Os sismos são normalmente tidos como eventos rápidos, inesperados e difíceis de prever, mas nem sempre é assim. A tecnologia de GPS permitiu perceber que há eventos sísmicos que se desenvolvem ao longo de horas, dias ou até anos, mas nenhum tão longo como o sismo de 1861 na Indonésia.

Nesse ano, um sismo violento na ilha de Sumatra (Indonésia), com magnitude de 8,5, desencadeou um tsunami que matou milhares de pessoas. Durante muito tempo pensou-se que se tratou de uma rutura abrupta de uma falha adormecida, mas agora foi possível perceber que este evento sísmico já se estava a desenvolver há 32 anos, noticiou a revista Scientific American.

Para voltar atrás no tempo, os investigadores tiveram de se socorrer de outros elementos que não os sismogramas (o registo em papel dos movimentos da terra feito pelo sismógrafo): usaram corais, mais propriamente o crescimento dos corais — como se dos anéis de uma árvore se tratasse —, conforme descreveram no artigo publicado na revista científica Nature Geoscience.

Foi retirada uma faixa de 2,6 metros de comprimento nos microatóis próximos da ilha de Simeulue para analisar o que tinha acontecido ao longo do tempo — Aron Meltzner

Estes microatóis (corais antigos, em forma de disco, que crescem em diâmetro e altura) na ilha de Simeulue, ao largo de Sumatra, registaram as subidas do nível do mar e elevações da plataforma terrestre no seu padrão de crescimento, refere o comunicado de imprensa da Universidade Técnica de Nanyang (Singapura). São mais de 100 anos escritos nos corais, o registo dos movimentos verticais da falha de 1738 a 1861.

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Quando encontramos esses corais pela primeira vez, há mais de uma década, sabíamos, pelos padrões de crescimento, que algo estranho devia ter acontecido enquanto cresciam. Agora, finalmente temos uma explicação viável”, disse Aron Meltzner, co-autor e investigador do Observatório da Terra na NTU.

Ao longo de 90 anos, a ilha de Simeulue foi afundando lentamente, cerca de um ou dois milímetros por ano, como resultado do movimento das duas porções da crosta terrestre no local da falha. No entanto, a partir de 1829, o ritmo a que a ilha se afundava tornou-se cinco a sete vezes mais rápido, com alguns anos a registar uma diferença de um centímetro. Este movimento culminou no grande sismo de 1861.

Estes sismos em “câmara lenta” vão libertando tensão nuns pontos da falha e criando tensões noutros pontos, mas sem que isso fique registado. E só quando os movimentos são mais violentos ou há mais energia libertada se percebe que estamos na presença de um sismo.

Os autores gostavam que a monitorização deste tipo de sismos lentos ajudasse não só a prever os locais onde ocorrerá o sismo, mas também quão forte será — e se pode originar um tsunami. Mais difícil será prever quando pode acontecer, visto que o tempo ao longo do qual se desenvolvem estes eventos sísmicos silenciosos é muito variável.

O método que adotámos neste artigo também será útil para estudos futuros de outras zonas de subducção — locais que são propensos a terramotos, tsunamis e erupções vulcânicas. O nosso estudo pode, assim, contribuir para melhores avaliações de risco no futuro”, disse Rishav Mallick, primeiro autor do artigo e investigador na Faculdade Asiática de Ambiente na NTU.

Os investigadores da NTU referem ainda que o sismo de magnitude 9,2, seguido de tsunami, que aconteceu na Indonésia em 2004, foi precedido por uma fase de eventos sísmicos lentos desde 2001. Os autores alertam ainda que haverá um outro local, também na Indonésia, na ilha Enggano, a cerca de 100 quilómetros a sudoeste de Sumatra, onde se poderá estar a desenvolver um destes fenómenos silenciosos.

“Se as nossas descobertas estiverem corretas, isso significa que as comunidades que vivem nas proximidades desta ilha indonésia enfrentam, potencialmente, um risco maior de tsunami e de terramoto do que se pensava anteriormente”, disse Aron Meltzner, em comunicado de imprensa. “Isto sugere que os modelos de estratégias de risco e mitigação precisam ser atualizados”, concluiu.