“Vais defender pelo menos dois… E mostrares como és grande”

A história daqueles minutos de tensão nas grandes penalidades do jogo da Espanha frente à Suíça pode parecer resumida às novas tentativas em São Petersburgo mas começou antes. Bem antes. Aliás, ainda antes do Europeu, quando a comitiva da Roja teve um caso de infeção por Covid-19 (Busquets), um falso positivo (Diego Llorente) e um encontro particular com a Lituânia disputado por jogadores Sub-21 porque todas as escolhas de Luis Enrique andavam nessa fase a treinar à parte, sem contactos, a garantir que não existiam possibilidades de surto.

Ainda no início da concentração dos 24 jogadores (por opção técnica porque todas as equipas podiam levar 26 mas o selecionador preferiu abdicar de duas vagas por uma questão de gestão do grupo), Luis Enrique inquiriu os convocados sobre a possibilidade de treinarem ou não grandes penalidades. Disseram que sim. Com isso, no final do prolongamento com a Suíça, as escolhas foram quase automáticas, incluindo aquele que ficava de fora.

Como os helvéticos tinham ficado reduzidos a dez ainda na segunda parte do tempo regulamentar, um espanhol ficou logo de fora. Tocou a Marcos Llorente. A partir daí, ficou tudo em aberto para os voluntários, com Sergio Busquets como primeiro e Oyarzabal a fechar por ter uma percentagem alta de concretização, como explicava a Marca. Moreno, outro especialista no Villarreal, falhou contra a Polónia na fase de grupos e por isso passou para o meio das marcações, não abriu mas fez o 2-1 importante naquela fase. Oyarzabal fechou as contas, sendo que Rodri, que entrara no final do prolongamento para isso, também falhou. A vitória fechou com 3-1, com nome Simón a fazer novamente capas em Espanha depois de meses a fio com Fernando Simón, diretor do Centro de Coordenação de Alertas de Saúde e Emergências do Ministério da Saúde, a falar sobre a evolução da pandemia.

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“Sabia que não podia falhar, por sorte entrou mesmo. No caminho entre o meio-campo e a marca passam-te muitas coisas pela cabeça e ainda por cima a bola estava longe. Tinha dito ao Unai [Simón] que ia ser o dia dele. Quando o Busi [Busquets] falhou, disse-lhe que ia defender três. Tocou-me a mim marcar o quinto penálti mas o trabalho é de todos, do [David] De Gea, do Robert [Sánchez], do treinador de guarda-redes… São coisas que se trabalham”, referiu no final do jogo Oyarzabal, avançado que foi uma das grandes figuras da Real Sociedad.

À exceção de Jordi Alba, que foi a correr abraçar Luis Enrique, e entre uma ou outra lágrima de Morata, que voltou a ter um jogo mais apagado depois de ter sido decisivo contra a Croácia, todos seguiram em direção de Unai Simón, a quem o selecionador tinha referido apenas que iria travar dois penáltis no desempate, numa conversa que foi apanhada pela Deportes Cuatro pouco antes de ir para a baliza das conversões. “Foi a série de penáltis mais tranquila da minha vida porque não podia fazer nada, o que acontecesse, acontecia. Claro que se sofreu muito, como poderíamos não sofrer nos quartos de um Europeu? O que queriam, um desfile militar?”, atirou o selecionador no final de um encontro onde voltou à sala de imprensa com a camisola do Naranjito, a mascote do Mundial de 1982 organizado por Espanha. “Calma, é a mesma mas está lavada…”, disse.

De acordo com alguns meios, como o El Mundo, há algo mais naquele símbolo do Naranjito, uma espécie de uma mensagem para quem achava que haveria mais um falhanço como nesse ano de 1982 em que a equipa não foi além da segunda fase. Mas o grande herói, esse, foi Unai Simón, um guarda-redes que com apenas 15 anos já gravava os seus jogos para ver o que podia corrigir e melhorar. Campeão europeu de Sub-19 e Sub-21, o jovem de 24 anos formado, criado e lançado pelos bascos do Athl. Bilbao conseguiu a sua redenção após o erro contra a Croácia, foi eleito o MVP mas admitiu que, se fosse por ele, o prémio tinha ido para outro jogador e da Suíça. “Eu teria dado o prémio de melhor em campo ao Sommer”, comentou o herói espanhol no final, que tinha na toalha uma cábula para recordar os estudos que fizera antes para onde costumavam atirar os jogadores suíços.