Miguel tem 34 anos, não quer dar a cara nem o apelido, mas fala do seu processo de mudança de sexo. Desde 2008 que é seguido no Hospital Santo António, no Porto, para adotar o sexo masculino, onde já fez uma mastectomia e uma histerectomia, mas até agora todos os tratamentos eram realizados em serviços separados e acompanhados por profissionais diferentes. O que deixará de acontecer, tornando este processo menos difícil para quem passa por ele.

A nova unidade de consultas transgénero passa a reunir dez especialidades – psicologia, psiquiatria, pedopsiquiatria, pediatria endócrina, cirurgia plástica, urologia, ginecologia, anestesiologia, endocrinologia e endocrinologia pediátrica – e permite que os utentes sejam seguidos no mesmo local e com o mesmo profissional de saúde.

“O processo é bastante lento, mas quando nos metemos nisto temos de estar preparados para isso. Se é o que realmente queremos, temos de lutar e aguardar, a paciência é mesmo o segredo”, explica Miguel ao Observador, acrescentando que esta nova resposta hospitalar é  “uma luz ao fundo do túnel”, embora ainda não seja possível realizar a cirurgia final, a mais complexa, no Santo António — algo que “poderá acontecer ainda este ano”. Quem o diz é Isabel Palma, médica endocrinologista, que acompanha cerca de 30 casos como o de Miguel, em que a maioria são mulheres que pretendem adotar o sexo masculino.

A especialista garante que esta nova resposta multidisciplinar pode mesmo “mudar tudo”. “Imagina o que é um homem ir a uma consulta de genecologia? É muito desconfortável. Desta forma, conseguimos eliminar todos estes problemas e constrangimentos, uma vez que passamos a ter tudo reunido na mesma unidade e há ainda a vantagem de ser sempre a mesma pessoa a acompanhar o processo”, explica ao Observador, acrescentando que uma mudança de sexo pode durar vários anos.

A Secretária de Estado para a Cidadania e a Igualdade visitou esta quinta-feira as novas consultas transgénero no Santo António, que considera ser “um passo muito significativo”. “Esta nova resposta que congrega dez especialidades está enquadrada no âmbito da estratégia para a saúde das pessoas trans, que lançámos em 2009, e era muito necessária na região Norte.”

Depois de conhecer pessoalmente toda a equipa médica, Rosa Monteiro realçou o “bom exemplo” deste tipo de atendimento articulado e estruturado e sublinhou a importância de o Serviço Nacional de Saúde “não deixar ninguém para trás”. “Está é uma aposta que este Governo tem tido. Demos passos muito significativos este ano no sentido de erradicar a discriminação no acesso a dádivas de sangue. Este é mais um passo importante.”

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