Dois anos depois de todos os bispos católicos portugueses se terem comprometido a criar nas suas dioceses “instâncias de prevenção e acompanhamento em ordem à proteção de menores” , as chamadas Comissões para a Proteção de Menores pela Igreja Católica, que visavam prevenir e investigar denúncias de casos de abusos sexuais a menores na Igreja, só há registo de três queixas. E só uma das queixas remonta a factos recentes e a um sacerdote ainda em funções, que foi afastado.

Os dados são avançados esta segunda-feira pelo Jornal de Notícias, que refere que apenas as dioceses de Braga e Bragança-Miranda receberam, nas suas Comissões para a Proteção de Menores, denúncias de casos de abusos sexuais. Segundo o JN, em Braga as denúncias referem-se a factos que ocorreram há mais de 30 anos e que estarão “jurídica e canonicamente prescritos”, até porque uma das queixas visaria um pároco que já morreu. A única queixa que teve consequência foi a que chegou à Comissão para a Proteção de Menores pela Igreja Católica da diocese de Bragança, que visava um sacerdote de 50 anos que foi afastado.

Américo Aguiar, bispo auxiliar e presidente da comissão criada na diocese de Lisboa para ajudar à prevenção e investigação de denúncias de abusos sexuais de menores, comentou a ausência de queixas recebidas em declarações proferidas ao JN: “O facto de não haver denúncias não quer dizer não haja nada. Significa apenas que nada nos foi comunicado”. Tal poderá sugerir ainda alguma desconfiança por parte de quem pode ter sido alvo de abusos na firmeza da Igreja na investigação e combate aos abusos sexuais de menores.

O combate das dioceses a situações de abusos sexuais na Igreja através de organismos criados localmente resultou da cimeira de fevereiro de 2019 no Vaticano. O encontro, promovido pelo Papa e que contou com a presença de presidentes de todas as conferências episcopais do mundo e de mais uma série de líderes católicos, foi histórico: nunca a Igreja Católica se reunira deste modo para definir linhas de ação e de resposta a situações de abusos sexuais de menores.

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Muitas promessas, poucas medidas concretas. O que fica da cimeira histórica sobre os abusos sexuais na Igreja

Nesse mesmo mês de fevereiro de 2019, o Observador publicou uma série de reportagens intitulada “Em Silêncio”. Nessa série de trabalhos era revelado, por exemplo, que a Igreja portuguesa escondeu pelo menos três casos nos últimos 15 anos, que o Governo ignorou uma denúncia contra um padre do Fundão quatro anos antes da PJ ter iniciado uma investigação, que o Ministério Público pensou acusar a hierarquia da Igreja por não ter denunciado um padre suspeito de abusos sexuais e que num caso um padre foi denunciado por duas vezes e só à terceira a Igreja agiu.

Abusos sexuais. Igreja portuguesa escondeu pelo menos três casos nos últimos 15 anos