O Governo considera que o diploma aprovado pelo Parlamento sobre reforço de apoios sociais, que aguarda eventual promulgação pelo Presidente da República, apresenta “uma violação ostentiva” da lei-travão inscrita na Constituição, desvirtuando o Orçamento em vigor. Na passada quarta-feira, a Rádio Renascença já tinha avançado que o Governo estava a pressionar o Presidente da República para que envie a lei para o Tribunal Constitucional e, esta sexta-feira, o Expresso refere que Marcelo ainda não tomou uma decisão, mas tem referido argumentos que inclinam para um veto.

Em causa está o diploma que foi aprovado em votação final global no passado dia três com a oposição do PS, mas com os votos a favor de PSD, BE, PCP, CDS-PP, PAN, PEV, Chega, Iniciativa Liberal (IL), e das deputadas não inscritas Joacine Katar Moreira e Cristina Rodrigues. Segundo o portal da Assembleia da República, este decreto seguiu para o Palácio de Belém, para promulgação, no dia 18 de março, há sete dias.

Fonte do executivo disse à agência Lusa que “boa parte” do teor desse decreto que saiu do Parlamento, e que “resultou de uma coligação negativa“, o Governo, por sua iniciativa, “fez também questão de aprovar para poder vigorar em apoio às pessoas e sem qualquer mácula de inconstitucionalidade”.

“Mas não podemos aceitar uma violação ostensiva de uma garantia inscrita na Constituição da República, como é a lei-travão. As normas constantes nesse diploma da Assembleia da República, aprovadas em coligações negativas, são inconstitucionais e implicariam um grave precedente de desvirtuamento do Orçamento do Estado em vigor”, sustentou.

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O Governo está certo de que há inconstitucionalidades e, segundo a Renascença, avisou o Palácio de Belém que tem um parecer jurídico que sustenta a inconstitucionalidade do diploma aprovado no Parlamento. O Presidente da República considera que o argumento do Executivo é válido, contudo o tema deixa Marcelo Rebelo de Sousa dividido entra a alegada inconstitucionalidade e a possibilidade de mais apoios sociais, nos quais tem insistido por diversas vezes.

Nesta matéria de reforço de apoios para setores sociais mais atingidos no plano económico pela epidemia de Covid-19, o Governo referiu que “teve logo a preocupação” de tomar medidas, aprovando um decreto lei. “Medidas que se traduziram num alargamento do apoio a quem estava em teletrabalho com filhos até ao 1º ciclo do ensino, em alguns casos até com um reforço do apoio para 100% do salário. Isso entrou logo em vigor e não suscita qualquer problema jurídico”, apontou a mesma fonte do executivo.

Da parte do executivo, salienta-se ainda que já foi alargado, também por via de um decreto lei, o programa Apoiar destinado a empresários em nome individual sem contabilidade organizada, “independentemente de terem ou não trabalhadores a cargo“.

Em junho do ano passado, Marcelo Rebelo de Sousa vetou um decreto do Parlamento que alargava o apoio social extraordinário aos gerentes de micro e pequenas empresas, assim como empresários em nome individual, invocando “dúvidas de constitucionalidade por eventual violação da lei travão, ao poder envolver aumento das despesas previstas no Orçamento do Estado para 2020 na versão ainda em vigor”.

Na altura, Marcelo Rebelo de Sousa sugeriu que se ultrapassasse essa questão no Orçamento Suplementar para 2020, que então estava em discussão no parlamento. Esta quinta-feira, ao fim da manhã, o Bloco de Esquerda acusou o Governo de pressão sobre o Presidente da República para que não promulgue o alargamento dos apoios aos trabalhadores, apelando a Marcelo Rebelo de Sousa para que “prevaleça um critério de justiça”.

Em causa, segundo declarações do deputado bloquista José Soeiro, estão as alterações que alargaram o apoio extraordinário à redução da atividade económica, que abrange trabalhadores independentes e sócios-gerentes, aprovadas no início do mês de março no parlamento apenas com os votos contra do PS.

O Governo está agora a fazer uma pressão enorme junto do Presidente da República para que esta alteração que o parlamento aprovou não seja promulgada“, acusou. O argumento que o Governo está a usar junto de Marcelo Rebelo de Sousa “é uma má desculpa de um mau pagador” e “um argumento retorcido”, criticou ainda o deputado do Bloco de Esquerda.