Apesar de estar a ser alvo de uma crescente pressão pública — e política, incluindo avisos do primeiro-ministro —, a chefe máxima da polícia de Londres, Cressida Dick, diz não estar a ponderar pedir a demissão do cargo, depois de aquela polícia ter detido e algemado mulheres que participavam numa vigília de algumas centenas de pessoas para homenagear Sarah Everard.

Foi no sábado que as imagens de mulheres a serem detidas, tendo algumas sido deitadas ao chão por polícias, começaram a gerar indignação, ainda para mais porque o motivo para a vigília era uma homenagem a Sarah Everard, a mulher de 33 anos que terá sido morta por um homem que era da mesma polícia quando voltava para casa a pé, à noite, vinda de casa de um amigo, a 3 de março.

Perante aquelas imagens e as crescentes críticas públicas que tem vindo a sofrer, Cressida Dick já veio justificar-se, dizendo que se tratava de uma “multidão muito grande”, o que não respeitava as restrições por causa da pandemia de Covid-19, e rejeitando sugestões de “treinadores de bancada”, conforme cita o “The Guardian”.

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“A minha equipa achou que isto era um ajuntamento ilegal que constitui um risco considerável para a saúde das pessoas. Não me parece que quem não esteve na operação consiga fazer um comentário detalhado sobre se a decisão foi certa ou errada, eles têm de tomar decisões muito difíceis e não acho que alguém deva estar sentado na bancada a dizer ‘bem, isto foi mal feito’ ou ‘eu teria feito diferente’ (…). O que aconteceu torna-me mais, não menos, determinada a liderar a minha equipa”, disse, acrescentando que, sendo mulher, se a vigília fosse legal até teria marcado presença em solidariedade com Everard.

Apesar de assegurar que não está a pensar demitir-se, as reações têm sido, genericamente, de forte crítica à atuação policial, que deteve quatro mulheres, segundo as contas da própria polícia. O Governo já pediu uma investigação independente à atuação da polícia, tendo o primeiro-ministro, Boris Johnson, assegurado que está “profundamente preocupado” e marcado uma reunião com a task force do Executivo britânico e Cressida Dick para esta segunda-feira, segundo a BBC.

“Falei com a comissária da polícia metropolitana e ela prometeu rever a forma como a situação foi gerida e o Ministro do Interior também encomendou um relatório” ao órgão de inspeção da polícia, disse o primeiro-ministro, conforme cita a Lusa. A reunião servirá também para discutir soluções, numa altura em que o debate sobre a violência de género volta a entrar na agenda política e mediática: “A morte de Sarah Everard deve unir-nos na determinação de acabar com a violência contra mulheres e raparigas e fazer com que todo o sistema de justiça trabalhe para protegê-las e defendê-las”, garantiu Boris.

Oposição e mayor falam em imagens “inaceitáveis”

Entretanto, as críticas crescem de tom também na oposição, com o líder do Labour, Keir Starmer, a considerar as imagens “profundamente perturbadoras” e o líder dos democratas liberais, Ed Davey, a pedir mesmo a demissão de Cressida Dick.

O mayor de Londres, Sadiq Khan, foi mais longe: Khan assegura que tinha pedido à polícia para trabalhar com os organizadores da vigília, para garantir que tudo se passava de forma ordeira e sem problemas relativos às restrições sanitárias. A organização tinha, aliás, desconvocado o protesto depois de não ter conseguido chegar a um entendimento com a polícia para organizar a vigília com os cuidados necessários, tendo pedido a quem quisesse participar que se limitasse a acender uma vela em casa às 21h30 de sábado. Mas os participantes decidiram mesmo aparecer no local inicialmente marcado para a vigília, em Clapham, perto da zona onde Sarah Everard desapareceu.

Ora se o mayor tinha pedido que ainda assim fossem asseguradas as condições para que a homenagem ocorresse de forma segura, não foi isso que se passou, reconhece agora, descrevendo as imagens de sábado, que mostram mulheres no chão a serem algemadas por entre gritos de “vergonha”, “prendam os vossos” e “quem é que estão a proteger?” como “inaceitáveis”.

A reação da polícia à vigília, que não só tinha por objetivo protestar contra a violência contra as mulheres — foi só um de vários eventos do género que ocorreram por todo o Reino Unido no sábado — como pedia a responsabilização do suspeito, que pertence àquela força policial, veio agitar ainda mais os ânimos e o debate no Reino Unido sobre a proteção dada às mulheres e a violência de género. No domingo, as ruas de Londres voltaram a encher-se com protestos, com uma marcha que partiu da sede da polícia e avançou até ao Parlamento, desta vez sem intervenção policial.