Marcelo Rebelo de Sousa escusou-se a comentar a atribuição de prémios à administração do Novo Banco, considerando que estão em causa critérios de gestão de cada instituição bancaria, mesmo que neste caso existam apoios frutos de compromissos assumidos pelo estado. “Aí, cada qual é livre de gerir”. Mas deixou avisos, ainda que “abstratos e de bem senso universal”.

O Presidente da República alertou para a responsabilidade das decisões públicas sobre esta matéria em concreto. Quem direta ou indiretamente tem alguma coisa a haver com garantias públicas deve ter presente isso nas suas decisões, mesmo quando se trata de instituições que não são públicas, tiveram a ver com decisões publicas”. E deixou o aviso (

“Pensem que os portugueses estão naturalmente atentos ao que implica decisões públicas. Isto é abstrato faz parte do bom senso universal”.

A reação do presidente à reedição da polémica sobre os prémios do Novo Banco seguiu-se a respostas mais musculadas do Ministério das Finanças e do governador do Banco de Portugal que vão contra esta política de bónus no Novo Banco, decididos (mas não pagos) em anos de avultados prejuízos e de chamadas de capital ao Fundo de Resolução.

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Novo Banco atribui prémios de quase 1,9 milhões à gestão. Finanças reiteram que “não é prática adequada” e valor será descontado

A possibilidade de atribuição de prémios e gestão está prevista no acordo assinado em 2017 entre o Estado português e a Comissão Europeia, mas condicionada no calendário e a determinados critérios. Durante o período de reestruturação, e como contrapartida da ajuda de Estado, o Novo Banco estava limitado na remuneração anual (incluindo bónus) a pagar a gestores e diretores que não podia ultrapassar dez vezes o salário médio dos trabalhadores até 30 de junho de 2020. No entanto, e depois dessa data — o prazo foi estendido até final de 2021 — “o pagamento de bónus pode ser feito, mas apenas se as metas nos compromissos de viabilidade foram atingidas, no respeito pelas regras europeias aplicáveis em matéria de exigências prudenciais”.

De acordo com afirmações feitas pelo presidente executivo da instituição, António Ramalho, o banco tem cumprido todas as metas do plano acordado com Bruxelas e deverá até apresentar resultados positivos no final deste ano.

Prémios atribuídos e não pagos somam 3,9 milhões

Tal como no ano passado, os bónus atribuídos pelo acionista aos gestores são diferidos e condicionados. Ou seja, só serão pagos a partir do final de 2021, quando o Novo Banco espera concluir a reestruturação, e se for verificado um conjunto de condições diversas não especificadas. O relatório anual refere que passam pelos indicadores financeiros da instituição no momento do pagamento e após o período de reestruturação, acrescentando ainda que a sua atribuição não constitui um direito adquirido.

Considerando que já em 2020 foram atribuídos prémios de gestão de dois milhões de euros, neste momento estão pendentes de pagamento (ainda que condicionado) quase quatro milhões de euros relativos aos desempenhos da administração nos anos de 2019 e 2020. Os prémios têm por base o desempenho individual e coletivo e 50% são em dinheiro e o resto em unidades de remuneração.

Neste dois anos, o Novo Banco apresentou prejuízos anuais superiores a mil milhões de euros e pediu mais de 1.600 milhões de euros ao Fundo de Resolução, dos quais estão por pagar 598 milhões de euros.

Os mistérios do Novo Banco. A injeção que abalou o Governo, contratos “secretos” e prémios em tempo de prejuízo

Ainda que legalmente e contratualmente, os bónus estejam previstos (dentro de certas condições), o Ministério das Finanças “continua a considerar que não é adequada a prática de atribuição de prémios de gestão do Novo Banco.” Assim, o ministério liderado por João Leão “acredita que o Fundo de Resolução atuará em conformidade com as decisões tomadas no ano anterior no contexto da verificação dos pressupostos inerentes ao cumprimento dos compromissos contratuais existentes”. No ano passado, o Fundo de Resolução deduziu os dois milhões de euros de prémios de gestão atribuídos à injeção de capital no Novo Banco e irá fazer o mesmo este ano.

O agora governador do Banco de Portugal, Mário Centeno, repetiu o que disse enquanto ministro das Finanças em 2020 quando confrontado com estes bónus. “Não é uma boa ideia”.

Auditoria ao Novo Banco prova que independência do Tribunal de Contas “não foi atingida”

A atribuição de prémios de gestão no Novo Banco foi conhecida na mesma semana em que foi divulgada a auditoria do Tribunal de Contas ao Novo Banco e onde são feitas várias críticas ao impacto que a venda de 2017 nas Finanças Públicas e à forma como isso foi comunicado. Marcelo saudou os resultados da auditora, considerando que ela demonstra que o Tribunal de Contas continua independente apesar da polémica decisão do Governo de não reconduzir o anterior presidente, nomeando José Tavares.

“Não escondo a alegria que tenho por ver reconhecido que o facto de ter sido nomeado novo presidente do Tribunal de Contas em nada atingiu a independência e isenção do Tribunal. Há uns meses havia muita gente preocupada. O Tribunal chegou a conclusões que devem ser respeitadas e que a AR vai apreciar – tudo isto é sinal de democracia.”