A Iniciativa Liberal deu uma nega a Carlos Moedas e à megacoligação de direita que o antigo comissário europeu está a construir em Lisboa e anunciou um candidato próprio. O presidente do partido, João Cotrim Figueiredo, revelou, este sábado, na Praça do Município, que o gestor Miguel Quintas será o candidato à presidência da Câmara de Lisboa, com Ana Pedrosa-Augusto em segundo lugar. Miguel Quintas tem um percurso em parte parecido com o de Cotrim Figueiredo, com carreira no setor do Turismo. Já Ana Pedrosa-Augusto teve a primeira experiência política na Aliança, onde foi vice-presidente do partido e de onde saiu há cinco meses. É advogada e representou Madonna.

O candidato apoiado pelo PSD, Carlos Moedas, já reagiu no Twitter desvalorizando não contar com a Iniciativa Liberal: “Para mim nada mudou“. Carlos Moedas diz que respeita “democraticamente a decisão da IL”, mas que o seu “projeto de mudança cresce todos os dias com apoios das mais diversas áreas”. E avisa os liberais que só ele pode derrotar Fernando Medina: “Somos os únicos que podemos derrotar a governação de Fernando Medina. Cada um de nós, lisboetas, tem a responsabilidade desta escolha”.

Voltando à decisão da IL e à apresentação do início desta tarde de sábado, Cotrim Figueiredo diz que a “decisão não é fácil, mas é a certa”, admite o líder da Iniciativa Liberal, ao referir que “a maior parte dos partidos tem uma tentação de ter sucessos eleitorais imediatos” e que para o partido “estes sucessos eleitorais só têm sentido sem atalhos e com coerência”. “Achamos que esses lugares e mandatos devem ser conquistados não mudando apenas caras, mas mudando políticas e sobretudo forma de fazer política”, aponta. Cotrim Figueiredo assume que a decisão tem “óbvios riscos mediáticos e eleitorais”, mas a “coragem” de os correr falou mais alto.

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Não houve “negociação de mercearia” com o PSD

“Um partido normal preferia não arriscar e ir numa coligação com lugares garantidos em vez de se afirmar como um projeto alternativo”, realçou, ao esclarecer que a IL “não é um partido com a mesma lógica de poder dos outros”, pois parte do princípio de “tentar mudar aquilo que tem de ser alterado”. “Isso não passa em primeiro lugar por ter cargos e muito menos cargos assegurados fruto de alguma negociação de mercearia com o PSD ou com outros partidos. Tivemos discussões profundas com o Carlos Moedas, que aproveito para agradecer, mas não tivemos sequer discussões com o PSD”, assegura o líder do partido, que insiste na ideia de “afirmar o projeto”.

A principal meta da candidatura é “tirar da câmara o Partido Socialista que há 14 anos a governa e o atual presidente”, por Lisboa ser, diz, “uma cidade sem ambição” com “uma câmara com demasiada burocracia e lógicas clientelares de exercício de poder, numa câmara que se tornou gigantesca e demasiado pesada”. Lisboa precisa, na visão de Cotrim Figueiredo, “da energia e frescura” da Iniciativa Liberal, mas também de “ideias liberais”.

Os objetivos passam também por afirmar “para Lisboa e Portugal uma alternativa programática”, mas esta “não passa só por ideias diferentes, passa por protagonistas diferentes e formas diferentes de fazer política“. Aos olhos de Cotrim Figueiredo e do partido “uma frente com mais de meia dúzia de partidos não é uma lógica suficientemente fresca, inovadora e moderna de promover a alteração de fazer política em Portugal”.

Com a decisão apresentada este sábado, a Iniciativa Liberal mantém a ideia de ir sozinho à principal autarquia do país, como já tinha planeado. Para o “desafio”, o partido escolheu, nas palavras do líder, “dois grandes liberais”: Miguel Quintas e Ana Pedrosa-Augusto.

Miguel Quintas, “um perfeito desconhecido”

Miguel Quintas é atualmente membro da coordenação do Núcleo de Lisboa. Licenciado em Administração e Gestão de Empresas, com um MBA em Marketing e um curso de empreendedorismo no MIT em Boston, o gestor tem um percurso idêntico a Cotrim Figueiredo, muito ligado ao setor do Turismo.

Trabalhou e viveu vários anos em Madrid e São Paulo, porém a vida profissional nem sempre correu bem. Em 2006 perdeu tudo, mas conseguiu reerguer-se. “Estou aqui como alguém cujo caminho para o sucesso profissional passou por noites passadas em carros e refeições cedidas por vizinhos, e que sentiu em primeira mão o apoio que faltas aos mais desprotegidos desta cidade”, conta no discurso de apresentação na Praça do Município.

Hoje, apresenta-se como “um perfeito desconhecido”, que diz ser pai, filho, empresário, liberal e que promete “ideias para a capital”, com a certeza de que “podem fazer a diferença na vida nas famílias, nas empresas e nos sonhos de quem cá vive”. Está aqui como uma “prova da resiliência dos lisboetas, como testamento à capacidade daqueles que diariamente lutam por um lugar ao sol” numa cidade que, diz, “vive à sombra de conferências internacionais e negócios mal explicados, como voz daqueles que estão fartos de viver à mercê de um planeamento de fachada que empurra para fora aqueles que são, foram, e sempre serão a alma deste sitio”.

Ana Pedrosa-Augusto é a segunda da lista à Câmara de Lisboa. É natural de Leiria e encontrou-se em Lisboa aos 17 anos para estudar na Faculdade de Direito da Universidade de Lisboa. Tem o mestrado em ciências jurídico-empresariais e uma pós-graduação em Direito Fiscal pela Universidade Católica. É advogada na área de business law e tem no currículo a representação da cantora Madonna.

A ligação com a política começou na Aliança, onde foi vice-presidente eleita no primeiro congresso, e deixou o partido em setembro, após final do mandato.

Agora, do lado dos liberais e de uma candidatura a Lisboa, ambiciona uma cidade “justa e promissora” onde seja “cada vez melhor viver; onde ainda seja possível criar sem que as suas ideias sejam objeto de uma censura administrativa demasiadas vezes arbitrária, e onde se possa continuar, sempre, a pensar livremente”.

“Fosse o Miguel um político ‘como de costume’, e talvez eu não tivesse abraçado este desafio”, elogiou. “Não me sentiria certamente com disponibilidade para me juntar a uma candidatura — como outras parece haver — que olham para Lisboa como um mero degrau para chegar às lideranças dos partidos e do governo, como se esta magnífica cidade e todas as suas pessoas fossem um mero capítulo passageiro na crónica de alguns governantes cujas aspirações estão noutros sítios, e por isso prontos a partir tão depressa quanto possível”, referiu a candidata liberal.

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Logo depois de se saber que Carlos Moedas era o nome escolhido pelo PSD defrontar Fernando Medina numa corrida à maior câmara do país, o social-democrata entrou diretamente em contacto com a Iniciativa Liberal e marcou uma reunião com João Cotrim Figueiredo. O objetivo? Travar a ideia que o partido tinha de apresentar um candidato próprio e juntar o nome dos liberais à megacoligação de direita.

Mesmo durante o discurso de apresentação de candidatura, e antes da IL ter anunciado a decisão, Carlos Moedas agradecia o “diálogo” que tinha acontecido até ali e prometia uma continuação “nos próximos dias”, até porque se tratava da peça que faltava na direita que Moedas quer ao seu lado: PSD, CDS, Iniciativa Liberal, PPM, MPT e Aliança. A cerca ao Chega ficou logo visível no primeiro discurso, em que o antigo comissário europeu disse querer “congregar as forças não socialistas moderadas e progressistas da nossa cidade” e deixou de fora o Chega.

Este sábado, depois de conhecida a decisão, Carlos Moedas conta com menos uma peça do puzzle da ala direita.

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Artigo atualizado às 16h13 com reação de Carlos Moedas.