“Nós estamos sempre a contar com uma cerimónia dentro de algum figurino, mas haverá sempre espaço para acolher o improviso por parte da mais alta figura da nação”, diz o diretor de comunicação da Assembleia da República. Há cinco anos, Marcelo Rebelo de Sousa — na figura de presidente eleito –, chegou ao Palácio de São Bento a pé para tomar posse como Presidente da República. Agora, sem despir o fato de Presidente e com uma pandemia que limita movimentos e ações espontâneas, é de esperar uma cerimónia de tomada de posse mais curta e mais colada ao guião.

A Chefe de Divisão de Protocolo do Parlamento confessa ao Observador que foi “apanhada de surpresa” com a chegada de Marcelo Rebelo de Sousa para a tomada de posse do primeiro mandato mas também esclarece que aquilo que se designa por “furar o protocolo” acontece recorrentemente, com vários presidentes e de vários países. Manuela Azóia recorda um episódio com um presidente de um Parlamento de um país europeu que decidiu à chegada ter um encontro com manifestantes na Praça de São Bento, provocando calafrios em quem procura seguir o cerimonial — o plano traçado para as cerimónias protocolares –, acordados entre os vários envolvidos.

[Ouça aqui a reportagem da Rádio Observador]

Marcelo toma posse em cerimónia mais pequena e mais rápida

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Para a posse do segundo mandato, a chegada do Presidente da República está marcada para as 10h20 e a essa hora já o primeiro-ministro, António Costa, estará à espera na sala de visitas de Ferro Rodrigues. O presidente da Assembleia da República estará à espera de Marcelo Rebelo de Sousa na escadaria do Palácio de São Bento para acompanhar o Chefe de Estado na revista à Guarda de Honra, ainda no exterior e no cortejo que vai percorrer o átrio da Assembleia da República, passando pelas sentinelas de honra. Este é um dos pontos onde a pandemia já provocará alterações. Para reduzir o número de elementos presentes, foi acordado reduzir as guardas de honra de um batalhão para uma companhia, de cada ramo das forças armadas. Também as sentinelas foram reduzidas, mas “mantendo a solenidade e as obrigações constitucionais do momento”, asseguram os serviços do Parlamento.

O guião geral desta tomada de posse tem aliás um objetivo geral: “Reduzir o número de pessoas por forma a ter mais espaço e encontrar um equilíbrio entre os condicionalismos impostos pela pandemia mas que assegurem a importância do momento da tomada de posse”. Para esta cerimónia em muito contribuiu a sessão solene do 25 de Abril, que gerou polémica pela recusa de Ferro Rodrigues em tornar obrigatória a utilização de máscara. Para os serviços do Parlamento, “esse foi um excelente ensaio geral e a tomada de posse será até uma cerimónia menos restritiva porque o medo generalizado já não existe ao fim destes meses e é possível construir regras mais adaptadas à situação”, diz João Amaral, do Gabinete de Comunicação da Assembleia. Para os funcionários, existem até muitos processos que se repetem desde o inicio da pandemia. “A receção dos membros do governo é feita mediante o protocolo que será utilizado na receção aos convidados desta tomada de posse, pelo que já existe essa obrigatoriedade do distanciamento, da máscara e das restantes medidas de segurança”, esclarecem.

Cumprimentos decorrem sem beijinhos e apertos de mão e sem a presença do amigo Eduardo

“Aqui é outro dos locais onde se vão notar maiores diferenças”, avisa o diretor de comunicação do Parlamento à entrada do Salão Nobre, na visita feita pelo Observador. “Sem os tradicionais beijinhos, abraços e apertos de mão, a cerimónia de cumprimentos será muito mais curta, marcando presença apenas um representante de cada partido e os convidados do protocolo de Estado”, acrescenta. Por definir está ainda o modelo da fotografia: “Por norma têm tirado com máscara e depois sem máscara, assegurando o distanciamento”, explica a Chefe de Protocolo, Manuela Azóia.

Marcelo com o amigo Eduardo Barroso, que marcou presença na cerimónia de há cinco anos, mas não irá nesta

Este ano, Marcelo Rebelo de Sousa não contará por exemplo com o abraço do amigo Eduardo Barroso. O cirurgião confessa até ao Observador que já não se recorda se deu ou não os parabéns pela reeleição porque, diz, “a emoção já não foi a mesma da primeira eleição”:  Há cinco anos fomos à reitoria, foi uma emoção grande, agora já não. Até acertei mais ou menos nas percentagens finais”, diz, em conversa com o Observador. O médico-cirurgião, que é um dos amigos próximos de Marcelo Rebelo de Sousa, diz esperar “um mandato igual ao primeiro, com a cultura e o sentido de Estado que lhe é reconhecido”, lamentando continuar mais cinco anos “a estar pouco tempo” com o amigo, que “podia até ter tomado outra decisão quanto à recandidatura caso não estivéssemos em pandemia”, diz.

Para o alívio da pressão com a organização da cerimónia em muito contribui a maior rapidez com que será cumprido todo o programa. O diretor de comunicação do Parlamento diz que, “tendo em conta as limitações impostas em momentos como os cumprimentos, toda a sessão será mais curta por comparação com as anteriores”. “ Acredito que em pouco mais de uma hora tudo estará finalizado”, acrescenta João Amaral. Também a não comparência de convidados internacionais — em 2016 estiveram presentes o presidente da Comissão Europeia, o Rei de Espanha e o presidente de Moçambique, entre outros –, aliviam os serviços protocolares que deixam de ter uma Tribuna VIP composta. Ao Observador, a Assembleia da República diz que o número de convidados é de apenas 22 personalidades às quais se juntam os 50 deputados que vão marcar presença, “sempre com o objetivo de reduzir ao máximo o número de pessoas na sala das sessões”.

Sem troca de cadeiras, Marcelo presta juramento, discursa e sai

Dentro do hemiciclo, “há processos que ficam mais facilitados” com a continuidade do mesmo Presidente. A Chefe do Protocolo, Manuel Azóia, refere por exemplo o momento de troca de cadeiras que ocorreu há cinco anos entre Cavaco Silva e Marcelo Rebelo de Sousa e que este ano não se vai registar. Ainda assim, haverá duplicação de elementos por questões sanitárias, por exemplo no leitoril, o suporte utilizado para colocar a o texto que Ferro Rodrigues e Marcelo Rebelo de Sousa têm que proclamar para a oficialização da tomada de posse.

Dentro do hemiciclo, Marcelo Rebelo de Sousa vai ouvir a ata da eleição para depois prestar juramento sobre o original da Constituição, publicada em 1976. O discurso do recém-empossado Presidente da República começa depois de uma salva de 21 tiros a partir de uma fragata da Marinha que está no Rio Tejo e depois de ouvido o Hino Nacional. Depois da intervenção de Marcelo Rebelo de Sousa, é escutado novamente o hino para, de seguida, as duas maiores figuras do Estado se encaminharem para o Salão Nobre, local onde decorrem os cumprimentos, com as devidas distâncias.

Sem abraços e beijinhos, a tarefa do ‘Presidente dos afetos’ fica concluída de forma mais acelerada na Assembleia da República. Marcelo Rebelo de Sousa segue para a zona de Belém para dar seguimento ao programa, onde cumpre a tradição e vai depositar uma coroa de flores junto aos túmulos de Luís Vaz de Camões e de Vasco da Gama, no Mosteiro dos Jerónimos, para depois ser recebido pela Guarda de Honra do Esquadrão Presidencial, antes de entrar no palácio para dar inicio ao novo mandato. Já dentro do Palácio de Belém, Marcelo Rebelo de Sousa vai receber o símbolo da Presidência e das Ordens Honoríficas. 

Diferente de há cinco anos, em que o programa teve uma duração geral de 12 horas e terminou com um concerto na Praça do Município — iniciativa impensável atualmente –,  com a participação de Mariza, Paulo de Carvalho, José Cid ou até Anselmo Ralph — que por não querer virar as costas ao Chefe de Estado protagonizou uma queda em plena atuação –, desta vez o Presidente da República segue para o Porto, onde vai ser recebido pelo presidente da autarquia, Rui Moreira, e termina com um sinal de união: um encontro com os líderes de várias confissões religiosas no Centro Islâmico do Porto. Depois, ficam a faltar cinco anos até nova cerimónia, garantidamente com outro protagonista.