“Nocturno”
Síria, Iraque, Líbano e Curdistão foram os locais escolhidos pelo italiano Gianfranco Rosi (“Sacro GRA”, “Fogo no Mar”) para rodar o seu novo documentário, “Nocturno”, ao longo de três anos. Ao contrário destes, que se situavam em sítios bem definidos (o anel de autoestradas em redor de Roma, e a ilha de Lampedusa invadida por emigrantes ilegais), e ao dispersar-se por várias paragens do Médio Oriente, “Nocturno” teria beneficiado de alguma informação e contextualização, mesmo que mínimas, pois Rosi segue aqui a sua política de não intervir com texto ou comentário. Daí que as imagens andem um bocado a boiar, sem que por vezes consigamos perceber bem onde nos encontramos e o que estamos a ver. O interesse de Rosi está aqui centrado naqueles que suportaram os efeitos dos conflitos e do terrorismo do Estado Islâmico (pequenas famílias, crianças, mulheres, doentes mentais, etc.) e não nos seus causadores, e que estão ligados entre si por terem em comum o sofrimento. E o realizador consegue introduzir poesia, melancolia, meditação e compaixão neste amplo mosaico de histórias, situações humanas e apontamentos visuais captados numa das áreas mais massacradas pela guerra e pelo terrorismo do mundo.
“Miss Marx”
Depois do intragável “O Jovem Karl Marx”, de Raoul Peck, será que precisávamos mesmo de um filme sobre Jenny Eleanor Marx – Tussy, para a família e os amigos – , a filha mais nova do autor de “O Capital”, activista política e social que se suicidou em 1898, aos 43 anos, em Londres, por causa de uma funesta e muito burguesa paixão pelo seu camarada inglês Edward Aveling, biólogo, escritor, político, adúltero e bígamo? Susanna Nicchiarelli, autora de “Nico, 1988” achou que sim, e eis “Miss Marx”, muito sério candidato ao título de Pastelão Esquerdista do Ano, uma mistura de melodrama de época em ambiente de militância socialista, e de veículo didáctico de propaganda marxista para totós (Nicchiarelli até filma Jenny, interpretada por Romola Garai, a berrar a doutrina do pai na direcção dos incautos espectadores). Como se isto não bastasse, a realizadora, num anacronismo tolo, enche a banda sonora de “Miss Marx” de música “punk” e põe Jenny a dançar ao som da mesma perto do final da fita, para frisar, está-se mesmo a ver, a “modernidade” e a “rebeldia” da biografada. O que diria o velho Karl a tais preparos?
“O Espião Inglês”
Dominic Cooke (“Na Praia de Chesil”) recria neste filme um dos maiores e mais importantes casos de espionagem dos anos 60, e de toda a Guerra Fria. Benedict Cumberbatch e o actor georgiano Merab Ninidze personificam, respectivamente, o engenheiro e homem de negócios inglês Greville Wynne e o coronel Oleg Penkovsky, da GRU, a espionagem militar da URSS. Entre 1960 e 1962, numa das alturas mais sensíveis da Guerra Fria, com a construção do Muro de Berlim e a Crise dos Mísseis de Cuba, Penkovsky passou a Wynne, o seu “correio” civil do MI6, entre muito outro material precioso, informações absolutamente fundamentais sobre a instalação dos mísseis soviéticos em Cuba. Até ao momento em que tudo se desmoronou em redor de ambos, porque o KGB tinha uma “toupeira” no MI6 e os dois homens começaram a ser vigiados. “O Espião Inglês” foi escolhido como filme da semana pelo Observador e pode ler a crítica aqui.