O desencontro é antigo e, mais uma vez, promete deixar PS e PCP em lados diferentes da barricada. Se o PCP escolheu as vésperas das negociações orçamentais para voltar à carga com as leis laborais e desafiar o PS a aprovar as suas propostas, os socialistas reagem com um pé no travão e avisos claros: “Não podemos fazer mudanças isoladas e desenquadradas”, esclarece o PS.

Embora a decisão quanto às propostas que serão discutidas esta quarta-feira ainda não esteja fechada no grupo parlamentar, os socialistas já têm reparos a colocar aos projetos dos comunistas (que tiveram a iniciativa de agendar as suas propostas, às quais se juntaram propostas de Bloco de Esquerda, PEV e PAN).

“Estamos sempre disponíveis para encontrar consensos, mas todo este processo tem de ser enquadrado. Não podemos lançar alterações isoladas e desenquadradas”, avisa, em declarações ao Observador, o deputado socialista Fernando José, que está a trabalhar neste dossiê a par da líder parlamentar, Ana Catarina Mendes.

“O Livro Verde do Trabalho acaba de ser lançado e pode dar algumas pistas; o regime do teletrabalho está a ser densificado; e o Código do Trabalho foi alterado há pouco tempo”, justifica o mesmo deputado, rematando: “A estabilidade é importante”.

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Tradução: tal como estão, as propostas não deverão passar — resta saber se haverá alguma disponibilidade para as trabalhar em sede de comissão, por exemplo, ou se serão diretamente chumbadas, como tem acontecido a muitas iniciativas semelhantes dos comunistas e do resto da esquerda, que têm por objetivo de reverter as normas laborais do tempo da troika.

Confronto não se mistura com Orçamento

A batalha é antiga e tem, aliás, sido o motivo para muitos dos principais pontos de tensão — e até rutura — entre os antigos parceiros de geringonça. Foi por causa das discordâncias laborais que o PS recusou assinar acordo para uma geringonça 2.0 proposta pelo Bloco de Esquerda, em 2019. E logo de seguida, no Orçamento para 2021, um dos principais motivos que levaram o BE a romper com o PS foi precisamente a recusa dos socialistas em associar as propostas laborais — que passavam também por reverter as normas da troika — ao Orçamento.

Ora o PCP não fez essa associação e mantém a mesma posição — os comunistas já esclareceram que, na sua perspetiva, fazer depender as negociações orçamentais da aprovação das propostas orçamentais seria até “indigno”, pelo que fazem as discussões dossiê a dossiê.

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Nas jornadas parlamentares dos comunistas, Jerónimo de Sousa anunciou que este seria um tempo de “luta” e “confronto” com o PS por causa das questões laborais. A “prova dos nove”, acrescentava então o líder parlamentar do PCP, João Oliveira, seria dada pelo PS quando votasse as propostas dos comunistas, esta semana, e se ficasse a conhecer a posição dos socialistas sobre projetos para: 1) aumentar os dias de férias para 25 no público e no privado; 2) reduzir o horário semanal de todos para 35 horas; 3) alterar o regime de despedimento coletivo e despedimento por extinção do posto de trabalho; 4) um reforço dos direitos para combater a precariedade, reduzindo a contratação a termo ou reduzindo o tempo de período experimental (que foi aumentado por acordo entre PS e PSD). Há várias propostas de BE, PEV e PAN que são coincidentes.

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Mas, até ver, o que a resposta dos socialistas indicia é mesmo que o desacordo é para continuar: António Costa até acenou com mudanças laborais na moção que entregou para o congresso do PS, mas aponta para o Livro Verde do Trabalho e não para mexidas de fundo no Código do Trabalho, uma posição que para o PCP se resume a um “discurso de apego aos direitos dos trabalhadores” que é inconsistente com a prática.

Mesmo assim, neste ponto o PS conta com o conforto de saber que isso não prejudicará as negociações para o próximo Orçamento do Estado, que deverão começar este mês e que o PCP coloca numa gaveta à parte. 

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Isto porque, como Jerónimo explicava esta terça-feira, no final de uma reunião do comité central, o PCP continua a ter uma postura “construtiva” e de contributos “positivos”: se o próximo Orçamento contar com propostas positivas para os “trabalhadores”, um arrufo laboral nesta semana poderá não passar disso mesmo.