O pelotão nacional começou hoje a rolar, na Prova de Abertura, com os ciclistas, na alegria do regresso após mais de seis meses sem competir, a não esconderem o receio de que a covid-19 volte a pará-los.

Os hábitos pré-covid ainda não regressaram ao pelotão, nomeadamente os convívios distendidos fora da ‘bolha’ da própria equipa — embora já se vislumbrem, aqui e ali, conversas ‘cruzadas’ -, as máscaras ainda escondem os rostos, originando até ‘trocas de identidade’ momentâneas, mas o entusiasmo pelo regresso à estrada é, ainda assim, visível.

“É um alívio para toda a gente. Toda a gente ambicionava por este dia. Sempre adiamentos, adiamentos e mais adiamentos, e hoje estamos aqui, já na linha de partida, e esperamos que seja o arranque até ao final do ano e que este ano não se pare mais o ciclismo, porque temos sofrido bastante. Estes quase oito meses em casa, sem competição, só a treinar… não digo que foi duro ou complicado, mas tem sido uma espera quase infinita”, confidencia Sérgio Paulinho.

Nome incontornável do ciclismo português, o veterano da LA Alumínios-LA Sport, de 41 anos, assume à agência Lusa que foi complicado estar parado enquanto, lá fora, o pelotão internacional já rola desde fins de janeiro/inícios de fevereiro.

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“Mas também sabíamos a realidade que o país estava a atravessar. Quando se vê nas notícias, os hospitais com tantas ambulâncias à porta, milhares de doentes que não podiam entrar… Sabendo a dificuldade que o país estava a atravessar, por um lado compreendemos, mas, por outro, havia a frustração de ver os nossos colegas a correr e nós em casa fechados. Felizmente, [a pandemia] acalmou”, destaca o medalha de prata em Atenas2004.

No Cais da Fonte Nova, em Aveiro, sob um sol de primavera e o olhar de uns quantos curiosos, os reencontros são saudados com o já tradicional choque de punhos, com um ou outro a arriscar um abraço, como os ex-colegas e amigos Frederico Figueiredo e Alejandro Marque.

“Finalmente! Parece que isto vai começar a andar. Penso que o problema agora é assegurar que não haja problemas nas localidades onde vamos passar e que, a nível organizativo, não voltem atrás”, nota o galego do Atum General-Tavira-Maria Nova Hotel.

O vencedor da Volta a Portugal de 2013 reconhece que foi difícil lidar com o adiamento do início da temporada, que devia ter arrancado em meados de fevereiro na Volta ao Algarve, mas só começou hoje, com uma Prova de Abertura disputada na região de Aveiro, o primeiro dos 59 dias de competição do reformulado calendário nacional para as equipas continentais.

“Tens um calendário, adaptas o teu treino no inverno para estar bem na Volta ao Algarve, porque lá vão estar os WorldTour, e depois adiam tudo e tens de reorganizar-te. Estamos a falar de um atraso de dois meses… é difícil para nós treinar todos os dias sem ter um objetivo, até porque temos o exemplo dos adiamentos e da incerteza anteriores [da época passada]”, sustenta.

Parados competitivamente desde 05 de outubro, data do final da edição especial da Volta a Portugal, os ciclistas do pelotão português ‘sofrem’ agora as consequências da longa interrupção, como constatou Frederico Figueiredo há uma semana, quando se estreou na época no Grande Prémio Miguel Indurain, em Espanha.

“Notou-se no Miguel Indurain os dias que eles [no pelotão internacional] levam de corrida. Nós, que no ano passado não corremos praticamente nada, chegamos a uma prova daquelas e eles já levam 20 e tal dias de corrida e nós vamos para o primeiro… é complicado. É o que é. Temos de viver com isto”, resume o terceiro classificado da última Volta a Portugal.

O ciclista da Efapel só espera que o calendário não seja interrompido. “E que a covid nos deixe trabalhar, que é isso que nós queremos”, pontua. “Já não via a hora”, desabafa Rui Vinhas, lembrando que os corredores “precisam de ter a competição” para receberem “os salários” e para “dignificar os patrocinadores”, sem os quais as equipas “não conseguem viver”.

“Há aquela saudade de andar na estrada, de estar em competição. Claro que desanima [o adiamento do início da época], porque nos preparámos para fevereiro, mas é um motivo de força maior e temos de ser conscientes, porque não é brincadeira nenhuma o que está a acontecer”, nota o ciclista da W52-FC Porto.

Otimista, o vencedor da Volta a Portugal de 2016 diz que “foi duro, mas já passou”, e, tal como os seus colegas, lança o seu maior desejo para este ano: “esperemos que não haja mais interrupções, porque o calendário que existe é bastante bom”.