O presidente da Comissão de Acompanhamento do Plano de Recuperação e Resiliência (PRR), António Costa e Silva, disse na sexta-feira que o país está convertido numa espécie de sociedade de indecisão e que essa indecisão “tolhe” o desenvolvimento nacional.

Nós somos um país que está convertido numa espécie de sociedade da indecisão. O banco de fomento anda em discussão há anos, há décadas. Fomos dos primeiros países da Europa a suscitar essa discussão. Outros que chegaram depois, como a Irlanda, já têm o seu banco de fomento a funcionar há muito e muito tempo. E se olharmos para a discussão em termos da ferrovia ou do aeroporto de Lisboa, essas discussões arrastam-se há 40, há 50 anos. E chamo a vossa atenção, para que a indecisão tolhe e é outro grande obstáculo no desenvolvimento do país”, sustentou.

Costa e Silva falava na sexta-feira, na Covilhã, distrito de Castelo Branco, durante o 1º Encontro de Trabalho — Visão Estratégica para a Beira Interior 2030, iniciativa organizada pela Associação Empresarial da Beira Baixa (AEBB), Associação Empresarial da Região da Guarda (NERGA) e pelo Movimento Empresários P’la Subsistência do Interior, com o objetivo de encontrar propostas concretas e exequíveis que permitam convergir a região (ao nível económico, social e demográfico) com o resto do país.

Convidado especial da sessão, que contou com empresários, autarcas e representantes de entidades cientificas e académicas da região, Costa Silva apontou alguns das dificuldades que o país enfrenta e referiu as “alavancas” que devem ser movidas para melhorar a atual situação e criar condições de desenvolvimento sustentável do país.

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Entre as apostas destacou a importância de ultrapassar o “obstáculo dramático” que representa o baixo nível de capitalização das empresas, frisou que é preciso fazer essa capitalização sem ser só através da dívida e lembrou a importância de apostar noutros instrumentos financeiros.

Defendendo que a banca comercial é muito importante para apoiar projetos estruturantes a médio e longo prazo, também ressalvou que muitas vezes esta não está preparada para esse apoio, pelo que sublinhou o papel que o banco de fomento poderia ter para ajudar a concretizar esses projetos, se já se tivesse concretizado.

Ainda ao nível das “alavancas”, apontou a necessidade de apostar “fortemente” nas qualificações e nas competências da população portuguesa: “Só elas nos podem tirar da situação em que estamos e proporcionar e catalisar um desenvolvimento diferente”.

A melhoria dos indicadores da qualidade gestão (que em média são baixos), designadamente através de cursos de renovação de conhecimentos, e a aposta no ecossistema de inovação foram outros dos pontos-chave que elencou.

Deu igualmente exemplos das oportunidades que há no território da Beira Interior, designadamente o polo das ciências biomédicas, polo das indústrias ou do têxtil ou da agroindústria, entre outros.

“Interior não pode significar, de forma nenhuma, atraso. Não pode significar discriminação. Temos de mudar esse paradigma”, acrescentou, frisando a inovação e o facto de muitas das empresas incorporarem inovação e robótica.

Costa e Silva defendeu ainda a necessidade de “mudar mentalidades”, de apostar no marketing, na economia digital, bem como nas áreas da biologia, bioeconomia e biociências e no cruzamento de tudo isto com a computação.

Costa e Silva alerta para riscos na execução do plano

O presidente da Comissão de Acompanhamento do PRR defendeu ainda que o país corre o risco de não executar o plano, se não se agilizarem processos e burocracia.

Estou convicto que se nós adotarmos o mesmo modelo [do passado], se demorarmos oito, 10, 15 meses a responder aos projetos que são apresentados, se não simplificarmos o licenciamento, se a carga burocrática, que hoje existe, ainda for acrescida; nós não vamos conseguir executar este plano”, afirmou.

O gestor que esteve na base da visão Estratégica 2020-2030 defendeu que o PRR é uma “oportunidade significativa”, mas também chamou a atenção para o facto de o país ainda ter 10 mil milhões de euros para executar dos fundos comunitários do programa Portugal 2020.

Lembrando que ao valor do PRR se junta ainda a verba do novo quadro financeiro plurianual, António Costa e Silva disse que todos se devem “mobilizar e articular” para que os recursos possam ser aplicados da forma “mais reprodutiva possível”. “A maneira mais importante para se implementar este programa é gerar confiança”, acrescentou.

Assumiu ainda a importância de se o Governo ter acolhido a sugestão de fazer um portal da transparência, onde os fundos e as taxas de execução serão reportados e os critérios explicados.

Ressalvando que não tem funções executivas ao nível da gestão do PRR, Costa e Silva explicou que tem tentado sensibilizar o Governo para a necessidade de descentralizar o modelo de operacionalização do PRR, associando ao processo os órgãos regionais e locais, comissões de coordenação e desenvolvimento e regional e empresas.

A questão dos prazos foi também uma das preocupações apresentadas nesta sessão pelo presidente da Comunidade Intermunicipal das Beiras e Serra da Estrela, Luís Tadeu, que lembrou que “há muito pouco tempo” para executar projetos.

Que os prazos de análises não se percam por teias imensas de ‘pergunta agora e pergunta a seguir’ que nunca mais chegam ao fim”, apelou.

Luís Tadeu defendeu ainda a importância de os avisos de candidaturas serem “claros e inequívocos” quanto ao que é pretendido, de modo a que empresas, autarquias e todos os interessados possam apresentar candidaturas.

Portugal foi o primeiro Estado-membro a entregar formalmente em Bruxelas o seu PRR, tendo sido também o primeiro a ter aval da Comissão Europeia, em 16 de junho passado. O Plano de Recuperação e Resiliência prevê reformas e investimentos nas áreas sociais, clima e digitalização no valor de 16,6 mil milhões de euros, dos quais 13,9 mil milhões de euros dizem respeito a subvenções a fundo perdido. O período de execução é até 2026, estando previsto um conjunto de reformas e investimentos para alavancar o crescimento económico.