O Partido de Unidade Nacional (PUN) pediu esta segunda-feira ao chefe de Estado da Guiné-Bissau, Umaro Sissoco Embaló, a demissão do procurador-geral da República, Fernando Gomes, por estar a “desacreditar” a justiça e a “boa reputação internacional” do país.

Numa carta enviada a Umaro Sissoco Embaló e divulgada à imprensa, o presidente do PUN, Idriça Djaló, afirma que o procurador-geral da República “não está em condições de continuar a exercer” aquelas funções, sob pena de “desacreditar totalmente a justiça” na Guiné-Bissau, como a “manchar irreversivelmente a boa reputação internacional da Guiné-Bissau“.

O presidente do PUN, partido sem representação parlamentar, sublinha que outra ilegalidade cometida pelo procurador-geral da República foi “usurpar as competências de um juiz ou magistrado, único habilitado a decretar medidas restritivas das liberdades contra qualquer cidadão”.

“Este ato criminoso, senhor Presidente, enquadra-se na sequência de um outro ato igualmente grave para as nossas autoridades judiciária e para a reputação da Guiné-Bissau”, afirma Idriça Djaló, referindo-se ao mandado de captura internacional emitido contra o líder do PAIGC e recusado pela Interpol.

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Na carta, o presidente do PUN recorda igualmente que Domingos Simões Pereira, que esteve um ano ausente do país, regressou à Guiné-Bissau por “sua própria iniciativa” e o Ministério Público nunca o acusou de nenhum crime.

“É hoje evidente para todos os cidadãos guineenses que o procurador-geral é movido por motivos que nada têm a ver com a justiça”, salientou.

Para Idriça Djaló, a “solicitação ilegal” de Fernando Gomes põe também em causa o Ministério do Interior.

“Os responsáveis deste setor vital para a proteção dos cidadãos deveriam verificar através dos seus serviços jurídicos a legalidade das ordens, mesmo se emanadas do Ministério Público, pois nem esta entidade está acima das leis em vigor no país”, afirmou.

“O Ministério do Interior não deve, de futuro, executar cegamente ordens manifestamente ilegais do procurador-geral da República, sob pena de ser cúmplice na subversão dos direitos fundamentais dos cidadãos da Guine Bissau”, acrescentou Idriça Djaló.

PAIGC promete “ações musculadas” de rua até que PGR da Guiné-Bissau se demita

Por seu lado, o Partido Africano para a Independência da Guiné e Cabo Verde admitiu esta segund-feira recorrer a “ações musculadas” até à demissão do procurador-geral da República e revogação do despacho que impede o líder do partido de sair da Guiné-Bissau.

“A determinação do PAIGC é clara e sem reservas. O Ministério Público deve revogar o mais rapidamente, o seu despacho sem validade jurídica e ato contínuo este procurador incompetente e irresponsável demitido das suas funções. Caso contrário, as nossas ações serão musculadas com contínuas marchas e manifestações até à restauração da verdade e da justiça”, refere, em comunicado, o partido.

No comunicado, distribuído aos jornalistas, no final de uma conferência de imprensa na sede do partido, em Bissau, o PAIGC alertou todas as instituições republicanas “sobre as consequências que poderão advir da manutenção do incauto, teimoso e arrogante Fernandos Gomes (procurador-geral da República)”.

O partido apela também à comunidade internacional e às organizações da sociedade civil para acompanhar o PAIGC no processo de “resgatar a justiça e salvar a democracia, sob pena do país se precipitar para o caos por culpa de um procurador instigador e incendiário nas suas tomadas de posição”.

À comunidade internacional e à sociedade civil, o partido salienta que a resposta do PAIGC será medida “partindo do pressuposto que o dever de obediência cessa automaticamente quando se está perante uma ordem ilegal e abusiva”.

“A paciência do PAIGC chegou aos limites, porque o cenário ao qual assistimos criou esta sensação de fadiga, insatisfação e intolerância. Isto, num país em que o regime desrespeita a separação de poderes, detém o povo o refém, promove o sequestro de adversários políticos, lança gás lacrimogéneo de forma indiscriminada contra manifestações pacíficas e move uma perseguição cega a um deputado e líder do maior partido da Guiné-Bissau”, pode ler-se no comunicado.

“Face a este cenário de abuso de autoridade e poder, a resposta ou a via a seguir é a ação e o intervencionismo dos mecanismos legais existentes”, acrescenta.

O líder do PAIGC, Domingos Simões Pereira, foi sexta-feira impedido de sair do país, quando se preparava para viajar para Portugal, pelo Ministério do Interior com base numa ordem dada pelo procurador-geral da República, alegando “risco de fuga”.

Para o PAIGC, depois de tentar impedir Domingos Simões Pereira de regressar ao país com um “patético pedido de emissão de mandado de captura internacional”, recusado pela Interpol, o procurador-geral da República desafia a Assembleia Nacional Popular.

“Um procurador sem rumo, avança agora, com descaramento, na deriva de ignorar as leis e desafiar todas as instituições da República, incluindo uma das mais soberanas, a ANP, tudo com um único objetivo: intimidar e atingir Domingos Simões Pereira”, refere o PAIGC.

“Uma atitude de todo descabida e que envergonha a Guiné-Bissau, com o PAIGC e os demais guineenses defensores dos direitos fundamentais a verem de forma incrédulo um procurador que, supostamente deveria ser fiscal da legalidade, a optar por métodos que promovem das mais monstruosas ilegalidades, deitando para o lixo os princípios elementares de um Estado de Direito Democrático”, acrescenta.

Partidos pedem demissão por incitamento à guerra, corrupção e peculato

Em causa está a ordem dada na sexta-feira ao Ministério do Interior pelo procurador-geral da República para impedir a saída do país do líder do Partido Africano para a Independência da Guiné e Cabo Verde (PAIGC), Domingos Simões Pereira, quando aquele se preparava para viajar para Portugal.

Em 24 de junho, a Procuradoria-Geral da República pediu o levantamento da imunidade parlamentar do deputado Domingos Simões Pereira, por suspeita de crimes relacionados, nomeadamente, por “incitamento à guerra“, por “dois contratos de financiamento” com instituições bancárias e por “delapidação de recursos pesqueiros”, “corrupção, peculato e nepotismo“, “falta de transparência na adjudicação de contratos públicos” e “aplicação de fundos não destinados ao pagamento de despesas não salariais”.

Segundo a PGR, os processos são relativos ao ano de 2015, 2018 e 2020.

Na carta, Idriça Djaló salienta que Fernando Gomes invoca o argumento “falacioso” de risco de fuga, porque segundo “as suas fontes” a Assembleia Nacional Popular (ANP) vai convocar uma “reunião extraordinária” para levantar a imunidade parlamentar a Domingos Simões Pereira.

“Este argumento falacioso avançado pelo procurador-geral da República constitui uma mentira grosseira com intenção de prejudicar um cidadão. O Ministério Público já tinha solicitado ao parlamento o levantamento da imunidade do deputado em causa“, que foi rejeitada pela comissão de ética, refere o líder do PUN.

No pedido enviado ao parlamento guineense, o procurador-geral da República indica que há “forte indícios” e que há perigo de fuga.

Idriça Djaló salienta, na carta, que segundo a Constituição da República da Guiné-Bissau e na lei que regula o estatuto dos deputados “nenhum procedimento judiciário e muito menos medidas restritivas ou privativas de liberdade podem ter lugar sem autorização prévia da plenária da ANP e no intervalo da sessão da comissão permanente”.

“Recorrendo a esta manobra para justificar o seu ato ilegal, Fernando Gomes comete uma grave violação dos preceitos da nossa Constituição, o que o desacredita para sempre na direção de uma instituição de tamanha importância para a credibilidade do nosso sistema judiciário”, refere Idriça Djaló.