A líder parlamentar do Partido Socialista, Ana Catarina Mendes, classificou esta quarta-feira como “uma tremenda injustiça” os ataques feitos por José Sócrates à direção do PS durante a entrevista que deu, também esta quarta-feira, à TVI.
“Acho que é uma tremenda injustiça o ataque que é feito, quer à direção do Partido Socialista, quer ao próprio António Costa, considerando-o como um traidor, como foi considerado não só na entrevista de hoje, como nestes últimos dias“, afirmou Ana Catarina Mendes durante o programa de comentário político “Circulatura do Quadrado”, emitido pela TVI24 cerca de duas horas depois da entrevista conduzida pela estação ao ex-primeiro-ministro.
Na entrevista, José Sócrates reagiu às palavras do presidente da Câmara de Lisboa, o socialista Fernando Medina, que na terça-feira havia tecido duras críticas ao ex-primeiro-ministro, chegando a dizer que o comportamento de Sócrates “corrói o funcionamento da vida democrática“.
Sócrates à TVI: os ataques à decisão de Ivo Rosa e a “canalhice” do PS
Sócrates não poupou nas palavras contra Medina, sublinhando que ouviu o autarca de Lisboa “com a devida repugnância”, mas alargando os ataques a António Costa, mesmo sem o nomear. “O essencial não é esse personagem, é quem lhe manda dizer isso. Falamos portanto do mandante, a liderança do PS e a sua direção”, disse Sócrates. “Essas declarações são de uma profunda canalhice“, continuou. “Tomei a decisão correta quando saí do PS, porque já não aguentava mais o silêncio do partido. Grande parte dos que estão a dizer isso estão ajustar contas com a sua covardia moral. Porque não disseram uma palavra quando fui detido.”
Ana Catarina Mendes não gostou de ouvir os ataques de José Sócrates e negou que o PS alguma vez tenha abandonado o ex-primeiro-ministro.
“O PS nunca apagou a história do seu partido, felizmente. Sabe que José Sócrates deu a primeira e única maioria absoluta ao PS, foi secretário-geral, foi primeiro-ministro, e entende que em processo judicial, e desde o início, quase há 7 anos, que sempre disse que deixaria o processo correr na justiça e fazer o seu trabalho”, disse a líder parlamentar socialista. “Acho que desta entrevista essa parte final é uma parte absolutamente injusta para o PS.”
Ana Catarina Mendes lembrou ainda que foi durante o seu período como secretária-geral adjunta que Sócrates saiu do PS e negou qualquer abandono. “Fui secretária-geral adjunta, recebi a carta desfiliação de José Sócrates, em muitos momentos da vida do partido tentei contactar José Sócrates, e portanto ninguém o abandonou. Deixaram foi fazer o trabalho que a justiça tem de fazer. O que o PS fez foi não fazer pressão, e não quero alongar-me muito mais sobre isso, e deixar que a justiça corra os seus trâmites.”
“Acho que os termos em que José Sócrates se dirigiu a algumas pessoas que enunciou e outras que não enunciou são injustos e José Sócrates sabe que são injustos para essas pessoas”, acrescentou a líder parlamentar socialista.
“Não foi o PS que andou inerte em relação ao combate à corrupção”
Ana Catarina Mendes salientou ainda que o processo que envolve Sócrates destaca a necessidade de reforçar o combate à corrupção — e argumentou que tem sido o PS a implementar várias medidas que apertam a malha aos políticos corruptos.
“Está em causa um ex-primeiro-ministro. Se a acusação cair, se era frágil, se não tinha factos e provas para afirmar os vários crimes de que acusava um ex-primeiro-ministro, isso é grave e é uma fragilidade, não para o MP todo, mas para quem conduziu esta investigação e quem deduziu a acusação”, disse, frisando que é uma “fragilidade para a justiça” e, por conseguinte, para a democracia.
“Se a democracia se faz com partidos, é evidente que os cidadãos têm a legitima necessidade de olhar para os partidos também com desconfiança. É aí que eu acho que os partidos têm de fazer o seu trabalho“, continuou Ana Catarina Mendes, que evitou várias vezes responder a uma pergunta do moderador do debate, o jornalista Carlos Andrade, sobre se a entrevista de José Sócrates beneficiou ou prejudicou o PS.
“Tenho ouvido muitas críticas, que o PS é conivente com os poderosos e com a corrupção”, acrescentou Ana Catarina Mendes. “Em 2001, foi o PS, pela mão de António Costa como ministro da Justiça, que introduziu o crime de recebimento de vantagem por parte de políticos. Em 2011, foi também com Governo do PS, que se alterou o prazo de prescrição para 15 anos. Não foi o PS que andou inerte em relação ao combate à corrupção.”
O ex-primeiro-ministro José Sócrates estava acusado, no âmbito do processo “Operação Marquês”, de 31 crimes, incluindo de três crimes de corrupção. Na última sexta-feira, numa altura em que o processo já leva sete anos de investigação e instrução, o juiz Ivo Rosa anunciou a decisão instrutória e fez cair 25 dos crimes de que Sócrates era acusado. O ex-primeiro-ministro só deverá agora ir a julgamento por três crimes de branqueamento de capitais e por três crimes de falsificação de documentos — embora o Ministério Público ainda vá recorrer da decisão de Ivo Rosa.