Entusiasta de viagens, sócio número 603 do Sport Clube União Torreense e presença assídua no Carnaval de Torres Vedras. Carlos Bernardes apresentou há cerca de duas semanas oficialmente a recandidatura à liderança do município do Oeste. Além de presidente da autarquia de Torres Vedras, o socialista era também presidente da Federação Regional do Oeste do PS. Morreu esta segunda-feira aos 53 anos.

Ganhou as eleições autárquicas de 2017, com maioria absoluta, mas já estava na liderança da autarquia desde 2015 quando Carlos Miguel renunciou ao mandato para assumir funções no Governo. Na vice-presidência desde 2005, com a saída de Carlos Miguel, foi Bernardes que ficou a comandar os destinos do município do Oeste.

Antes de chegar ao município de Torres, Carlos Bernardes esteve responsável pelo Turismo na vizinha câmara de Sobral de Monte Agraço (entre 1997 e 2001, com António Bogalho — da CDU — na liderança) e foi secretário da junta de freguesia do Turcifal, onde ainda residia, entre 1989 e 1997.

Atualmente acumulava ainda as funções de Embaixador Quality Coast e membro do Comité Consultivo Político da CIVITAS Initiative, tendo sido nomeado Embaixador Green Destination para a Europa (em setembro de 2016).

PUB • CONTINUE A LER A SEGUIR

Choque, consternação e a frase que se repete: “Em política não pode valer tudo”

A autarquia de Torres Vedras já anunciou um período de cinco dias de luto municipal, através de uma nota divulgada na página do município, e o grupo parlamentar do PS manifestou o “mais profundo pesar pelo desaparecimento” do autarca, endereçando também as condolências à família de Carlos Bernardes, que deixa mulher e um filho.

Autarca de Torres Vedras encontrado morto em casa

Duarte Pacheco, candidato pelo PSD à autarquia de Torres Vedras, lembra um “apaixonado pela política”. Ao Observador, o social-democrata recorda os anos passados na autarquia de Sobral de Monte Agraço, onde se conheceram. “Ficámos a ter uma excelente relação pessoal. Era uma pessoa muito bem disposta, sempre com sorriso e divertido. Receber esta notícia é brutal”, disse Duarte Pacheco.

Já o candidato do BE, Jorge Humberto Nogueira, fala em “enorme consternação e choque” com a notícia frisando que “nada é mais valioso que a vida humana”. “Há uma dimensão pessoal que sempre se preserva e, por isso, hoje é um dia triste para todos nós”, escreveu numa publicação no Facebook.

Também Paulo Bento, líder do partido Aliança e candidato à presidência de Torres Vedras, numa curta declaração, frisa que “em política e na vida não pode valer tudo”, enviando “sentidas condolências à família”.

O Chega também tem candidato à autarquia, que apresentou “o mais profundo pesar pelo falecimento do presidente da Câmara Municipal de Torres Vedras, Dr. Carlos Bernardes, dirigindo aos seus familiares e amigos os mais profundos sentimentos por esta perda”.

Ricardo Fernandes, o presidente da autarquia do Bombarral, recorda “um político com grande capacidade de fazer acontecer, um excelente colega e grande amigo” a quem “recorria sempre que necessitava de ajuda”. “A política fica mais pobre, os torreenses ficam mais pobres, todos ficamos mais pobres. Até sempre Carlos”, escreveu.

Localmente, o Sport Clube União Torreense, onde o filho de Carlos Bernardes chegou a integrar a direção, publicou uma nota na página de Facebook apresentando “as mais sentidas condolências à família” do presidente da autarquia.

É com enorme pesar que o Sport Clube União Torreense tomou conhecimento do falecimento de Carlos Manuel Antunes…

Posted by Sport Clube União Torreense on Monday, May 3, 2021

Numa cidade icónica pelo Carnaval há quem nas últimas horas tenha partilhado momentos de diversão ao lado do presidente da câmara, recordando o sorriso sempre presente e a disponibilidade de Carlos Bernardes.

Carlos Bernardes enfrentava alguma oposição interna

A comissão política de Torres Vedras do PS aprovou, em março, a recandidatura de Carlos Bernardes à presidência do município, mas a opção não foi unânime e Carlos Bernardes enfrentaria nas eleições autárquicas deste ano um velho conhecido, o socialista Sérgio Galvão, com quem coincidiu na autarquia durante a liderança de Carlos Miguel (a candidatura de Sérgio Galvão foi, aliás, tornada pública antes do anúncio de recandidatura de Bernardes).

O atrito entre os socialistas ficou claro na última Assembleia Municipal, na semana passada, já depois de Carlos Bernardes ter retirado a confiança política, no final de março, à vereadora Cláudia Horta Ferreira. A vereadora estava responsável pelos pelouros da Administração Municipal e Modernização Administrativa, Recursos Humanos, Qualidade, Participação e Cidadania, Tecnologias de Informação e Comunicação e depois da “perda da confiança política” anunciada por Bernardes afirmou estar a ser vítima de difamação e ter intenção de avançar com queixa-crime.

Os desentendimentos socialistas motivaram, segundo o jornal local Alvorada, a vigília de “mais de meia centena de pessoas” junto aos Bombeiros Voluntários de Torres Vedras — onde decorria a Assembleia Municipal — pela “liberdade de expressão” depois de Cláudia Horta Ferreira ter visto ser-lhe recusada a palavra pelo presidente da Assembleia Municipal, José Augusto de Carvalho (PS), e o presidente Carlos Bernardes não ter prestado esclarecimentos sobre a retirada de confiança durante a sessão pública.

A tese de doutoramento envolvida em polémica

Licenciado em Gestão de Empresas Turísticas e Hoteleiras, pelo Instituto Superior Politécnico do Oeste (em 2011) e pós graduado em Turismo pelo IGOT (2012), haveria de ser o doutoramento também em Turismo, na mesma instituição, a fazer correr muita tinta. A tese foi defendida em 2015, mas em fevereiro de 2017 um artigo de Jorge Ralha (antigo vereador municipal do PS) publicado no jornal local Badaladas levantou suspeitas de plágio na tese e depois da comunicação de três pessoas ao Ministério Público foi aberto um inquérito.

Autarca de Torres Vedras vai a julgamento por plágio na tese de doutoramento

No final de fevereiro de 2020, Carlos Bernardes foi condenado pelo Tribunal Criminal de Lisboa a uma multa de 5.000 euros pelo crime de contrafação na tese de doutoramento, mas menos de um ano depois Carlos Bernardes viu a Relação anular a decisão da primeira instância.

Relação anula sentença que condenou autarca de Torres Vedras por plágio em tese

Segundo o acórdão a que a agência Lusa teve acesso, a sentença do Tribunal Criminal de Lisboa foi declarada nula “por falta de indicação dos factos alegados na contestação, em sede de matéria de facto provada ou não provada, e por falta de fundamentação […], devendo os autos baixar à primeira instância para que o tribunal profira sentença”.

A Relação entendeu então, com base na contestação apresentada pelo arguido, Carlos Bernardes, que “nenhum facto alegado foi dado como provado ou como não provado”, e que “os factos alegados foram simplesmente ignorados” pelo Tribunal de Lisboa. Este tribunal colocou em causa a condenação pelo crime de contrafação, considerando que o arguido não se apropriou de uma obra, mas de excertos de várias fontes.