José Sócrates reagiu pela primeira vez à detenção de Luís Filipe Vieira e Joe Berardo, aproveitando para deixar críticas ao funcionamento da Justiça. Num artigo de opinião publicado esta segunda-feira no Diário de Notícias, o ex-primeiro-ministro defende que a detenção usada para investigar “deixou de ser um dispositivo extraordinário da ação judicial” e transformou-se “num vulgar instrumento da violência estatal quando identifica o inimigo social”.

“Agora, prende-se primeiro e pergunta-se depois; agora, arrastam-se as pessoas para a cadeia para humilhar, para despersonalizar e para intimidar os outros”, afirma José Sócrates, que considera que este tipo de “maledicência estatal” tem resultado em “pleno”. Para o ex-secretário-geral do PS, a Justiça não se tem preocupado em averiguar se “toda a atuação se baseou na ação criminosa de violação” do segredo de justiça, que José Sócrates diz se ter transformado numa ferramenta que substituiu a “presunção de inocência pela presunção pública de culpabilidade”. “Lentamente, a caminho de um estado policial”, vaticina.

Caracterizando este procedimento na Justiça como sendo uma nova dialética entre justiceiros e os “justiçáveis”, José Sócrates considera que os primeiros são “intocáveis” e os segundos são “problemáticos”. “A expressão põe de lado o clássico fundamento da dignidade pessoal e dos direitos universais e convida a separar uns e outros”, explica.

O ex-primeiro-ministro considera que Joe Berardo e Luís Filipe Vieira se encaixam na categoria de “justiçáveis” e que deixaram de ser “indivíduos com direitos”. Relativamente ao ex-presidente do Benfica, José Sócrates aponta que não houve sequer “uma palavra de simpatia por quem ainda ontem era o líder da equipa”. “O cadáver ainda não arrefeceu e ali só se vê cálculo e ambição e poder e oportunismo”, atira.

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José Sócrates aproveitou ainda para comentar a entrevista ao Observador do presidente do Supremo Tribunal de Justiça, em que Henrique Araújo referiu que havia um “excesso de garantias de defesa” e que, se se almeja uma justiça mais rápida, tem de se “cortar com isso”. Sobre estas declarações, o ex-primeiro-ministro faz referência à sua detenção em 2014: “Ao senhor juiz presidente não impressiona que as autoridades penais prendam durante onze meses sem que apresentem qualquer acusação durante esse período. Não impressiona que se adiem indefinidamente uma, duas, três, quatro, cinco, seis vezes os prazos legais de inquérito. Não o impressiona a despudorada e ostensiva violação do segredo de justiça”.

Henrique Araújo: “Há um excesso de garantias de defesa. Se queremos uma justiça mais rápida, temos de cortar com isso”

“O que é extraordinário é que a única preocupação do senhor Presidente seja a de se perguntar se ainda faz sentido que o Estado Democrático garanta ao cidadão o direito a poder recorrer de uma decisão judicial que considere errada ou injusta”, remata.