O ex-administrador financeiro do BES negou esta terça-feira, no Tribunal da Concorrência, ter praticado qualquer ato de gestão danosa no banco, como foi acusado pelo supervisor, e declarou a sua indignação por decisões tomadas após a sua saída.

Amílcar Morais Pires depôs ao longo de todo o dia desta terça-feira, na fase final do julgamento dos recursos interpostos às coimas de mais de 17 milhões de euros aplicadas pelo supervisor ao BES e a antigos administradores, no âmbito dos casos BESA e Eurofin, que foram apensos.

Recusando responder às perguntas dos mandatários do Banco de Portugal (BdP), frisando que esta atitude se prende com a instituição que não o tratou “como deve ser” e o visou deixando de fora da acusação outros responsáveis do Banco Espírito Santo, como Joaquim Goes, Morais Pires frisou não existir “nenhuma matéria” que o possa incriminar por gestão ruinosa e disse ter sido sempre diligente, dando “o corpo às balas”.

O ex-responsável financeiro do banco disse ter apresentado denúncias criminais e ações cíveis contra o BdP e a auditora KPMG, assegurando que não se vai calar e afirmando acreditar que um dia se esclarecerão várias questões em causa no processo, nomeadamente em relação à Eurofin, o veículo que vendeu em mercado secundário as obrigações colocadas junto de clientes do BES.

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Morais Pires classificou como “escandalosas” decisões tomadas após a sua saída do BES, em 13 de julho de 2014, nomeadamente, a decisão de recompra das obrigações, operações que geraram prejuízos superiores a 200 milhões de euros, e a da venda da Tranquilidade por 44 milhões de euros, para depois o Fundo Apolo encaixar 500 milhões de euros, situação que, disse, o deixou “indignado“.

A outra situação que classificou de “escandalosa” foi a que levou à revogação da garantia soberana do Estado angolano, no valor de 5.700 milhões de dólares, a qual cobria a carteira de crédito do BES Angola.

O antigo administrador do BES explicou ao Tribunal que assumiu o pelouro do BESA no âmbito da intervenção da ‘troika’ em Portugal, tendo, a partir de maio de 2012, promovido a mudança de gestão na sucursal angolana que culminou com a saída de Álvaro Sobrinho, primeiro da Comissão Executiva, assumida por Rui Guerra, e depois do Conselho de Administração, entregue ao ex-primeiro-ministro angolano Paulo Kassoma.

Essas medidas valeram-lhe várias ameaças e notícias “difamatórias“, tendo sido mesmo designado, em Luanda, como “alvo”, disse, salientando que a sua preocupação foi sempre a de resolver o problema de liquidez do banco e que, após a reunião com o Presidente da República de Angola, ficou “tranquilo”.

Morais Pires lamentou estar sentado no banco dos réus por “defender os interesses do banco” e o facto de, após a notícia do Expresso de 7 de julho de 2014, ter ficado “completamente isolado”, usando a imagem dos macacos que tapam olhos, ouvidos e boca para descrever a atitude dos restantes administradores.

No julgamento iniciado em 2 de junho no Tribunal da Concorrência, Regulação e Supervisão (TCRS), em Santarém, Morais Pires recorre das coimas de 1,2 milhões de euros aplicadas pelo BdP no âmbito do processo BESA e de 3,5 milhões de euros do processo Eurofin.

Além de Morais Pires recorreram para o TCRS o ex-presidente do BES Ricardo Salgado, visado no processo BESA (coima de 1,8 milhões de euros) e no Eurofin (4 milhões de euros), José Manuel Silva (1,250 milhões de euros do Eurofin), Rui Silveira (coima de 400.000 euros) e Gherardo Petracchini (150.000 euros), ambos no processo do BESA. O julgamento tem alegações marcadas para 25 e 26 de agosto.