Paul Rusesabagina, antigo gerente do estabelecimento que inspirou o filme “Hotel Ruanda” sobre o genocídio de 1994, será julgado “in absentia”, depois de se recusar a comparecer esta quarta-feira perante o tribunal ruandês que o julga por acusações de terrorismo.

“Foi ele que decidiu não comparecer à audiência e é um direito seu. Quando o suspeito decide não comparecer em tribunal, isso não impede que o julgamento tenha lugar”, disse a Câmara do Supremo Tribunal para Crimes Internacionais e Transfronteiriços, em Kigali.

Na audiência do último dia 12, Rusesabagina comunicou a sua decisão de não comparecer mais em tribunal por acreditar que não terá um julgamento justo.

“Esta é a minha última comparência em tribunal, não voltarei porque os meus direitos não estão a ser respeitados”, disse o acusado na altura, após ter sido recusado o seu pedido de um período de seis meses para preparar melhor a sua defesa.

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Após a rejeição do meu pedido de mais tempo para me preparar para o julgamento, é evidente que não vou ter um julgamento justo, pelo que gostaria de informar o tribunal de que não participarei mais nas audiências”, concluiu.

Numa carta enviada ao tribunal, Rusesabagina reiterou estes argumentos, mas os juízes, liderados pelo juiz Muhima Antoine, decidiram que o julgamento, no qual outros 20 suspeitos também estão a ser julgados, continuará com Rusesabagina “in absentia”. De acordo com os juízes, a sua decisão baseou-se no facto de o antigo gerente ter sido informado sobre a audiência desta quarta-feira e não ter fornecido uma razão tangível para a sua ausência. Contudo, o tribunal informará Rusesabagina sobre as datas e locais de cada audiência e as decisões dos seus respetivos procedimentos, uma vez que tem o direito de assistir às sessões sempre que desejar.

Rusesabagina, 66 anos, enfrenta nove acusações relacionadas com terrorismo por liderar a Frente de Libertação Nacional (FLN), a ala armada do seu partido, o Movimento Ruandês para a Mudança Democrática (MRCD). Segundo as autoridades ruandesas, foi preso a 31 de agosto de 2020 no aeroporto internacional de Kigali, mas a sua família e advogados afirmam que foi “raptado, desaparecido e entregue irregularmente do Dubai para o Ruanda”.

O acusado, que era gerente do famoso “Hotel Thousand Hills” na capital ruandesa, onde alojou mais de mil Tutsis e Hutus moderados durante o genocídio, para os salvar dos Hutus extremistas, tinha um mandado de captura internacional, acusado de crimes incluindo assassinato e rapto de civis ruandeses. Rusesabagina tinha-se tornado um adversário altamente crítico do Presidente ruandês, Paul Kagame, e vivia no exílio entre a Bélgica e os Estados Unidos, onde criou uma fundação que promove a reconciliação para evitar novos genocídios.

O seu trabalho no hotel inspirou o filme “Hotel Rwanda” (2004), baseado na história deste influente homem de negócios Hutu, casado com uma mulher Tutsi.

O genocídio teve início a 7 de abril de 1994 após o assassinato, no dia anterior, dos presidentes do Ruanda, Juvénal Habyarimana (Hutu), e do Burundi, Cyprien Ntaryamira (Hutu), quando o avião em que viajavam foi abatido sobre Kigali. A violência extrema causou a morte de cerca de 800.000 Tutsis e Hutus moderados, em cerca de cem dias, um dos piores assassinatos étnicos da história recente.