Se recuarmos ao início do Campeonato da Europa, havia três seleções que estavam na cauda da tabela entre os favoritos à conquista do título. 1) a estreante Macedónia do Norte, que somou por derrotas os jogos feitos e não chegou aos oitavos; 2) a estreante Finlândia, que conseguiu uma vitória no início da prova diante da Dinamarca mas perdeu os dois outros jogos e não chegou aos oitavos; 3) a Hungria, equipa que sobrava no “grupo da morte”, que conseguiu empatar com França e Alemanha e não chegou aos oitavos. Como se viu, tudo certo.

Se Macedónia do Norte, Finlândia ou Hungria ganhassem o Europeu, cada euro investia dava 500 de retorno. Era praticamente impossível e confirmou-se isso mesmo. Mas nem sempre é assim e Artem Dovbyk foi no final dos oitavos aquela aposta 1/500 que faz do futebol um jogo de constante nascimento de heróis improváveis.

À semelhança do que tinha acontecido com Países Baixos (2-3), Macedónia do Norte (2-1) e Áustria (0-1), este perfeito desconhecido que será para sempre recordado estava sossegado a ver o jogo do banco (ou da bancada, seguindo as regras da pandemia) e não esperava entrar. Não esperava mesmo, como se viu pela cara que fez no momento em que Shevchenko lhe acenou para despir o fato de treino no reinício da segunda parte do tempo extra. Um momento de azar de um (Beresin, que entrou no arranque do prolongamento mas teve de sair com uma lesão que pode ser grave no joelho após uma entrada violenta de Danielson) foi o martírio de outro (Yarmolenko, que não aguentava nem mais um minuto) e a sorte de um terceiro. Aqui entra Dovbyk.

Depois de uma primeira oportunidade poucos minutos depois de ter entrado em campo, quando apareceu na área sozinho mas rematou por cima da baliza de Olsen (embora parecesse em posição irregular), o avançado de 24 anos surgiu no meio dos centrais ao primeiro poste a desviar de cabeça mais um cruzamento de Zinchenko, o melhor jogador ucraniano e que nunca desistiu de evitar o desempate por grandes penalidades. No primeiro minuto de descontos, fez o 2-1 com aquele que foi o primeiro golo pela seleção na terceira internacionalização.

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Quando todos apontavam para novo desempate, Dovbyk emergiu como o tal herói e carimbou o primeiro apuramento de sempre da Ucrânia para os quartos do Europeu, depois de ter alcançado esse patamar em 2006 no Campeonato do Mundo. Em dez jogos no Campeonato da Europa, os ucranianos conseguiram apenas ganhar três, dois contra a Suécia. Este, não mais será esquecido. E com outro contorno histórico: foi o golo decisivo mais tardio de sempre em Europeus, superando o 3-2 de Platini a Portugal nas meias de 1984 (119′). Mais: só não foi o golo mais tardio de sempre em Europeus por uma diferença de 24 segundos em relação ao golo apontado pelo turco Semih Sentürk diante da Croácia em 2008 (que fez o empate antes do triunfo nos penáltis).

Mas quem é afinal Artem Dovbyk? Não é propriamente o jogador mais conhecido, nem mesmo entre a Ucrânia, e também não tem o percurso mais regular enquanto jogador: foi formado pelo Cherkaskyi Dnipro, clube onde fez a estreia como sénior em 2014/15, esteve depois dois anos no Dnipro com um empréstimo aos moldavos do Zaria Baltia pelo meio, rumou depois à Dinamarca onde representou o Midtjylland (onde se sagrou campeão), foi de novo cedido neste caso aos também dinamarqueses do SönderjyskE e voltou em 2020 ao Dnipro (entretanto já Dnipro-1), tendo sido pela primeira vez chamado à seleção em março deste ano. Agora, não será esquecido. E mesmo tapado na frente por Yaremchuk, até é bem possível que possa ser de novo suplente utilizado.