A pouco mais de 24 horas do decisivo Portugal-França, existe uma certeza: Fernando Santos vai mesmo fazer alterações ao onze inicial depois de ter apresentado exatamente a mesma equipa contra a Hungria e contra a Alemanha. O selecionador nacional disse isso mesmo no domingo, na conversa informal que teve com os jornalistas que estão em Budapeste a acompanhar o Euro 2020, e confirmou-o esta terça-feira, na antevisão da partida. Resta saber, naturalmente, que alterações serão.

Para começar, parece cada vez mais provável que Renato Sanches seja titular contra a seleção francesa. O médio do Lille entrou ao intervalo da partida contra a Alemanha, depois de também já ter sido suplente utilizado contra a Hungria, e em ambas as ocasiões acabou por oferecer uma intensidade e um dinamismo que até aí não estava a aparecer na equipa. Na primeira jornada, em Budapeste, foi um elemento preponderante para a vitória portuguesa, que só começou a ser desenhada já dentro dos últimos dez minutos; na segunda, em Munique, e apesar da derrota com os alemães, entrou com tarefas defensivas e responsabilidades ofensivas e esteve associado ao melhor momento da Seleção, tendo até acertado no poste com um grande remate de fora de área.

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Ainda assim, e mesmo que Renato Sanches seja promovido ao onze inicial, continua a existir uma dúvida quanto à posição que o jogador virá a ocupar. O médio do Lille pode entrar para o lugar de Bernardo Silva, que se tem mostrado algo fatigado, tal como aconteceu contra a Hungria, ou pode entrar para o lugar de William, que tem sido interpretado como um dos responsáveis pela falta de intensidade do meio-campo português. Se for encostado à direita, no lugar de Bernardo, Renato perde grande parte do caráter explosivo e disruptivo que tantas vezes lhe permite encontrar espaços em zonas interiores; se ficar no centro do terreno, no lugar de William, pode dar uma injeção ofensiva ao setor intermédio da equipa e empurrar as linhas para a frente.

Esta terça-feira, na conferência de imprensa de antevisão à partida, Fernando Santos acabou por deixar algumas pistas sobre a forma como o meio-campo da Seleção Nacional terá de atuar contra França. “A Alemanha jogava diferente, com três centrais, mas com três atacantes e também com o avanço dos laterais. E só com dois médios. Era uma questão diferente. Nós jogamos com uma linha de quatro e sabíamos que não tínhamos igualdade numérica. E isso no futebol não é possível, o ideal em termos defensivos até é ter superioridade numérica. Em alguns momentos, podemos aguentar com a igualdade. Quando temos bons jogadores podemos fazer isso, quando estamos numa equipa mais pequena temos a necessidade de pôr mais gente. Amanhã [quarta-feira], o que se coloca é um ataque diferente. Os médios têm um ataque à profundidade diferente do dos médios da Alemanha, os médios da Alemanha raramente atacavam a profundidade. Neste caso, a equipa francesa joga com três avançados móveis, com dois médios que atacam bem a profundidade [Pogba e Rabiot], até o próprio Kanté o faz. Não temos essa questão de na última linha existir uma superioridade numérica do adversário. Teoricamente, será quatro contra três. Mesmo que exista uma incorporação, quanto muito haverá igualdade”, explicou o selecionador nacional, que acrescentou ainda que o “estado mental” dos jogadores também tem muita influência na hora de os integrar nas opções iniciais.

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Ou seja? Contra a Alemanha, Fernando Santos decidiu manter Danilo e William enquanto duplo pivô à frente da defesa porque precisava dessas compensações para ter superioridade numérica a defender. O problema, como já foi analisado, é que os dois médios acabaram por ser pouco intensos nessa tarefa e por permitir que os laterais alemães, principalmente, surgissem totalmente soltos nas costas de Raphael Guerreiro e Nelson Semedo. Agora, contra França e tendo em conta que Portugal tem desde logo a tal superioridade numérica no setor defensivo, o selecionador pode abdicar de um dos médios mais defensivos e lançar então Renato Sanches.

Depois, existem outras duas possibilidades menos certas: Rafa e João Moutinho. Rafa foi a primeira solução que Fernando Santos lançou a partir do banco contra a Hungria, já na segunda parte e com o nulo a manter-se, e o jogador do Benfica correspondeu com duas assistências e o facto de ter sofrido a grande penalidade que deu um dos golos de Cristiano Ronaldo. A entrar no onze, o avançado poderia render Bernardo ou Bruno Fernandes, crónicos titulares da Seleção que se têm tem apresentado algo fatigados, também graças a temporadas longas e esgotantes ao serviço do Manchester City e do Manchester United. Já Moutinho, que também entrou nas duas partidas numa fase em que Portugal precisava de ter bola, poderá ser uma opção do selecionador. Ainda que, neste caso, o cenário da titularidade do médio do Wolverhampton ganhe mais força se Renato for encostado ao corredor e a equipa precisar de mais ligação e fluidez na construção.

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Este domingo, na conversa que teve com os jornalistas no complexo desportivo do Vasas SC, Fernando Santos elogiou largamente João Moutinho. “O João lê o jogo como poucos. Vai ser treinador, seguramente. É algo que ele sempre teve, que vem com ele de há muitos anos. A forma como entrou no jogo da Alemanha, juntamente com o Renato, fez com que a equipa se posicionasse bem a jogar um-dois. Ele orienta, sabe os caminhos, faz-me lembrar o Ricardo [Carvalho] no outro Europeu. Ele já não era rápido mas o atalho que conseguia encontrar tornava-o muito mais rápido do que os outros, que corriam mais do que ele. O João tem isso”, disse o selecionador.

Estabelecidas as eventuais entradas, abre-se também a porta à eventualidade de Fernando Santos decidir mudar o sistema tático, deixando para trás o 4x3x3 e passando para um 4x4x2 com um losango no meio-campo. A ideia será encaixar o setor intermédio e o ataque na equipa francesa, sem mexer nos quatro elementos da defesa, e jogar assim com Danilo — que se mantém no onze para evitar uma revolução total –, Moutinho mais chegado à direita, Renato mais próximo da ala esquerda e Bruno Fernandes ao centro, nas costas de Diogo Jota e Cristiano Ronaldo. Ou seja, sem bola e na tentativa de parar o ataque à profundidade que é uma das mais-valias dos franceses e a procura pela velocidade de Mbappé na esquerda, Jota poderia descer na  esquerda para apoiar Raphael Guerreiro, Renato aproxima-se mais no corredor central a Danilo, Bruno Fernandes também recua, Moutinho pode ajudar Nelson Semedo na direita com Pepe a ficar mais solto para possíveis dobras ao lateral e Danilo a ficar com a responsabilidade de compensar ao lado de Rúben Dias.

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Esta terça-feira, quando fez a antevisão à partida, Fernando Santos revelou que os dois últimos jogos contra a seleção francesa, em outubro e novembro do ano passado e ambos a contar para a fase de grupos da Liga das Nações, foram o grande instrumento de trabalho da equipa nos últimos dias. O selecionador nacional sublinhou principalmente a partida de Paris, que terminou empatada sem golos, e lembrou que no jogo em Lisboa, que Portugal acabou por perder com um golo de Kanté, existiram alguns “erros posicionais”. Ora, em Paris, onde a Seleção esteve “muito bem”, de acordo com Fernando Santos, a equipa jogou em 4x3x3, com três na frente e sem losango no meio-campo. O momento, porém, é diferente: Bernardo Silva está muito fatigado, Bruno Fernandes também está muito desgastado e João Félix, para além de ter tido um problema muscular recentemente, também não está no melhor momento de forma.

Sem Nuno Mendes, que volta a falhar uma partida depois de já não ter estado disponível contra a Alemanha devido a uma mialgia muscular, Portugal vai defrontar França num Puskás Arena onde vão estar oito mil franceses e cerca de seis mil portugueses. A Seleção Nacional pode até perder por dois golos e passar aos oitavos de final do Euro 2020, caso a Hungria não vença a Alemanha — mas também só precisa de ganhar para carimbar desde logo a qualificação e fugir a um eventual terceiro lugar que pode significar adversários mais complexos na próxima fase.