Uma petição iniciada esta quinta-feira reclama à comissão eleitoral de Macau que revogue a decisão de impedir 15 candidatos do campo democrata de concorrem às eleições de setembro, afirmando que a desqualificação é inédita e viola a lei do território.

“Desde a entrega de Macau [à China], tal desqualificação em larga escala e injustificada de candidatos nunca tinha acontecido”, pode ler-se no texto publicado no site Change.org, dirigida ao presidente da Comissão de Assuntos Eleitorais da Assembleia Legislativa (CAEAL), Tong Hio Fong. A petição, iniciada anonimamente, que já recolheu mais de 200 assinaturas, defende que a decisão de afastar os candidatos do campo pró-democracia viola o artigo 26.º da Lei Básica de Macau, que estabelece o direito de os residentes votarem e serem eleitos.

“É injustificado privar um determinado grupo de pessoas do direito de ser eleito sem procedimentos legais”, afirmam os peticionários. A CAEAL excluiu cinco listas e 20 candidatos das eleições para a Assembleia Legislativa (AL) agendadas para 12 de setembro, 15 dos quais associados ao campo pró-democrata, por não serem “fiéis” a Macau.

Na segunda-feira, a comissão eleitoral divulgou sete critérios usados para decidir se os candidatos são elegíveis, recusando, no entanto, revelar quais as violações de que são acusados os candidatos excluídos. O organismo justificou a exclusão com o princípio “Macau governado por patriotas”, defendendo que é necessário avaliar se os candidatos “defendem sinceramente” o território, um argumento contestado pela petição, afirmando que o trabalho dos deputados afastados demonstra o seu patriotismo.

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“Os campos pró-democracia sempre foram as únicas e poucas vozes críticas na Assembleia Legislativa de Macau. Eles falam pelos fracos e pelos que não têm voz, melhoram os meios de subsistência da população e lutam pelos direitos que os cidadãos de Macau merecem”, defende-se no texto. “Não são eles os verdadeiros patriotas que amam e apoiam o seu país”, questionam os subscritores.

A petição contesta ainda os critérios apresentados pela CAEAL para justificar a exclusão, defendendo que são “bastante vagos” e carecem de “fundamentos objetivos”. “As chamadas provas fornecidas pela investigação policial eram subjetivas e sem base legal, as alegações não eram claras e não conseguiram provar que os três campos pró-democracia violavam o dever de ser fiel a Macau e à Lei Básica”, sustentam.

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A petição termina com o apelo à comissão eleitoral para que “revogue a decisão de desqualificar todos os candidatos dos três campos pró-democracia, o mais rapidamente possível”, “com base no princípio de justiça e igualdade”, de forma a “defender os direitos concedidos a Macau com base no princípio ‘Um país, dois sistemas’ e na Lei Básica”.

A Associação Novo Macau, liderada pelo deputado pró-democrata Sulu Sou, a Próspero Macau Democrático, de António Ng Kuok Cheong, liderada pelo ex-deputado Scott Chiang, e a Associação do Progresso de Novo Macau, encabeçada por outro ex-deputado e pró-democrata, Paul Chan Wai Chi, foram excluídas das eleições de setembro.

As três listas do campo democrata prometeram impugnar a decisão e levar o caso até ao Tribunal de Última Instância. A AL é composta por 33 deputados, mas apenas 14 são eleitos por sufrágio universal, sendo 12 escolhidos por sufrágio indireto (através de associações) e sete nomeados pelo chefe do executivo.

A exclusão de candidatos às eleições de Macau surge depois de a China ter aprovado uma polémica reforma eleitoral em Hong Kong, em março, para garantir o “patriotismo” na cidade semiautónoma e restringir a oposição pró-democracia, através do controlo reforçado dos candidatos às legislativas. Dias depois da reforma eleitoral na antiga colónia britânica, o chefe do Governo de Macau afirmou que ia “empenhar todos os esforços” para implementar o princípio “Macau governado por patriotas”.

A transferência da administração de Macau de Portugal para a China ocorreu no final de 1999, dois anos depois de a China ter recuperado a soberania sobre Hong Kong. Em ambos os casos, Pequim aplicou o princípio “Um País, Dois Sistemas”, que permitiu às duas regiões manterem o sistema capitalista e o modo de vida, incluindo direitos e liberdades de que gozavam as respetivas populações.