A Netflix (e, por extensão, a indústria do “streaming”) tem muitos defeitos. Mas uma das suas qualidades é permitir que séries e filmes que de outra forma ficariam restritas aos países e às filmografias em que foram produzidas, possam adquirir projeção internacional e chegar a espectadores de territórios que nem sequer imaginavam que elas existiam. Foi o que sucedeu a “Capitani”, uma série policial luxemburguesa, que depois de ter sido exibida na RTL, a televisão local, e obtido enorme sucesso, foi comprada pela Netflix. Graças à qual conheceu uma audiência mundial com a qual os seus responsáveis nunca teriam sonhado, chegando ao Top Ten de 49 países.

Criada por Thierry Faber, “Capitani” não quer, de forma alguma, reinventar o formato. Ela mexe-se com método e desenvoltura dentro das convenções e situações-tipo deste género. A história passa-se na vila de Manscheid, no norte do Luxemburgo, onde é descoberto o cadáver de Jenny, uma adolescente local, que tem uma irmã gémea e vive com a mãe e o padrasto. Entram então em cena o inspetor Luc Capitani (Luc Schiltz), que se encontrava na zona (não por acaso, como se verá mais adiante) e fica encarregue do caso pelos seus superiores, e Elsa Ley (Sophie Mousel), uma agente da polícia da vila. Entretanto, Tanya, a irmã da morta, desapareceu, e pouco tempo depois, o padrasto das duas jovens aparece enforcado em casa.

[Veja o “trailer” de “Capitani”:]

Dentro deste cenário familiar – polícia forasteiro tenta deslindar um caso de assassínio que poderá ter outras ramificações (tráfico de droga, corrupção política municipal, envolvimento de militares de uma base próxima) numa pequena comunidade pouco habituada a estranhos, onde toda a gente se conhece e há várias pessoas com esqueletos no armário e segredos no coração –, que se vai tornando mais complexo e intrigante de episódio para episódio, à medida que Capitani e a sua equipa vão tirando novas camadas ao caso e detetando novas pistas, o realizador Christophe Wagner mantém a intriga verosímil, nítida, ritmada e viciante, sem lhe perder o norte narrativo.

Luc Schiltz personifica, sem exagerar no mau feitio, um Capitani que pode ser demasiadamente ríspido e desagradável para subordinados, suspeitos e habitantes da vila, e também enganar-se nas suas teorias; e que, no meio da investigação, protagoniza ainda um subenredo romântico com uma personagem portuguesa (o que só fica bem ao criador da série, tendo em conta que os portugueses formam o maior grupo de estrangeiros a viver no Luxemburgo). Sophie Mousel dá-lhe boa réplica na desembaraçada agente Ley, e do elenco ao “métier” técnico, “Capitani” exibe bom polimento e aspeto mais do que potável. Merece ser descoberta por todos aqueles a cujo radar escapou, sobretudo se forem cultivadores do policial.

A primeira temporada de “Capitani” pode ser vista na Netflix

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