admitiu os professores e o pessoal não docente possam ser incluídos como prioritários para a vacinação, ao considerar que as escolas são um “serviço essencial”.

Quando falamos de serviços essenciais, e as escolas são de alguma forma na nossa abordagem social um serviço essencial, poderá fazer sentido que os adultos que trabalham nestes locais tenham uma vacinação diferenciada”, afirmou Marta Temido em entrevista ao Jornal da Noite da SIC.

Na reação a essa possibilidade, a palavra “confiança” é repetida pelos representantes dos diretores escolares e também dos pais, que consideram que seria mais uma forma de transmitir mais segurança a todos.

Sobre o processo de desconfinamento das escolas, todos concordam com a reabertura faseada, começando pelos mais novos e sublinham que a decisão deve depender do parecer positivo dos especialistas. O plano de desconfinamento é apresentado no dia 11 de março e, segundo o primeiro-ministro, António Costa, será gradual, progressivo e diferenciado em termos de abertura de atividades.

As escolas estão encerradas desde 22 de janeiro, quando o Governo anunciou uma interrupção letiva antecipada de duas semanas. As aulas retomaram a 08 de fevereiro, mas à distância, à semelhança do que aconteceu no ano passado.

Ensino à distância 2.0 está melhor, mas longe de substituir presencial

Os diretores escolares e as famílias fazem ainda um balanço positivo do ensino à distância, imposto pela pandemia de Covid-19, reconhecendo que está a correr melhor do que no ano passado, mas ainda há dificuldades e nada substitui o presencial.

Há quase um mês em ensino à distância, devido ao agravamento da pandemia em Portugal, os representantes desses dois elementos da comunidade educativa olham para trás e não têm dúvidas: a versão 2.0 das aulas ‘online’ está a ser bastante melhor do que a primeira experiência, mas não é um oásis.

“Tem corrido bastante bem, atendendo às circunstâncias, e foi possível usar a experiência do primeiro confinamento, que nos ajudou a resolver alguns problemas, mas nenhum de nós está convencido que o ensino a distância substitua o ensino presencial”, disse à Lusa o presidente da Associação Nacional de Dirigentes Escolares (ANDE).

Apesar do balanço positivo, Manuel Pereira aponta problemas que não são novidade, mas persistem: alunos com dificuldades no acesso à Internet, crianças ainda muito dependente do acompanhamento dos pais e falta de condições de trabalho em casa.

Neste ensino à distância, o Ministério da Educação alargou o acesso às escolas de referência para acolhimento, que passaram a receber também os estudantes com necessidades educativas especiais e aqueles que não tinham condições para acompanhar as aulas ‘online’.

“Estamos muito atentos e, se um aluno tiver faltas injustificadas, embora tenha condições em casa, é referenciado de imediato para vir frequentar o sistema ‘online’ na escola”, explicou o presidente de outra associação representativa dos diretores escolares.

Para Filinto Lima, da Associação Nacional de Diretores de Agrupamentos e Escolas Públicas (ANDAEP), essas condições em casa ultrapassam a disponibilidade de um computador e acesso à Internet, sendo mais importante o próprio ambiente doméstico.

Que me interessa a mim que um aluno tenha um computador que é uma espécie de Ferrari, se só pode conduzi-lo num caminho de cabras?”, compara.

Nas mais de 700 escolas de referência, os alunos têm material e uma equipa para os ajudar a acompanhar através do computador as aulas que continuam a ser dadas pelos seus professores, e também do lado dos pais essa alternativa foi considerada fundamental.

“É uma ajuda essencial para quem não tem outra forma de acompanhar as aulas e até para evitar danos maiores, porque neste tipo de ensino muitas crianças regridem nas aprendizagens e esta é uma forma de minimizar a situação”, considerou o presidente da Confederação Nacional das Associações de Pais (Confap).

Para Jorge Ascenção, uma das principais falhas que se manteve neste novo ensino a distância prende-se, por outro lado, com a forma como o trabalho foi organizado. As escolas tiveram autonomia para definir a percentagem de aulas síncronas e assíncronas e enquanto umas optaram por replicar para o ‘online’ o horário das aulas presidenciais, uma opção que os representantes dos pais e diretores consideram desajustada, outras parecem não assegurar acompanhamento suficiente. “Muitas vezes, depende mais das pessoas do que dos recursos, e temos situações muito dispersas. Há situações em que se liga só uma vez por dia e noutras nem isso”, lamenta Jorge Ascenção.

Por outro lado, Rui Martins, que lidera a Confederação Nacional Independente de Pais e Encarregados de Educação (CNIPE), sublinha também as dificuldades sentidas pelas próprias famílias em gerir a escola dentro de casa. “Isto veio obrigar a que as famílias tivessem feito um esforço acrescido e têm sido dias muito instáveis”, disse, referindo o importante contributo do alargamento do apoio à família, que passou a incluir pais que têm a cargo crianças até ao final do primeiro ciclo, e que entrou em vigor na semana passada.

Ainda assim, acrescenta, o cenário não se torna muito menos complexo para as famílias que têm, neste momento, mais de um filho em ensino a distância. Apesar da lista mais curta de problemas apontados agora, relativamente ao período de ensino a distância que marcou o ano letivo passado, e das soluções que têm a vindo ser adotadas, pais e diretores continuam preocupados com os efeitos nas aprendizagens.

“Creio que são as crianças mais novas, sobretudo do 1.º ciclo, que poderão pagar a fatura mais pesada nos próximos anos e terá de haver nos próximos tempos um investimento forte do Ministério da Educação para recuperar e consolidar aprendizagens”, considerou Filinto Lima.

O outro representante dos diretores, Manuel Pereira, vai mais longe e considera que a situação é mais grave este ano, considerando que já no 1.º período letivo muitas escolas tiveram alunos e turmas inteiras em casa devido a surtos de Covid-19. Além desta, Rui Martins da CNIPE refere uma preocupação mais imediata, que não se resolve com a consolidação a longo prazo das aprendizagens e para os quais considera urgente encontrar uma alternativa: os alunos que vão realizar exames de acesso ao ensino superior.

Os estabelecimentos de ensino estão encerrados desde o final de janeiro, quando o Governo anunciou a suspensão das atividades letivas durante duas semanas, que seriam compensadas no Carnaval, Páscoa e numa semana extra do final do ano letivo. Entretanto, as aulas foram retomadas no dia 08 de fevereiro, mas em regime de ensino à distância, à semelhança do que aconteceu no ano passado. A data para o regresso deverá ser conhecida na próxima semana.