A namorada de Vitaly Shishov, o ativista bielorrusso encontrado enforcado numa árvore de um parque de Kiev, na Ucrânia, não acredita que o namorado se tenha suicidado e diz que Shishov já tinha demonstrado preocupação com a sua segurança.

“Tínhamos planeado uma vida juntos. Ele não ia, simplesmente, deixar-me assim”, afirmou Bazhena Zholudzh, em entrevista à BBC.

Vitaly Shishov fugiu da Bielorrússia em 2020,depois da vaga de repressão por parte das autoridades bielorrussas após as eleições presidenciais de agosto. Alexander Lukashenko, o homem que governa a Bielorrússia com mão de ferro há 27 anos, foi declarado vencedor com mais de 80%, um resultado que não foi reconhecido pelos Estados Unidos, Reino Unido e União Europeia, que consideraram o resultado fraudulento.

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Tal como outros opositores do regime, para fugir à repressão, Vitaly Shishov encontrou refúgio na Ucrânia e foi a partir desse país que dirigiu a Casa da Bielorrússia na Ucrânia, uma organização não-governamental que ajudava dissidentes bielorrussos a fugirem do regime de Lukashenko.

Vitaly Shishov foi dado como desaparecido pela namorada na passada segunda-feira, depois de ter saído para correr, tendo sido encontrado enforcado num parque em Kiev no dia seguinte. As autoridades ucranianas abriram uma investigação ao caso, e a oposição bielorrussa tem descartado a tese de suicídio, apontando o dedo ao regime bielorrusso pela morte do ativista.

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Na entrevista à BBC, Bazhena Zholudzh revelou que o seu namorado já tinha demonstrado preocupação com a sua segurança, embora não tenham dado grande importância.

“Ele costumava sentar-se perto da janela e dizer que via carros a entrar e a sair do quintal. Não levei muito a sério”, afirmou Zholudzh. “Eu disse ‘talvez estejas a ser paranoico. Quem teria interesse em nós?’ Mas talvez ele tenha tido algum tipo de premonição”, afirmou.

Bazhena Zholudzh recordou ainda o namorado como a “melhor pessoa” que conheceu, sempre preocupado com os outros. “Quando viemos para a Ucrânia, ele sempre se certificou que toda a gente vinha em segurança”, recorda a namorada de Shishov. “Ele sempre protegeu os outros. Só não se protegeu a si próprio”, lamentou.

Comité Olímpico expulsa treinadores bielorrussos

A morte de Vitaly Shishov chamou novamente a atenção da comunidade internacional para o regime de Alexander Lukashenko, na mesma semana em que a velocista bielorrussa Krystsina Tsimanouskaya pediu asilo na Polónia. A atleta, que participava nos Jogos Olímpicos, criticou os treinadores da delegação bielorrussa e, por isso, as autoridades bielorrussas tentaram forçá-la a regressar ao país.

Com a ajuda do Comité Olímpico e das autoridades nipónicas, Tsimanouskaya, que temia represálias no regresso à Bielorrússia, conseguiu escapar ao regresso forçado, e aterrou na Polícia em segurança na passada quarta-feira.

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Devido a este incidente, o Comité Olímpico expulsou dois treinadores da equipa da Bielorrússia — Artur Shimak e Yury Maisevich — dos Jogos Olímpicos de Tóquio pelo seu papel na tentativa de repatriação forçada de Krystsina Tsimanouskaya.

Os casos de Shishov e Tsimanouskaya surgem quando se aproxima o marco de um ano das eleições presidenciais bielorrussas, que, apesar de Lukashenko ter sido declarado vencedor, geraram um movimento pró-democracia sem precedentes na Bielorrússia, encabeçado por Svetlana Tikhanovskaya, adversário do ditador bielorrusso nas eleições, e exilada desde então na Lituânia.

Apesar da pressão internacional, o regime de Lukashenko tem resistido, em parte graças ao apoio da Rússia, o seu principal aliado, que tem ajudado o país a lidar com as sanções de que é alvo do Ocidente — o último pacote imposto após o regime ter ordenado, em maio, o desvio de um avião da Ryanair, que fazia um voo entre Atenas e Vilnius, para deter o jornalista e ativista Roman Protasevich.

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